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Princípio da Reserva do Possível.

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Data: 26/09/2024 09:16:27

Fonte: jornaljurid.com.br

Princípio
da Reserva do Possível.

Resumo:
O princípio da reserva do possível é ideia que afirma que o Estado deve
efetivar os direitos sociais apenas na medida do financeiramente possível. O
referido princípio surgiu devido à existência de recursos materiais limitados
para concretizar os direitos fundamentais, sobretudo, sociais. O princípio da
reserva de consistência é uma construção germânica originária de uma ação
judicial que objetivava permitir a determinados estudantes cursar o ensino
superior público embasada na garantia da livre escolha do trabalho, ofício ou
profissão. Neste caso, ficou decidido pela Suprema Corte Alemã que, somente se
pode exigir do Estado a prestação em benefício do interessado, desde que
observados os limites de razoabilidade. Os direitos sociais que exigem uma prestação
de fazer estariam sujeitos à reserva do possível no sentido daquilo que o indivíduo,
de maneira racional, pode esperar da sociedade, ou seja, justificaria a
limitação do Estado em razão de suas condições socioeconômicas e estruturais.

Palavras-chave:
Jurisprudência. Reserva do Possível. Orçamento Público. Estado de Direito.
Direito à saúde. Direito à educação.

Cumpre
assinalar que melhor compreensão do princípio da reserva do possível na seara
do direito brasileiro, impõe-se, primeiramente, o exame da origem do instituto,
o qual, será visto, nasceu na Alemanha, a partir de um julgamento do Tribunal
Constitucional Federal em 1972.

E,
assim, o conceito expandiu-se para outros países europeus até que chegou aqui
em nosso país, particularmente, com a Constituição Federal de 1988, que
contempla consistente rol de direitos fundamentais, o que deu maior base para
própria formulação do referido princípio.

As
diferenças culturais e a interpretação jurisprudencial peculiar determinaram, o
desenvolvimento do conceito, com certo distanciamento daquele que fora
primeiramente reconhecido pelo Tribunal Alemão, perdendo-se, parcialmente,
parcela substancial das motivações que inspiraram o estabelecimento da referida
teoria.

Foi
dentro da histórica decisão alemã, a par do aspecto concernente à limitação de
recursos estatais, analisaram-se, igualmente, a possibilidade e o cabimento da
prestação sob a ótica do cidadão, no que pertine à razoabilidade do seu pedido,
em circunstância mui próxima ao próprio conceito de interesse processual.

Embora
neste momento seja possível anotar-se moderada distinção interpretativa entre o
sistema brasileiro vigente e o conteúdo da decisão alemã da década de setenta
do século passado, o fato é que a matéria, em si mesma, ainda não galgou total
maturidade, de forma que não se estabelece, em definitivo, contundente
diferenciação entre estas duas formas de compreensão.

De
maneira bastante genérica, porém, pode-se afirmar que, no Brasil, a alegação de
impossibilidade financeira do Estado 1 como argumento único à negativa à
prestação de um direito foi acolhida inúmeras vezes. E, tal posicionamento,
evidentemente, sempre foi alvo de contundente crítica, sob a premissa de que, a
rigor, os recursos estatais não são necessariamente limitados e que existem
meios legítimos para sua obtenção de modo a fazer frente a garantia dos
direitos fundamentais.

Alega-se,
de outro lado, que a incorporação do princípio no cenário brasileiro é
descabida, na medida em que os dois países ostentam realidades muito próprias e
diversas. Parte da crítica é efetivamente pertinente, mormente em razão da
impossibilidade de aferição científica e objetiva quanto ao acerto, ou não, por
parte do administrador no que se refere ao emprego de verbas públicas e, bem
ainda, no que diz respeito à pertinência desta contumaz alegação de escassez de
recursos.

O
manejo desta resposta tem sido usado de forma bem simplista, não sendo raras as
vezes em que o ente estatal assim se comporta em juízo, sem ao menos trazer a
prova da alegada impossibilidade financeira, o coração de sua defesa.

Em
outra parte, mesmo quando existe a demonstração documental de eventual
inexistência de recursos, o reconhecimento da situação da omissão estatal
subsiste ainda como difícil tarefa do julgador, porque, sabidamente, o Poder
Público há de realizar escolhas quanto ao emprego das verbas públicas.

De
todo modo, ao longo do tempo, a perspectiva da análise do tema alargou-se,
sendo de bom alvitre mencionar-se que hoje já há muitas decisões judiciais em
que este argumento único posto como resposta não mais o seu acolhimento.

E,
além disso, tende-se, neste momento, a proceder-se à análise do tema de forma
contextual, de modo a permitir a avaliação da plausibilidade, razoabilidade e
proporcionalidade do pedido formulado.

Enfim,
parece mesmo que, para alcançar o equilíbrio na solução do impasse, seja
efetivamente necessário o cotejo entre essas duas circunstâncias, procedendo-se
ao antecedente exame da efetiva existência da razoabilidade do direito sob a
ótica de quem pede, para, somente ao depois, analisar-se, se o caso, a questão
relativa à disponibilidade de recursos.

Nenhum
direito é absoluto. Por conta disso, é de rigor a análise da pertinência da
pretensão sob a ótica do que pode razoavelmente ser esperado do ente estatal.
Não fosse assim, todos os cidadãos estariam legitimados, desde logo, a compelir
o Estado a fornecer-lhes, de imediato, tudo quanto lhes parecesse pertinente, o
que, sabidamente, não é factível do ponto de vista prático.

Deve
ser anotado que a noção de mínimo existencial, deve estar igualmente presente
na ponderação, prestando-se este critério como elemento orientador da solução
nas hipóteses em que a plausabilidade do pedido e a impossibilidade de
atendimento da prestação em razão da limitação de recursos presentes e
comprovadas.

A
expressão “reserva do possível” foi empregada pela primeira vez por ocasião do
emblemático julgado Numerus Clausus da Corte Constitucional Alemã, em 18
de julho de 1972 e recebeu o número BVerfGE 33, 330 e, é considerado como o
marco inicial da doutrina. Eis o histórico:

Na
década de sessenta do século passado, dois estudantes alemães pleitearam vagas
na Universidade de Medicina das províncias de Bavária e Hamburgo e tiveram
negadas suas pretensões em razão do limitado e predeterminado número de lugares
disponíveis.

Essa
restrição, então invocada pelas instituições de ensino, encontrava legitimidade
na regra “Numerus Clausus” das Universidades, que consistia em
requisitos específicos para o ingresso no ensino superior.

Acionadas
pelos candidatos preteridos, as Cortes Administrativas solicitaram à Corte
Constitucional a manifestação acerca da compatibilidade dessa regra com os
parâmetros constitucionais, ante a possibilidade, em tese, da violação ao art.
12, inciso I, da Carta Alemã, dispositivo sobre o qual se assentou a pretensão.

Esta é
a redação da norma constitucional: “todos os alemães têm o direito de eleger
livremente a sua profissão, o lugar de trabalho e de sua aprendizagem. O
exercício da profissão pode ser regulamentado por lei ou em virtude de lei”.

Por
ocasião do julgamento, a Corte Alemã não reconheceu a alegada incompatibilidade
da restrição com a norma de cunho constitucional. Com efeito, afirmou a
possibilidade desse regramento aos cursos de medicina no país, valendo-se do
fundamento de que os direitos sociais se encontram sob a reserva do possível,
assim entendido o que pode um indivíduo, falando, exigir da coletividade.

Kommers
em sua obra: “The constitutional jurisprudence of the Federal Republic of
Germany,” assim traduziu para o inglês trecho da Decisão: De mau out acide the
questionary of heterite participativo brightismo (in sate beneficentes) can be
partially derived from (the concept that) a social state based on the rule of
law takes on a guarantor’s obligation to implement the value system of the
basic rights. We have determined that the legislator must decide wheter and to
what extent it will grant participatory rights within the limits of
administrative services – even in a modern welfare state – and the citizen
cannot force the legislatute to make this decision”.

 Tradução livre: Podemos deixar de lado a
questão de se os direitos participativos (em benefícios estatais) podem ser
parcialmente derivados (do conceito de que) um estado social baseado no império
da lei assume uma obrigação de fiador de implementar o sistema de valores dos
direitos básicos. Determinamos que o legislador deve decidir se e em que medida
concederá direitos participativos dentro dos limites dos serviços
administrativos – mesmo em um Estado de bem-estar moderno – e o cidadão não
pode forçar o legislativo a tomar essa decisão.

Eis
que o principal argumento da Corte para o reconhecimento de que a restrição das
Universidades não violaria a norma constitucional residiu no fato de que o
Estado há de suprir uma pluralidade de demandas e que, no caso em questão, já
havia ocorrido significativo aporte de investimentos nesta área, a afastar possível
omissão.

Entendeu
o Tribunal que o mandamento constitucional não obriga o ente púbico a conceder
a cada candidato individualmente considerado e, ainda, a todo e qualquer
momento, a vaga de ensino superior por ele desejada, sendo que determinação
neste sentido implicaria a minoração de recursos em outras áreas, de modo que o
princípio da igualdade restaria comprometido.

Em
análise dessas considerações, conclui-se que o Tribunal Alemão não se pautou
somente na limitação financeira do Estado para denegar a pretensão dos
estudantes.

Assim,
reconheceu que houvera já sido investido significativo valor nas Universidades
de Medicina e que existiam demandas outras a serem atendidas, sob pena de
priorização de um segmento em detrimento de outros, tudo a afastar o princípio
da igualdade.

Outros
sistemas jurídicos, entre eles o brasileiro, incorporaram a doutrina em questão
em seu arcabouço jurídico. Houve, porém, relativa mutação de seus termos, na
medida em que, a princípio, apenas a questão atinente à inexistência de
recursos parecia relevante.

E, em
razão desse fato, inúmeros autores brasileiros e estrangeiros se opuseram à
validação da doutrina em outros sistemas jurídicos que não o germânico, ao
argumento de que as circunstâncias entre seus países e a Alemanha  apresentavam acentuados elementos
distintivos. De toda forma, o fato é que, ao menos no Brasil, o conceito se
estabeleceu, ainda que, também aqui, tenha assumido contornos um pouco
diferentes. Analisa-se, pois, o contexto nacional.

A
doutrina dos direitos fundamentais em suas várias gerações ou dimensões, sendo
certo que se trata de vasto e controvertido tema, a não permitir o esgotamento
das considerações. Em breve digressão, cabe ressaltar que na doutrina
brasileira não existe consenso no que tange à nomenclatura mais adequada para a
definição dessas categorias de direitos.

Optou-se
que a é adequada a expressão gerações de direitos pode falsamente ensejar a
impressão de que ocorreu a sucessão ou substituição, sendo melhor denominar de dimensões
de direitos.

A
Constituição Federal de 1988, precisamente em seu Título II, previu rol de direitos
e garantias fundamentais, observando-se que, para fins de organização, a
matéria foi dividida em cinco capítulos, a saber: direitos individuais e
coletivos, direitos sociais, nacionalidade, direitos políticos e partidos
políticos.

Como é
cediço, os direitos fundamentais não surgiram simultaneamente, mas,
paulatinamente, em consonância com a demanda e com o cenário de cada época.

No
âmbito da Carta Magna, como exemplos de direitos fundamentais de primeira
dimensão, os direitos à vida, à liberdade e à igualdade previstos no “caput
do artigo 5º da Constituição Federal de 1988.

Atrelam-se
a esta classificação, outrossim, os demais direitos destes derivados, tais como
as liberdades de manifestação (art. 5º, IV), de associação (art. 5º, XVII) e o
direito de voto (art. 14, caput), ora mencionados apenas de forma
exemplificativa.

Pode-se
afirmar, quanto a estes, que se referem às liberdades em sentido amplo e que
implicam, desde sua nascente histórica, na adoção de conduta negativa do Estado
de modo a não interferir em seu pleno exercício.

Nas
palavras de Bobbio, são direitos que reservam ao indivíduo uma esfera de
liberdade em relação ao Estado, devendo este se abster de qualquer ato capaz de
obstá-la.

Os
direitos de segunda dimensão são derivados do princípio da igualdade, surgiram
com a noção de Estado Social e são entendidos como direitos da coletividade.
São direitos que exigem prestações por parte do Estado, de forma que implicam
um “fazer” em oposição ao “não fazer”, tal como se exige para o pleno exercício
dos direitos de primeira dimensão.

São
eles, basicamente, os direitos sociais, a par dos culturais e econômicos, e os
quais se acham alocados em capítulo próprio na Constituição Federal. Referem-se,
em síntese, à educação, saúde 3 , trabalho, moradia, lazer, segurança e
previdência social (art. 6º).

A
alteração do paradigma decorrente da explícita positivação representa afirmar
que o Estado passou a ter a obrigação positiva de criar pressupostos fáticos
para a realização desses direitos, os quais, frise-se, devem estar em consonância
com os tratados, pactos e convenções internacionais.

Segundo
Paulo Bonavides, passaram a ser vistos numa perspectiva de globalidade,
enquanto sendo chave de libertação material do homem.

Segundo
Ingo Sarlet, os direitos de segunda dimensão podem ser considerados uma
densificação do princípio da justiça social. Tais direitos consagram os
princípios da solidariedade ou fraternidade, sendo atribuídos genericamente a
toda as formações sociais, na medida em que sua titularidade pode ser
individual ou coletiva.

A
título de exemplos de direitos de terceira geração, podem ser mencionados os
direitos relativos ao desenvolvimento, ao meio ambiente, à autodeterminação dos
povos, ao patrimônio comum da humanidade e à paz, anotando-se que são eles de
natureza transindividual e que se concebem como tendo por destinatária a
própria coletividade.

Aos
direitos de terceira dimensão, Ingo Sarlet ressalta: cuida-se, na verdade, do
resultado de novas reivindicações fundamentais do ser humano, geradas, dentre
outros fatores, pelo impacto tecnológico, pelo estado crônico de beligerância,
bem como pelo processo de descolonização do segundo pós- guerra e suas
contundentes consequências, acarretando profundos reflexos na esfera dos
direitos fundamentais.

Registre-se
que há doutrinadores que sustentam a existência de direitos de quarta e de
quinta dimensão, atrelando-se os primeiros às questões relacionadas à
engenharia genética, democracia e pluralismo e, os últimos, por sua vez, as
noções relacionadas a amor e compaixão como direitos constitucionalmente
protegidos.

Volta-se
ao tema central do trabalho para estabelecer que, dada a natureza da categoria
de cada qual desses direitos, o princípio da reserva do possível, tem, em
termos pragmáticos, estreita relação com os direitos de segunda dimensão, na
medida em que são estes os que contam com a atuação direta e pontual do Estado
para sua efetivação.

A
problemática se instaura a partir deste ponto, na medida em que o Estado não
dispõe, em princípio, de recursos ilimitados para atender a toda uma classe de
demandas. E, esta limitação, como sabido, é de ordem prática e também legal, já
que o ente estatal sujeita-se a regras orçamentárias objetivas.

Ora,
se, por um lado, não conta o Estado com irrestrita capacidade para fazer frente
a satisfação de todos, é imperativo, por outra parte, que o direito garantido
constitucionalmente deva ser efetivado, ainda que de modo não ideal.

Portanto,
iniciou-se o exercício da equação para a determinação das circunstâncias em que
o Estado pode, em tese, invocar, o princípio da reserva do possível e, o que
haverá de ser cotejado, como dito anteriormente, com a razoabilidade e a
proporcionalidade da pretensão e com ingresso, do parâmetro do mínimo
existencial. Celso Antônio Bandeira de Melo, cogitando sobre a natureza
jurídica dos princípios, pontou in litteris:

“(…)
princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema,

verdadeiro
alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas
compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e
inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema
normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o
conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes
componentes do todo unitário que há por nome de sistema jurídico positivo”.

Neste
sentir, é evidente que todo o ordenamento jurídico rege-se por princípios, os
quais, em certa medida, possuem caráter normativo similar ou mesmo superior às
próprias regras jurídicas.

Segundo
Alexy, os princípios são mandamentos de otimização, sendo que, quanto à
imperatividade, possuem o mesmo caráter normativo das regras.

Parte-se,
portanto, da premissa de que tanto os princípios quanto as regras são normas
para todos os efeitos. O que irá, pois, diferenciá-los é que as regras são
necessariamente explícitas quanto ao seu cumprimento, ao passo que os
princípios são informadores das ações que devam ser levadas a efeito,
maximizando os resultados e segundo os critérios da exequibilidade.

No
funcionamento do sistema de normas, não raras vezes uma regra jurídica contrapõe-se
a um determinado princípio. Nesta hipótese, é evidente que o princípio
prevalecerá sobre a regra, sob pena de que, em alguma medida, o sistema seja
ferido em sua essência.

Entretanto,
existem situações em que ocorre a colisão principiológica e, para tanto, não há
regra ou fórmula preestabelecida para que a questão seja dirimida.

Nessa
hipótese, o julgador, no caso concreto, há de fazer uso do princípio da concordância
prática ou da harmonização, que assim pode ser definido: O princípio da
concordância prática é aquele que, diante das situações de conflito ou
concorrência, preconiza em confronto, sem que a aplicação de um imprima a
supressão de outro. Diz-se, no caso, que deve haver cedência recíproca, de
parte a parte, para que se encontre um ponto de convivência entre esses
direitos.

Frise-se,
neste ponto, que os princípios devem ser lidos à luz do sistema, haja vista que
não se comportam como entidades autônomas. Tecido o texto constitucional,
tornam-se interdependentes e formam, nesse contexto, uma amálgama
principiológica, responsável pela coerência, coesão e unidade que blindam e
garantem a higidez e harmonia do sistema jurídico.

Portanto,
é que a interpretação do princípio da reserva do possível há que ser ultimada,
procedendo-se ao ajuste de sua aplicabilidade em cotejo com os demais
princípios que se acham inseridos na ordem brasileira.

A
Convenção Americana de Direitos Humanos, popularmente conhecida como Pacto de
São José da Costa Rica, é um tratado celebrado pelos integrantes da Organização
dos Estados Americanos (OEA), adotada e aberta à assinatura durante a
Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em San José da
Costa Rica, em 22 de novembro de 1969. Entrou em vigor em 18 de julho de 1978,
com a ratificação do décimo primeiro instrumento, de iniciativa de Granada.

O
documento veio a ser ratificado pelo Brasil em 25 de setembro de 1992, vigorando
no ordenamento interno a partir do Decreto 678, de 6 de novembro de 1992. Com a
promulgação da Emenda Constitucional 45 de 2004, restou expresso o mecanismo de
inserção dos tratados internacionais na ordem nacional.

Nesse
contexto, embora fosse desnecessário fazê-lo, a Emenda proclamou de forma
explícita que as normas relacionadas a direitos humanos haveriam de ser
equiparadas às normas internas de cunho constitucional (art. 5º, par. 3º).

O
artigo 26 do tratado mencionado – Desenvolvimento Progressivo, e que se acha
inserido no Capítulo III – Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da Convenção
– acha-se cunhado com a seguinte redação: Os Estados-partes comprometem-se a
adotar as providências, tanto no âmbito interno, como mediante cooperação
internacional, especialmente econômica e técnica, a fim de conseguir
progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas
econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da
Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires,
na medida dos recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios
apropriados.

A
leitura do dispositivo em questão permite a conclusão de que a implementação de
políticas públicas e a adoção das providências adequadas à consecução da
efetividade dos direitos ali descritos, incluídos os de natureza social,
acham-se atreladas à disponibilidade de recursos do Estado-Parte.

Nesse
diapasão e porque, na lógica da integração legal, a expressão “na medida dos
recursos disponíveis” está efetivamente positivada no Direito Brasileiro,
afigura-se como perfeitamente sustentável a possível negativa do Estado frente
a uma determinada e concreta pretensão. É o que decorre dessa interpretação.

Em
linhas gerais, todos os direitos fundamentais alinhados na Constituição Federal
ostentam igual relevo e devem ser atendidos de forma integral para o
cumprimento de seu mister.

Há de
se reconhecer, de outro lado, que o direito à saúde, está intimamente ligado à
própria vida, situa-se em nível privilegiado no que se refere aos demais
direitos, o que explica, em parte, que os doutrinadores brasileiros, quando do
estudo do princípio da reserva do possível, tenham se dedicado a analisar com
maior atenção esta específica área, a qual, se não atendida, potencialmente põe
em risco o princípio da dignidade humana, pular principal de todo sistema
constitucional brasileiro.

Grande
parte das decisões judiciais hoje debatidas acerca da matéria refere- se a esse
tema, na medida em que, sem saúde, o homem não pode sequer existir para ser
titular dos outros direitos que lhe são assegurados pela Constituição Federal
brasileira.

A
relevância do direito à saúde, de certo modo, sobrepõe-se aos demais direitos,
o que força a compreensão doutrinária e jurisprudencial de que a invocação do
princípio da reserva do possível nessas hipóteses não é, via de regra,
materialmente aceitável, porque, de forma pungente, contrapõe-se a uma situação
em que se contempla o mínimo existencial.

Também
outros direitos, tais como, educação e moradia, permitem o vislumbre do mesmo
mínimo existencial. Entretanto, parece ser no direito à saúde que esse
parâmetro se revela de maneira mais premente e inadiável, o que vem a
determinar o acolhimento de grande parte das pretensões.

Neste
ponto, portanto, há a tendência, por parte dos julgadores, de afastamento da
alegação do princípio invocado pelo Estado, até porque possível denegação do
direito nessa seara teria, potencialmente, efeitos deletérios irreversíveis.

Ainda
assim, há que se ter em conta, por outro lado, a pertinência da pretensão sob a
ótica de quem pede, tendo em mira a análise da razoabilidade do pleito como
elemento equilibrador da equação.

Com
efeito, existem julgados em que não ocorreu o acolhimento da pretensão posta em
juízo porque, ainda que de forma implícita, entendeu-se por não presente a
plausibilidade sob a ótica meritória.

Analisam-se
a seguir, portanto, algumas decisões judiciais acerca da composição desta
ponderação, não somente no campo da saúde como em relação a outros direitos.

A
aplicabilidade do princípio da reserva do possível tem sido vista com relação
aos vários direitos garantidos constitucionalmente, não se limitando, ao que
poderia parecer à primeira vista, às questões relacionadas ao direito à saúde,
muito embora, é verdade, seja neste campo que o debate se revele mais visível.

Com
efeito, a mesma discussão abre-se também com relação ao direito à educação, o
direito à moradia, o direito ao transporte, o direito ao acesso à justiça e até
mesmo no que concerne à abertura de vagas no sistema carcerário, este último
aspecto com a finalidade de validar o princípio da dignidade humana do
encarcerado.

Tribunais
de todo o país têm enfrentado tais questões nos últimos anos e observa-se que
não existe, ainda, homogeneidade quanto ao conteúdo das decisões, nem mesmo no
âmbito de uma mesma Corte. 13

Tal
fenômeno atesta, ao menos de forma parcial, que o conceito ainda não atingiu um
patamar de estabilidade jurídica no que pertine à sua interpretação,
notadamente no que se refere à consideração atinente à razoabilidade da
pretensão sob a ótica do próprio pretendente, a par da incapacidade financeira
do Estado recorrentemente alegada como resposta.

As
decisões escolhidas possuem, portanto, caráter meramente informador quanto aos
argumentos comumente utilizados para o desate da matéria, não se afirmando, por
óbvio, acerca da inexistência de outras decisões das mesmas Cortes, mas com
posicionamento diverso.

De
todo modo, como são elas relativamente recentes, são capazes de ilustrar as
tendências relativas ao entendimento jurisprudencial vigente. Nesta
conformidade, listam-se, por assunto, as seguintes decisões.

No que
pertine, por primeiro, ao fornecimento de medicamentos pelo sistema público de
saúde, consolidou-se o entendimento no Supremo Tribunal Federal de que a
invocação do princípio da reserva do possível, “de per si”, não é capaz de
elidir a pretensão. Com efeito, apenas em situações muito excepcionais, a
recusa ao fornecimento da medicação poderá ser admitida.

A
circunstância do mínimo existencial, sob a acepção de que a ausência da medicação
prescrita é capaz de, concretamente, comprometer não somente a saúde, mas
também a própria vida do paciente.

Cabe
aduzir que a esse propósito, o julgado abaixo, que vem sendo secundado pelos
Tribunais Estaduais de todo o país. Trata-se de demanda originária do Estado de
Pernambuco em face de decisão que o condenou a fornecer medicamento a paciente
que não dispunha de recursos financeiros para tanto.

Observa-se
que o inconformismo do Estado à decisão judicial, manifestado pela interposição
de Agravo Regimental, acarretou-lhe até mesmo a imposição de pena de litigância
de má-fé, destacando-se da ementa a menção à existência de jurisprudência
assentada sobre a matéria.14

Ei-lo:

RECURSO
EXTRAORDINÁRIO. Inadmissibilidade. Fornecimento de medicamentos. Direito à
saúde. Jurisprudência assentada. Ausência de razões novas. Decisão mantida.
Agravo regimental improvido. Nega-se provimento a agravo regimental tendente a
impugnar, sem razões novas, decisão fundada em jurisprudência assente na Corte.
2. RECURSO. Agravo. Regimental. Jurisprudência assentada sobre a matéria.
Caráter meramente abusivo. Litigância de má-fé. Imposição de multa. Aplicação
do art. 557, § 2º, cc. arts. 14, II e III, e 17, VII, do CPC. Quando abusiva a
interposição de agravo, manifestamente inadmissível ou infundado, deve o
Tribunal condenar o agravante a pagar multa ao agravado”. (STF – RE: 534908 PE,
Relator: Min. CEZAR PELUSO, Data de Julgamento: 11/12/2007, Segunda Turma, Data
de Publicação: DJe-031 DIVULG 21-02-2008 PUBLIC 22-02- 2008 EMENT. VOL-02308-07
PP-01408 LEXSTF v. 30, n. 353, 2008, p. 267- 272).15

O
direito à saúde não é uma condição abstrata, mas, sim, uma circunstância que
abarca toda e qualquer providência que seja necessária à manutenção do estado
saudável e à cura de doenças.

Incluem-se
aqui, portanto, os tratamentos, medicações, intervenções cirúrgicas e os
materiais necessários à sua realização, assim como terapias e quaisquer outras
providências imprescindíveis ao restabelecimento da vida saudável do indivíduo.

Demais
disso, é perceptível que a negativa a essa espécie de prestação não somente
implica, como dito, no risco à própria vida, como também afronta, de maneira
contundente, o princípio da dignidade humana, paradigma de todo o sistema
constitucional.

Parece
não restar dúvida, quanto a esse tópico, que a jurisprudência efetivamente se
consolidou sobre o tema e que a invocação do princípio da reserva do possível,
nesse específico contexto, não há de ser aceita.

Anote-se,
de outro lado, que até mesmo medicamentos de caráter experimental têm
determinado o provimento da pretensão, mormente quando 15 não exista fármaco
sucedâneo e que, de outra parte, seja constatada a específica prescrição
médica.

Inúmeras
decisões de Cortes Estaduais têm determinado essa providência a cargo do Poder
Público, sendo certo que a questão, até o momento, não foi submetida de forma
direta às instâncias superiores. De todo modo, incidentalmente, os Tribunais
superiores resvalaram na questão.

Malgrado
seja fato inconteste a adoção de posicionamento pró-paciente em face do Estado,
há situações em que a concessão da pretensão não se afigura possível.

O
Supremo Tribunal Federal reconheceu como de Repercussão Geral a questão
atinente à falta de registro de medicação na Anvisa, procedendo à conclusão de
que o direito à saúde não é absoluto e que há barreiras legais a esta
pretensão.

Inobstante
tal conclusão, é interessante ressaltar que, do corpo do V. Acórdão, constou
expressamente a “competência do administrador público para gerir de maneira
proba e razoável os recursos disponíveis”.

De
toda forma, a menção destacada acima se afigurou como de extrema utilidade para
o estudo do tema, ainda que, objetivamente, o fato antecedente já fosse
suficiente a afastar a pretensão da parte.

Na
ementa da Decisão, verifica-se que o alijamento da pretensão se deu com base no
parâmetro legal. A invocação do princípio da reserva do possível, aqui,
funcionou apenas como abordagem incidental:

SAÚDE
– MEDICAMENTO – FALTA DE REGISTRO NA AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA –
AUSÊNCIA DO DIREITO ASSENTADA NA ORIGEM – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO
GERAL – CONFIGURAÇÃO. Possui repercussão geral a controvérsia acerca da
obrigatoriedade, ou não, de o Estado, ante o direito à

saúde
constitucionalmente garantido, fornecer medicamento não registrado na Agência
Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA.(STF – RE 6577180.16 RG, Relator(a):
Min. MARCO AURÉLIO 4 , julgado em 17/11/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-051 DIVULG
09-03-2012 PUBLIC 12-03-2012 REPUBLICAÇÃO: DJe-092 DIVULG 10-05-2012 PUBLIC
11-05-2012).

Essa
mesma controvérsia já havia sido enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça
em outras oportunidades, tal como se verifica no julgado que segue:

ADMINISTRATIVO,
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO IMPORTADO SEM REGISTRO NA ANVISA. AUSÊNCIA DE
DIREITO LÍQUIDO E CERTO.

1.
Trata-se de recurso ordinário em mandado de segurança no qual se objetiva o
fornecimento à impetrante de medicamento importado sem registro na Anvisa
(substância química: Tetrabenazina; nomes comerciais: Nitoman, Xenazine ou
Revocon).

2. O
Tribunal de Justiça do Paraná, ao denegar a segurança, por maioria, externou o
entendimento de que, “não sendo o medicamento postulado registrado na Anvisa,
não é possível ao Estado do Paraná fornecer o referido medicamento a senhora
impetrante.

Nestas
condições, voto para ser extinto o mandado de segurança sem julgamento do
mérito porque ausente direito líquido e certo a ser tutelado (fl. 139).

3. Não
se observam a liquidez e a certeza do direito invocado pela impetrante nem a
prática de ato ilegal ou de abuso de poder.

4. O
fato de o medicamento pretendido não ter registro na Anvisa e, portanto, não
poder ser comercializado no território nacional, denota que o alegado direito
não é líquido nem certo para fins de impetração de mandado de segurança,
porquanto o seu exercício depende de eventual autorização da Anvisa para que o
medicamento seja importado e distribuído pelo Estado.

5. A
entrada de medicamentos no território nacional, sem o devido registro na
Anvisa, configura o crime previsto no artigo 273, § 1º-B, I, do Código Penal;
fato que não pode ser desprezado pelo administrador público responsável pelo
fornecimento do medicamento em questão, razão pela qual não há falar que o seu
não fornecimento caracteriza ato ilegal ou de abuso de poder. 6. Recurso
ordinário não provido. (STJ – Ministro Benedito17 Gonçalves, RECURSO EM MANDADO
DE SEGURANÇA Nº 35.434 – PR (2011⁄0192002-0).

Decorre
também dessa Decisão que, malgrado seu relevo, tampouco o direito à saúde é
ilimitado e absoluto. Nesta hipótese, a Corte procedeu a verdadeira operação de
ponderação para, a final, reconhecer a falta da razoabilidade da pretensão, em
sua própria origem.

A
análise dessas duas decisões revela que se consolidou o entendimento de que a
medicação importada sem registro na Anvisa, ainda que potencialmente eficiente,
é elemento obstativo da pretensão, prejudicando- se, de forma objetiva, o
próprio exame da questão atinente ao custo, invariavelmente invocado pelo
Estado para elidir o acolhimento do pedido.

E mais
do que isso, o entendimento expressado nessas decisões é emblemático no que
tange ao reconhecimento de que o direito à saúde, sob a ótica formal, é
relativo. Como decorre da conclusão, ainda que a droga em questão fosse a única
capaz de salvar uma vida, não poderia ser chancelada pelo Estado-Juiz pelas
razões expostas no julgamento dos recursos.

No que
concerne, por seu turno, ao fornecimento de medicações de alto custo, os
Tribunais do país têm entendido que o deferimento da pretensão há de ser feito
com reservas, porquanto reconhecida e notória a limitação econômica estatal.
Essa questão foi analisada de forma expressa no julgado abaixo, o qual, dentre
outros fundamentos, reconheceu a inexistência da prova de que outras medicações
seriam ineficazes quanto aos resultados almejados.

Em sua
essência, o pedido tenha sido indeferido por questão relacionada à falta de
prova pré-constituída em Mandado de Segurança, o que, por si só, já determinaria
a denegação da ordem, o fato é que outros argumentos foram alinhados no corpo
da decisão, trazendo-se a lume, vez mais, a questão relacionada ao princípio da
reserva do possível.

Observem-se,
a propósito, os itens 5 e seguintes da decisão: PROCESSUAL CIVIL E
ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTO DE18 ALTO CUSTO. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA E CONSEQUENTEMENTE
DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL.

1. “A
concessão da ordem, em sede de Mandado de Segurança, reclama a demonstração
inequívoca, mediante prova pré-constituída, do direito líquido e certo
invocado” (RMS 24.988⁄PI, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ de 18
de fevereiro de 2009).

2. No
caso em foco, o compulsar dos autos denota que não há prova pré- constituída a
embasar o pleito deduzido neste writ of madamus. Deveras, a prescrição
medicamentosa do remédio Enbrel por médico conveniado ao Sistema Único de Saúde
(fl. 15) não é suficiente para comprovar que a resposta do paciente ao
tratamento será melhor do que aquela obtida com os medicamentos oferecidos pelo
SUS (acitretina e ciclos porina) (fl. 18).

3. A
produção da prova subjacente à assertiva de que o tratamento do paciente com a
droga Enbrel surtirá mais efeito é de grande complexidade e, a toda evidência,
demanda a realização de perícia técnica, cuja dilação probatória é incompatível
com rito célere do mandado de segurança.

4.
Ainda sob esse ângulo, o documento indicativo de que o tratamento deve ser
realizado com o fármaco Enbrel (receita à fl. 15) foi produzido unilateralmente,
sem o crivo do contraditório. Ademais, a contraprova produzida pelo impetrado,
consistente na Nota Técnica NAT⁄AF n. 0321⁄2007 (fls. 74-76), milita em sentido
oposto à pretensão do impetrante, pois consignou que:

(a) o
etanercepte, substância ativa do Enbrel, é de alto custo, relativamente nova e
ainda não testada satisfatoriamente em pessoas portadores de psoríase; (b) o
relatório médico de fl. 28 informa que o paciente foi tratado com acitretina,
corticoterapia sistêmica e tópica e hidratantes, mas não se refere aos
medicamentos oferecidos pelo Ministério da Saúde para o tratamento de psoríase
(ciclosporina e acitretina); e (c) a droga em comento foi recentemente
incluída, pelo Ministério da Saúde, no rol de medicamentos com dispensação em
caráter excepcional, através da Portaria MS⁄GM n. 2577⁄2006, e a sua utilização
foi tão somente

autorizada
por aquele órgão para o tratamento de artrite reumatoide. Logo, a questão
gravitante em torno da eficácia superior do Enbrel para o tratamento de
psoríase e da menor manifestação de efeitos colaterais advindos da sua
utilização deve ser analisada à luz do processo cognitivo

19 (Precedentes:
RMS 22.115⁄SC, Relator Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ de 22
de junho de 2007 e RMS 17.873⁄MG, Relator Ministro Teori Albino Zavascki,
Primeira Turma, DJ de 22 de novembro de 2004).

5.
Apenas a título de argumento obter dictum, as ações ajuizadas contra os entes
públicos com escopo de obrigar-lhes indiscriminadamente ao fornecimento de
medicamento de alto custo, devem ser analisadas com muita prudência.

6. O
entendimento de que o Poder Público ostenta a condição de satisfazer todas as necessidades
da coletividade ilimitadamente, seja na saúde ou em qualquer outro segmento, é
utópico; pois o aparelhamento do Estado, ainda que satisfatório aos anseios da
coletividade, não será capaz de suprir as infindáveis necessidades de todos os
cidadãos.

7.
Esse cenário, como já era de se esperar, gera inúmeros conflitos de interesse
que vão parar no Poder Judiciário, a fim de que decida se, nesse ou naquele
caso, o ente público deve ser compelido a satisfazer a pretensão do cidadão. E
o Poder Judiciário, certo de que atua no cumprimento da lei, ao imiscuir-se na
esfera de alçada da Administração Pública, cria problemas de toda ordem, como
desequilíbrio de contas públicas, o comprometimento de serviços públicos,
dentre outros.

8. O
art. 6º da Constituição Federal, que preconiza a saúde como direito social,
deve ser analisado à luz do princípio da reserva do possível, ou seja, os
pleitos deduzidos em face do Estado devem ser logicamente razoáveis e, acima de
tudo, é necessário que existam condições financeiras para o cumprimento de
obrigação. De nada adianta uma ordem judicial que não pode ser cumprida pela
Administração por falta de recursos.

9.
Recurso ordinário não provido. (STJ – MINISTRO BENEDITO GONÇALVES, RECURSO EM
MANDADO DE SEGURANÇA Nº 28.962 – MG (2009⁄0037261-9).

Ressalte-se
a opção do Ministro Relator em discorrer sobre a problemática do princípio da
reserva do possível, para concluir, como dito alhures, que o direito à saúde
não é absoluto e que os pedidos devem ser “logicamente razoáveis”. A “ratio” da
decisão não se fundou na falta de recursos, mas, sim, na própria falta de
razoabilidade objetiva da pretensão.

Ainda
no tópico atinente ao direito à saúde, as situações de faltas de vagas em
estabelecimentos hospitalares têm sido reconhecidas como de responsabilidade do
Estado. nas hipóteses de inexistência, o Estado deverá custear a eventual
ocupação em estabelecimento particular, tal como decidido no julgado abaixo.

Esta,
a decisão:

ADMINISTRATIVO.
PROCESSUAL CIVIL. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO-HOSPITALAR EM REDE
PARTICULAR. PEDIDO SUBSIDIÁRIO NA FALTA DE LEITO NA REDE PÚBLICA. GARANTIA DE EFETIVIDADE
DA TUTELA JUDICIAL.

1. Não
há violação ao art. 535 do CPC quando a prestação jurisdicional é dada na
medida da pretensão deduzida e a decisão está suficientemente fundamentada.

2. O
direito à saúde, como consectário da dignidade da pessoa humana, deve perpassar
todo o ordenamento jurídico pátrio, como fonte e objetivo a ser alcançado
através de políticas públicas capazes de atender a todos, em suas necessidades
básicas, cabendo, portanto, ao Estado, oferecer os meios necessários para a sua
garantia.

3. Uma
vez reconhecido, pelas instâncias ordinárias, o direito a tratamento médico-hospitalar
na rede pública de saúde, o resultado prático da decisão deve ser assegurado,
nos termos do artigo 461, § 5º, do CPC, com a possibilidade de internação na
rede particular de saúde, subsidiariamente, na hipótese de lhe ser negada a
assistência por falta de vagas na rede hospitalar do SUS. Recurso especial
provido. (STJ – RELATOR MINISTRO HUMBERTO MARTINS, RECURSO ESPECIAL Nº
1.409.527 – RJ (2013⁄0288479-1).

A
particularidade do entendimento expressado nessa decisão atrela-se ao fato de
que a prescrição de internação é fato urgente e insubstituível e que a limitação
do número de leitos implica gravame a ser contornado por outros meios,
notadamente assunção de despesas de estabelecimento privado.

Em
princípio, pois, deve o Estado responder pela internação hospitalar, seja providenciando
a alocação do paciente em hospital adequado da região, seja custeando a
utilização de estabelecimento particular. A falta de providências desta ordem
fragilizaria o princípio constitucional da dignidade humana.  

Conforme
afirmado inicialmente, o princípio da reserva do possível não se esgota na área
da saúde, muito embora a relevância do tema tenha determinado maior atenção
neste específico segmento.


outras circunstâncias, entretanto, em que ocorre a mesma ponderação e discussão.
Fulcrado no direito à educação e nos princípios protetivos da criança, o
Supremo Tribunal Federal determinou ao Município de São Paulo matricular
crianças em unidades de ensino infantil próximas de sua residência ou do
endereço de trabalho de seus responsáveis, sob pena de imposição de multa.

Nessa
decisão, discorreu-se de forma ampla sobre a problemática da questão do
princípio da reserva do possível e sobre a imperiosa necessidade de efetivação
de “escolhas trágicas” ante o reconhecimento da escassez dos recursos públicos.

Concluiu-se,
nesta esteira, pela relevância da pretensão, ainda que afirmada a com tida
capacidade financeira da municipalidade para o atendimento da pretensão.

Segue
a extensa ementa:

CRIANÇA
DE ATÉ CINCO ANOS DE IDADE – ATENDIMENTO EM CRECHE E EM PRÉ-ESCOLA – SENTENÇA
QUE OBRIGA O MUNICÍPIO DE SÃO PAULO A MATRICULAR CRIANÇAS EM UNIDADES DE ENSINO
INFANTIL PRÓXIMAS DE SUA RESIDÊNCIA OU DO ENDEREÇO DE

TRABALHO
DE SEUS RESPONSÁVEIS LEGAIS, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA POR CRIANÇA NÃO ATENDIDA
– LEGITIMIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DAS “ASTREINTES” CONTRA O PODER PÚBLICO –
DOUTRINA – JURISPRUDÊNCIA – OBRIGAÇÃO ESTATAL DE RESPEITAR OS DIREITOS DAS
CRIANÇAS – EDUCAÇÃO INFANTIL – DIREITO ASSEGURADO PELO PRÓPRIO TEXTO
CONSTITUCIONAL (CF, ART. 208, IV, NA REDAÇÃO DADA PELA EC Nº 53/2006) – COMPREENSÃO
GLOBAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO – DEVER JURÍDICO CUJA EXECUÇÃO SE
IMPÕE AO PODER PÚBLICO, NOTADAMENTE AO MUNICÍPIO (CF, ART. 211, § 2º) –
LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM CASO DE OMISSÃO
ESTATAL NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PREVISTAS NA CONSTITUIÇÃO – INOCORRÊNCIA
DE TRANSGRESSÃO AO POSTULADO DA SEPARAÇÃO DE PODERES – PROTEÇÃO JUDICIAL DE
DIREITOS SOCIAIS, ESCASSEZ DE RECURSOS E A QUESTÃO DAS “ESCOLHAS TRÁGICAS” –
RESERVA DO POSSÍVEL, MÍNIMO EXISTENCIAL, DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E VEDAÇÃO
DO RETROCESSO SOCIAL – PRETENDIDA EXONERAÇÃO DO ENCARGO CONSTITUCIONAL POR
EFEITO DE SUPERVENIÊNCIA DE NOVA REALIDADE FÁTICA – QUESTÃO QUE SEQUER FOI
SUSCITADA NAS RAZÕES DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PRINCÍPIO “JURA NOVIT CURIA” –
INVOCAÇÃO EM SEDE DE APELO EXTREMO – IMPOSSIBILIDADE – RECURSO DE AGRAVO
IMPROVIDO. POLÍTICAS PÚBLICAS, OMISSÃO ESTATAL INJUSTIFICÁVEL E INTERVENÇÃO
CONCRETIZADORA DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE EDUCAÇÃO INFANTIL: POSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL.

– A
educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que,
deferida às crianças, a estas assegura, para efeito de seu desenvolvimento
integral, e como primeira etapa do processo de educação básica, o atendimento
em creche e o acesso à pré-escola (CF/1988, art. 208, IV).

Essa
prerrogativa jurídica, em consequência, impõe, ao Estado, por efeito da alta
significação social de que se reveste a educação infantil, a obrigação constitucional
de criar condições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor
das “crianças até 5 (cinco) anos de idade” (CF/1988, art. 208, IV), o efetivo
acesso e atendimento em creches e unidades de pré- escola, sob pena de
configurar-se inaceitável omissão governamental, apta a frustrar, injustamente,
por inércia, o integral adimplemento, pelo Poder Público, de prestação estatal
que lhe impôs o próprio texto da Constituição Federal.

– A
educação infantil, por qualificar-se como direito fundamental de toda criança,
não se expõe, em seu processo de concretização, as avaliações meramente
discricionárias da Administração Pública nem se subordina a razões de puro
pragmatismo governamental.

– Os
Municípios – que atuarão, prioritariamente, no ensino fundamental e na educação
infantil (CF/1988, art. 211, § 2º) – não poderão se demitir do mandato
constitucional, juridicamente vinculante, que lhes foi outorgado pelo art. 208,
IV, da Lei Fundamental da República, e que representa fator de limitação da
discricionariedade político-administrativa dos entes municipais, cujas opções,
tratando-se do atendimento das crianças em creche (CF/1988, art. 208, IV), não
podem ser exercidas de modo a comprometer, com apoio em juízo de simples
conveniência ou de mera oportunidade, a eficácia desse direito básico de índole
social.


Embora inquestionável que resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e
Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela- se
possível, no entanto, ao Poder Judiciário, ainda que em bases excepcionais,
determinar, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela
própria Constituição, sejam estas implementadas, sempre que os órgãos estatais
competentes, por descumprirem os encargos político- jurídicos que sobre eles
incidem em caráter impositivo, vierem a comprometer, com a sua omissão, a
eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de
estatura constitucional.

Cumpre
destacar ainda a Lei Berenice Piana (12.764/12) criou a Política Nacional de
Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, que
determina o direito dos autistas a um diagnóstico precoce, tratamento, terapias
e medicamento pelo Sistema Único de Saúde; o acesso à educação e à proteção
social; ao trabalho e a serviços que propiciem a igualdade de oportunidades.
Esta lei também estipula que a pessoa com transtorno do espectro autista é
considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais.

Isto é
importante porque permitiu abrigar as pessoas com TEA nas leis específicas de
pessoas com deficiência, como o Estatuto da Pessoa com Deficiência (13.146/15),
bem como nas normas internacionais assinadas pelo Brasil, como a Convenção das
Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (6.949/2000).

A
medida visa eliminar e prevenir barreiras que impeçam ou prejudiquem o acesso à
Justiça estadual por esse público e está em consonância com a Resolução nº
401/2021, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) 
e com a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº
13.146/2015).

Por
conta disso, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) reservou uma vaga
exclusiva para autistas, em frente à recepção de sua sede, no estacionamento
voltado ao público externo. A medida visa eliminar e prevenir barreiras que
impeçam ou prejudiquem o acesso à Justiça estadual por esse público e está em
consonância com a Resolução nº 401/2021, do Conselho Nacional de Justiça
(CNJ)  e com a Lei Brasileira de Inclusão
da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015).

 Vale lembrar que a vaga exclusiva pode ser
utilizada tanto pelo autista condutor ou passageiro do veículo. Em caso de não
haver vaga com indicação de uso por pessoa autista, a mesma tem direito à vaga
para pessoa com deficiência, uma vez que a Lei nº 12.764/2012 reconhece a
pessoa com transtorno do espectro autista como pessoa com deficiência, para
todos os efeitos legais.

No
caso do Estado do Rio de Janeiro, o atendimento de autistas tem sido
emblemático, além do princípio da reserva do possível, há o fato de que o
referido Estado se encontra em Regime de Recuperação Fiscal. Sentença determina
criação de unidades especializadas.

O Novo
Regime de Recuperação Fiscal, instituído pela Lei Complementar Federal nº
159/2017, com as alterações promovidas pela Lei Complementar Federal nº
178/2021,  tem o prazo de vigência de até
9 (nove) exercícios financeiros, a contar da data da sua entrada em vigor em 30
de junho de 2022.

Os
Estados de Goiás, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul tiveram seus Planos de
Recuperação homologados e os respectivos Regimes encontram-se vigentes. O
Estado de Minas Gerais teve o seu pedido de adesão aprovado e, no momento, está
elaborando o seu Plano de Recuperação.

A
possibilidade de um acordo da DPRJ (Defensoria Pública do Rio de Janeiro) com o
Estado está em fase de negociação para fins de cumprimento da sentença
proferida em ação coletiva ajuizada, em 2005, pela instituição. A decisão
determina a criação de centros especializados voltados especificamente ao
tratamento das pessoas com autismo e o caso também foi levado pela Defensoria à
Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que aceitou a denúncia e no
momento analisa os autos para decisão.

– O
tratamento do autismo é uma questão relacionada aos direitos humanos e uma
responsabilidade do Estado brasileiro em geral, e não importa para o cidadão se
a atribuição é federal, estadual ou municipal. Levando o caso à Comissão, vamos
contar com o ponto de vista internacional em relação à omissão do Poder Público
em fornecer o tratamento especializado para o autismo – observa o coordenador
do NUPED.

As
pessoas com dificuldade em obter o tratamento adequado ao autismo no serviço
público podem procurar o NUPED para a adoção das medidas necessárias a cada
caso. O atendimento deve ser agendado pelos telefones (21) 2332-6338/6342/6343.

DESCUMPRIMENTO
DE POLÍTICAS PÚBLICAS DEFINIDAS EM SEDE CONSTITUCIONAL: HIPÓTESE LEGITIMADORA
DE INTERVENÇÃO JURISDICIONAL. – O Poder Público – quando se abstém de cumprir,
total ou parcialmente, o dever de implementar políticas públicas definidas no
próprio texto constitucional – transgride, com esse comportamento negativo, a própria
integridade da Lei Fundamental, estimulando, no âmbito do Estado, o preocupante
fenômeno da erosão da consciência constitucional. Precedentes: ADI 1.484/DF,
Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.

– A
inércia estatal em adimplir as imposições constitucionais traduz inaceitável
gesto de desprezo pela autoridade da Constituição e configura, por isso mesmo,
comportamento que deve ser evitado.

É que
nada se revela mais nocivo, perigoso e ilegítimo do que elaborar uma Constituição,
sem a vontade de fazê-la cumprir integralmente, ou, então, de apenas executá-la
com o propósito subalterno de torná-la aplicável somente nos pontos que se
mostrarem ajustados à conveniência e aos desígnios dos governantes, em
detrimento dos interesses maiores dos cidadãos.

– A
intervenção do Poder Judiciário, em tema de implementação de políticas governamentais
previstas e determinadas no texto constitucional, notadamente na área da
educação infantil (RTJ 199/1219-1220), objetiva neutralizar os efeitos lesivos
e perversos, que, provocados pela omissão estatal, nada mais traduzem senão
inaceitável insulto a direitos básicos que a própria Constituição da República
assegura à generalidade das pessoas. Precedentes.

A
CONTROVÉRSIA PERTINENTE À “RESERVA DO POSSÍVEL” E A INTANGIBILIDADE DO MÍNIMO
EXISTENCIAL: A QUESTÃO DAS “ESCOLHAS TRÁGICAS”.

– A
destinação de recursos públicos, sempre tão dramaticamente escassos, faz
instaurar situações de conflito, quer com a execução de políticas públicas definidas
no texto constitucional, quer, também, com a própria implementação de direitos
sociais assegurados pela Constituição da República, daí resultando contextos de
antagonismo que impõem, ao Estado, o encargo de superá-los mediante opções por
determinados valores, em

detrimento
de outros igualmente relevantes, compelindo, o Poder Público, em face dessa
relação dilemática, causada pela insuficiência de disponibilidade financeira e
orçamentária, a proceder a verdadeiras “escolhas trágicas”, em decisão
governamental cujo parâmetro, fundado na dignidade da pessoa humana, deverá ter
em perspectiva a intangibilidade do mínimo existencial, em ordem a conferir
real efetividade às normas programáticas positivadas na própria Lei
Fundamental. Magistério da doutrina.

– A
cláusula da reserva do possível – que não pode ser invocada, pelo Poder
Público, com o propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação
de políticas públicas definidas na própria Constituição – encontra insuperável
limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no
contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da
essencial dignidade da pessoa humana. Doutrina. Precedentes.

 – A noção de “mínimo existencial”, que
resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF/1988,
art. 1º, III, e art. 3º, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja
concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência
digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de
liberdade e, também, as prestações positivas originárias do Estado,
viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o
direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente,
o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o
direito à alimentação e o direito à segurança. Declaração Universal dos
Direitos da Pessoa Humana, de 1948 (Artigo XXV).

A
PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO
INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. – O princípio da
proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social,
que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela
formação social em que ele vive.

– A
cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do
Estado (como o direito à educação, o direito à saúde 5 ou o direito à segurança
pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais
individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais
prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou
suprimidos pelo Estado. Doutrina.

Em
consequência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos
prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se
obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los,
abstendo-se de frustrar – mediante supressão total ou parcial – os direitos
sociais já concretizados.

LEGITIMIDADE
JURÍDICA DA IMPOSIÇÃO, AO PODER PÚBLICO, DAS “ASTREINTES”. – Inexiste obstáculo
jurídico-processual à utilização, contra entidades de direito público, da multa
cominatória prevista no § 5º do art. 461 do CPC.

A
“astreinte” – que se reveste de função coercitiva – tem por finalidade específica
compelir, legitimamente, o devedor, mesmo que se cuide do Poder Público, a
cumprir o preceito, tal como definido no ato sentencial. Doutrina. Jurisprudência.
(STF ARE 639337 AgR/SÃO PAULO, AG. REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO
Relator(a): Min. CELSO DE MELLO; Julgamento: 23/08/2011. Órgão Julgador:
Segunda Turma).

Em
outras hipóteses, similar pretensão foi afastada à vista do reconhecimento de
que, malgrado não houvesse vagas para todos os alunos, o Estado não teria sido
omisso.

Destaca-se,
a propósito, o seguinte julgado, este emanado do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL
CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EDUCAÇÃO INFANTIL. DEVER DO
MUNICÍPIO. AMPLIAÇÃO DA REDE DE ENSINO. OMISSÃO DO MUNICÍPIO INDEMONSTRADA.
ACÓRDÃO RECORRIDO QUE DECIDIU A CONTROVÉRSIA À LUZ DE INTERPRETAÇÃO
CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. SÚMULA 07⁄STJ.
1. Fundando-se o Acórdão recorrido em interpretação de matéria eminentemente constitucional,
descabe a esta Corte examinar a questão, porquanto reverter o julgado
significaria usurpar competência que, por expressa determinação da Carta Maior,
pertence ao Colendo STF, e a competência traçada para este Eg. STJ restringe-se
unicamente à uniformização da legislação infraconstitucional. Precedentes
jurisprudenciais do STJ: REsp 806592, Relator Min. Luiz Fux, DJ 28.03.2007;
RESP 804595⁄SC, DJ de 14.12.2006 e Ag 794505⁄SP, DJ de 01.02.2007.

2.
In casu
, a questão debatida nos autos – obrigação do poder público municipal
de ampliar o número de vagas nas escolas, educação infantil foi examinada pelo
Tribunal a quo à luz de aspectos eminentemente constitucionais, consoante se
conclui das razões expendidas no voto condutor do acórdão hostilizado, o que
revela a impossibilidade de exame da questão em sede de recurso especial.

3.
Nada obstante, e apenas em caráter obiter dictum, o acórdão recorrido, à
guisa de exauriente cognição probatória, verificou que a insuficiência de vagas
na rede de ensino da municipalidade in foco não decorre de negligência ou
inadequação da Administração Pública, consoante se infere do excerto do voto
condutor do acórdão hostilizado

(…) É
verdade que muitas crianças ainda aguardam em filas de espera para ingressar
nos educandários, mas restou comprovado que houve aumento do número de vagas,
ou seja, houve a aplicação de recursos públicos na educação municipal, ainda
que insuficientes para atender toda a demanda existente na municipalidade, a
descaracterizar a alegada omissão do poder público municipal.

Ademais,
a ampliação física da rede de ensino restou bem demonstrada no documento de fl.
172, juntado em contestação pelo Município de Sapiranga, nele listadas mais de
dez obras entre os anos de 1999 e 2003.

Além
disso, evidenciou, também em contestação, o aumento na oferta de vagas nas
escolas de educação infantil de 815 em 1997, para 2479 em 2004 (fl. 171), sendo
que somente em 2004 houve o acréscimo de 475 novas

vagas,
conforme declarou a Supervisora das Escolas Municipais de Educação Infantil,
Jane Dodde Schuh (fls. 169-70), aspectos fático- probatórios, cujo
revolvimento, frise-se, resta obstado em sede de recurso especial, ante a
incidência da Súmula 07⁄STJ. 4. Recurso especial não conhecido” (STJ – RECURSO
ESPECIAL Nº 892.434 – RS (2006⁄0218767-5); RELATOR MINISTRO LUIZ FUX; J.
12/08/2008).

Privilegiou-se,
de uma certa forma, o conteúdo programático do Poder Executivo, tudo a afastar
a necessidade de interferência do Poder Judiciário na condução desta específica
questão.

Acerca
de outras matérias também já se pronunciaram as Cortes Superiores. No julgado
que segue, foi afastada a alegação do princípio da reserva do possível no que
se refere a políticas públicas atinentes ao meio ambiente: Agravo regimental no
recurso extraordinário. Constitucional. Ação civil pública. Defesa do meio
ambiente. Implementação de políticas públicas. Possibilidade. Violação do
princípio da separação dos poderes. Não ocorrência. Insuficiência orçamentária.
Invocação. Impossibilidade. Precedentes.

1. A
Corte Suprema já firmou a orientação de que é dever do Poder Público e da
sociedade a defesa de um meio ambiente ecologicamente equilibrado para as
presentes e futuras gerações.

2.
Assim, pode o Poder Judiciário, em situações excepcionais, determinar que a
Administração pública adote medidas assecuratórias desse direito, reputado
essencial pela Constituição Federal, sem que isso configure violação do
princípio da separação de poderes.

3. A
Administração não pode justificar a frustração de direitos previstos na Constituição
da República sob o fundamento da insuficiência orçamentária.

4.
Agravo regimental não provido. (STF – RE 658171 AgR, Relator(a): Min. DIAS
TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 01/04/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-079
DIVULG 25-04- 2014 PUBLIC. 28-04-2014).

Nesta
decisão, a relevância e a essencialidade da argumentação da parte frente ao
argumento estatal de insuficiência de recursos. E, ademais, restou consignado
que esta forma de determinação de cunho judicial não é capaz de violar o
princípio da separação dos poderes.

Nesta
outra decisão que abaixo segue, houve também negativa quanto ao acolhimento de
invocação do princípio da reserva do possível no que tange à possibilitação de
acesso à assistência judiciária à população carente: AGRAVO DE INSTRUMENTO –
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO RECURSO DE AGRAVO – DEFENSORIA PÚBLICA – IMPLANTAÇÃO
– OMISSÃO ESTATAL QUE COMPROMETE E FRUSTRA DIREITOS FUNDAMENTAIS DE PESSOAS
NECESSITADAS – SITUAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE INTOLERÁVEL

– O
RECONHECIMENTO, EM FAVOR DE POPULAÇÕES CARENTES E DESASSISTIDAS, POSTAS À
MARGEM DO SISTEMA JURÍDICO, DO “DIREITO A TER DIREITOS” COMO PRESSUPOSTO DE
ACESSO AOS DEMAIS DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS


INTERVENÇÃO JURISDICIONAL CONCRETIZADORA DE PROGRAMA CONSTITUCIONAL DESTINA DO
A VIABILIZAR O ACESSO DOS NECESSITADOS À ORIENTAÇÃO JURÍDICA INTEGRAL E À ASSISTÊNCIA
JUDICIÁRIA GRATUITAS (CF, ART. 5º, INCISO LXXIV, E ART. 134) – LEGITIMIDADE
DESSA ATUAÇÃO DOS JUÍZES E TRIBUNAIS

– O
PAPEL DO PODER JUDICIÁRIO NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS INSTITUÍDAS
PELA CONSTITUIÇÃO E NÃO EFETIVADAS PELO PODER PÚBLICO – A FÓRMULA DA RESERVA DO
POSSÍVEL NA PERSPECTIVA DA TEORIA DOS CUSTOS DOS DIREITOS: IMPOSSIBILIDADE DE
SUA INVOCAÇÃO PARA LEGITIMAR O INJUSTO INADIMPLEMENTO DE DEVERES ESTATAIS DE
PRESTAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE IMPOSTOS AO ESTADO

– A
TEORIA DA “RESTRIÇÃO DAS RESTRIÇÕES” (OU DA “LIMITAÇÃO DAS LIMITAÇÕES”) –
CONTROLE JURISDICIONAL DE LEGITIMIDADE DA OMISSÃO DO ESTADO: ATIVIDADE DE
FISCALIZAÇÃO JUDICIAL QUE SE JUSTIFICA PELA NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DE
CERTOS PARÂMETROS CONSTITUCIONAIS (PROIBIÇÃO DE RETROCESSO SOCIAL, PROTEÇÃO AO
MÍNIMO EXISTENCIAL, VEDAÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E PROIBIÇÃO DE EXCESSO)


DOUTRINA – PRECEDENTES – A FUNÇÃO CONSTITUCIONAL DA DEFENSORIA PÚBLICA E A
ESSENCIALIDADE DESSA INSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – “THEMA DECIDENDUM” QUE SE
RESTRINGE AO PLEITO DEDUZIDO NA INICIAL, CUJO OBJETO CONSISTE, UNICAMENTE, na “criação,
implantação e estruturação da Defensoria Pública da Comarca de Apucarana” –
RECURSO DE AGRAVO PROVIDO, EM PARTE.


Assiste a toda e qualquer pessoa – especialmente àquelas que nada têm e que de
tudo necessitam – uma prerrogativa básica essencial à viabilização dos demais
direitos e liberdades fundamentais, consistente no reconhecimento de que toda
pessoa tem direito a ter direitos, o que põe em evidência a significativa
importância jurídico-institucional e político-social da Defensoria Pública.

– O
descumprimento, pelo Poder Público, do dever que lhe impõe o art. 134 da
Constituição da República traduz grave omissão que frustra, injustamente, o
direito dos necessitados à plena orientação jurídica e à integral assistência judiciária
e que culmina, em razão desse inconstitucional inadimplemento, por transformar
os direitos e as liberdades fundamentais em proclamações inúteis,
convertendo-os em expectativas vãs.

– É
que de nada valerão os direitos e de nenhum significado revestir-se-ão as liberdades,
se os fundamentos em que eles se apoiam – além de desrespeitados pelo Poder
Público ou transgredidos por particulares – também deixarem de contar com o
suporte e o apoio de um aparato institucional, como aquele proporcionado pela
Defensoria Pública, cuja

função
precípua, por efeito de sua própria vocação constitucional (CF/1988, art. 134),
consiste em dar efetividade e expressão concreta, inclusive mediante acesso do
lesado à jurisdição do Estado, a esses mesmos direitos, quando titularizados
por pessoas necessitadas, que são as reais destinatárias tanto da norma
inscrita no art. 5º, inciso LXXIV, quanto do preceito consubstanciado no art.
134, ambos da Constituição da República.

– O
desrespeito à Constituição tanto pode ocorrer mediante ação estatal quanto
mediante inércia governamental. A situação de inconstitucionalidade pode
derivar de um comportamento ativo do Poder Público, que age ou edita normas em
desacordo com o que dispõe a Constituição, ofendendo-lhe, assim, os preceitos e
os princípios que nela se acham consignados. Essa conduta estatal, que importa
em um “facere” (atuação positiva), gera a inconstitucionalidade por
ação.

– Se o
Estado deixar de adotar as medidas necessárias à realização concreta dos
preceitos da Constituição, em ordem a torná-los efetivos, operantes e
exequíveis, abstendo-se, em consequência, de cumprir o dever de prestação que a
Constituição lhe impôs, incidirá em violação negativa do texto constitucional.
Desse “non facere” ou “non praestare” resultará a inconstitucionalidade
por omissão, que pode ser total, quando é nenhuma a providência adotada, ou
parcial, quando é insuficiente a medida efetivada pelo Poder Público.
Precedentes (ADI 1.458-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.). Doutrina.

– É
lícito ao Poder Judiciário, em face do princípio da supremacia da Constituição,
adotar, em sede jurisdicional, medidas destinadas a tornar efetiva a
implementação de políticas públicas, se e quando se registrar situação
configuradora de inescusável omissão estatal, que se qualifica como
comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante
inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende
direitos que nela se fundam e também impede, por ausência (ou insuficiência) de
medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios
da Lei Fundamental. Precedentes. Doutrina.

– A
função constitucional da Defensoria Pública e a essencialidade dessa Instituição
da República: a transgressão da ordem constitucional – porque consumada
mediante inércia (violação negativa) derivada da inexecução de programa
constitucional destinado a viabilizar o acesso dos necessitados à orientação
jurídica integral e à assistência judiciária gratuitas (CF/1988, art. 5º,
LXXIV, e art. 134);


autoriza o controle jurisdicional de legitimidade da omissão do Estado e permite
aos juízes e Tribunais que determinem a implementação, pelo Estado, de
políticas públicas previstas na própria Constituição da República, sem que isso
configure ofensa ao postulado da divisão funcional do Poder (STF: AI 598212
ED/PR – PARANÁ EMB. DECL. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO Relator(a): Min. CELSO DE
MELLO, Julgamento: 25/03/2014).

Acerca
da imprescindibilidade do serviço de forma tal que o argumento de insuficiência
de recursos não pode ser acolhido. Constou da decisão, outrossim, que o
controle levado a efeito pelo Poder Judiciário não é capaz de configurar ofensa
ao postulado da divisão funcional das esferas.

Como
alertado, este trabalho não se presta a esgotar o tema em comento. Há várias
outras decisões relativas a estas questões, tais como, a título de exemplo,
quanto ao direito ao transporte gratuito de idosos, atendimento de gestantes na
rede pública, vagas em estabelecimentos carcerários, apenas para citar alguns.

De
toda forma, como antecipado, reputa-se como não totalmente amadurecida a
problemática em questão, de modo que ainda se contempla certa intermitência
quanto ao conteúdo das decisões nas diversas Cortes do país 6 .

Não é
por outra razão, que se antevê a possibilidade de que muitos outros aspectos
venham a ser enfrentados pelas Cortes Brasileiras nos próximos anos, na medida
em que os próprios direitos, mesmo que já positivados há mais de vinte e cinco
anos, encontram-se ainda em evolução quanto às formas de sua efetivação.

É de
ser anotado, ademais, que a judicialização destas questões, diversamente do que
sustentado pelo Poder Público em mais de uma oportunidade, não atenta contra a
tripartição dos poderes, máxime quando sabido que estes atuam no modelo de
freios e de contrapesos.

Por
fim, também é disposição constitucional que nenhuma pretensão poderá ser
subtraída da apreciação do Poder Judiciário, o qual, sobretudo nas questões
atinentes aos direitos fundamentais, tem o papel de verdadeiro guardião da
Constituição.

O
exame das várias decisões judiciais emanadas das Cortes Superiores vem a
demonstrar que, paulatinamente, os julgadores acabaram, em alguns casos, por se
aproximar da decisão alemã que deu à luz ao então novo conceito.

Com
efeito, em várias delas, abordou-se também a questão da razoabilidade da
pretensão sob a ótica do que se pode legitimamente esperar do Poder Público.

Outrossim,
ampliou-se, também, o âmbito de percepção de outras nuances, notadamente a do
mínimo existencial7, que, obrigatoriamente, ingressa na equação como elemento
revelador da plausibilidade do direito à vista do caso concreto.

No
tocante as possíveis críticas atinentes à possibilidade de análise, pelo Poder
Judiciário, da conduta do Poder Executivo sob a ótica do modelo de emprego de
recursos e também possíveis omissão ou escolhas indevidas, não se sustenta a
alegação de ingerência imprópria em outro Poder.

Verifica-se
que o princípio da reserva do possível teve sua origem em decisão da Corte
alemã num momento muito específico da história daquele país e de todo o mundo,
no contexto da Guerra Fria, do Muro de Berlim e, inclusive, girando em torno de
um assunto cuja especificidade merece ser considerada, ou seja, não se negou
aos alunos que cursassem medicina humana, mas sim que o fizessem naquelas
determinadas regiões, por conta da impossibilidade técnica e fática de criação
de novel estrutura de maneira imediata para o atendimento da demanda.

Posteriormente,
já em 2010, se verifica a reserva do possível sendo relativizada diante da
necessidade de garantia do mínimo existencial.

Juntamente,
o debate se estruturou sobre o princípio da separação dos poderes, esse o qual
a Corte enfatizou ser de responsabilidade do legislativo estabelecer a
amplitude do mínimo existencial. Mesmo assim, não deixou na decisão de ancorar
tal mínimo à garantia da sobrevivência digna.

É
claro, nessa decisão, que a reserva do possível, então, se torna princípio absolutamente
escusável quando se trata da garantia do mínimo, no caso, no Estado alemão,
onde surgiu.

A Lei Hartz
IV
e o mínimo existencial. Nesse contexto, BVerfGE 125, 175, de 2010, da
Corte alemã, merece detida observação, já que estende a consideração da reserva
do possível para a garantia do mínimo existencial, e está mais próxima da
realidade contemporânea.

A
decisão se debruça sobre a norma ordinariamente denominada Hartz IV, em
referência a Peter Hartz, empresário e membro da direção da Volkswagen
S.A. e líder da comissão elaboradora de um Projeto-Lei direcionado a regular
prestações sociais destinadas a desempregados, projeto esse o qual foi
promulgado como “Quarta Lei de Prestações Modernas de Serviços no Mercado de
Trabalho”.

O
termo “Hartz IV” se tornou na Alemanha 8 , muitas vezes com conotação pejorativa,
uma referência a situações de vulnerabilidade e de orientações normativas em
prol da desconstrução do Estado social alemão. Referido processo dizia respeito
a impugnação da constitucionalidade de normas sobre prestações estatais no
âmbito do mercado de trabalho, especialmente em face de situações de
desemprego.

Com
base no direito fundamental à garantia de um mínimo existencial condigno ao ser
humano, sobre os mandamentos principalmente do art. 1 I GG juntamente ao
princípio do Estado Social conforme art. 20 I GG11, tiveram sua
inconstitucionalidade afirmada.

A
fundamentação para essa decisão girou em torno especialmente do argumento de
que o mínimo existencial condigno ao ser humano, conforme os artigos acima
referidos, asseguram uma pretensão jurídico-subjetiva, ao mesmo tempo em que
determinam objetivamente ao legislador a consecução dos pressupostos para a
salvaguarda a todos do mínimo existencial, sem que seja necessário o chamamento
do Poder Judiciário para se reivindicar direitos fundamentais.

Dessa
maneira, verifica-se que nessa decisão a Corte não chegou nem a considerar a
impossibilidade orçamentária do Estado em garantir o mínimo.

Tal
desconsideração inevitavelmente revela que a reserva do possível seria argumento
dotado de extrema precariedade diante da salvaguarda do mínimo existencial. A
Corte alemã, ademais, não deixa de adentrar na seara de certa
discricionariedade do Poder Legislativo em torno da alocação orçamentária do
Estado para a garantia do mínimo 9 .

Quando
dispõe que o benefício deve ser o necessário para suportar a garantia ao mínimo
existencial, ao mesmo tempo afirma que não há como extrair da Lei Fundamental a
extensão concreta de seu valor, esse o qual está a depender de necessidades e
recursos de variação contextual e histórica, de improvável previsão para tal
diploma normativo.

Porém,
vale destacar que a Corte desconsidera uma suposta impossibilidade do Estado em
garantir tal condição, adentrando na questão financeira de sua salvaguarda
quando afirma que a abrangência do benefício depende da própria definição de
mínimo existencial, conforme compreendida pela sociedade, e das condições
básicas de sobrevivência, questões que o legislador deve se ater no momento da
edição normativa.

A
denominação ‘mínimo existencial’ não se confunde com ‘mínimo vital’ ou ‘mínimo
de sobrevivência’, uma vez que estas duas últimas expressões não abrangem “as
condições para uma sobrevivência física em condições dignas, de uma vida com
certa qualidade”.

A
doutrina e parte da jurisprudência do Brasil, assim, ao importar dito conceito,
constantemente o trata como um princípio-dogma que por si só é determinante
para fundar argumentos contrários à garantia da dignidade da pessoa humana, ou
mínimo existencial, em processos de demandas individuais ou de grupos
específicos.

E,
isto porque o sistema de freios e contrapesos e a sujeição a esta espécie de
controle legal não comprometem, em absoluto, o princípio da separação de
poderes, tal como estabelecido na Constituição Federal.

Por
fim, tem-se que a permanente evolução dos conceitos intrínsecos dos direitos
fundamentais, hoje já categorizados em quatro ou cinco diferentes dimensões,
determina a antevisão de que outras questões similares certamente virão a ser
conhecidas pelo Poder Judiciário, notadamente no que toca à possibilidade, ou
não, de invocação do princípio da reserva do possível10.

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Notas:

1 Uma
das obras mais lidas e citadas sobre os custos dos direitos é a escrita por
Stephen Holmes e Cass R. Sustein. A tese central defendida pelos autores é a de
que todo direito tem um custo para sua realização.

Por
esse motivo, não existiriam direitos absolutos – a efetivação dos direitos
fundamentais sociais depende, segundo os autores, de dois fatores: recursos
financeiros suficientes originários das contribuições dos indivíduos e a
administração do Estado. Para os autores, nenhum direito cuja eficácia
dependeria de gasto

Estatal
poderia ser tutelado, de modo unilateral, pelo Poder Judiciário em razão das
consequências orçamentárias que afetariam o Legislativo e o Executivo, gerando
responsabilidades e prejuízos de outras ordens (HOLMES; SUSTEIN, 1999). O
discurso revela a possibilidade de ponderação da efetividade dos direitos
fundamentais com base na escassez de recursos, isto é, a aplicação da teoria da
reserva do possível.

2 Todo
esse debate incide no artigo 12 da Grundgesetz que estabelece em sua
redação, no item 1, que “todos os alemães têm o direito de eleger livremente a
sua profissão, o lugar de trabalho e o de aprendizagem.” Quatro foram os
principais fundamentos para a decisão final da Corte alemã: a) quando o início
de uma profissão – como no caso de médicos – pressupuser uma determinada
formação, as limitações ao livre acesso à formação prescrita [para o início da
atividade de médico] devem ser tão rigidamente avaliadas, como os próprios
pressupostos de admissão para a profissão.

b)
Quanto mais fortemente o Estado moderno se inclina à seguridade social e ao
fomento cultural dos cidadãos, mais aparece, no contexto da relação entre
cidadãos e Estado, a exigência complementar pela outorga de direito fundamental
da participação (grundrechtliche Verbürgung der Teilhabe) em prestações estatais,
ao lado do postulado original da garantia de direito fundamental da liberdade
em face do Estado.

c) Em
um Estado de direito e social de liberdade não mais pode confiar-se à livre
decisão dos órgãos estatais delimitar a seu bel prazer o círculo dos
favorecidos e excluir uma parte dos cidadãos. Pelo contrário, decorre aqui, do
fato de o Estado oferecer prestações, um direito de todo cidadão qualificado
para o ensino superior de participar, a princípio igualmente, da chance de vida
oferecida.

d) Em
virtude desses efeitos, não se pode negar que o Numerus Clausus
absoluto de matrícula de candidatos se encontre à margem do constitucionalmente
aceitável. Diante de tal interpretação constitucional, aplicada sobre o caso
concreto, a Corte alemã entendeu, então, que o limite absoluto imposto sobre as
inscrições e matrículas de demais alunos no curso nas referidas Universidades
se caracterizava especialmente por conta da ausência de capacidade disponível
para alocar todos os qualificados ao ensino superior.

Assim:
“Como tais efeitos somente poderão ser enfrentados de forma sustentável por
meio da expansão da capacidade, poder-se-ia questionar se decorreria das
decisões axiológicas de direitos fundamentais e do uso do monopólio de formação
um mandamento constitucional objetivo próprio [do princípio] do Estado social,
de prover capacidades de formação suficientes para as diferentes disciplinas universitárias”

3 O
direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível
assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República
(art. 196).Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja
integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe
formular – e implementar – políticas sociais e econômicas idôneas que visem a
garantir, aos cidadãos, […] não pode mostrar-se indiferente ao problema da
saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em
grave comportamento inconstitucional.

A
INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL
INCONSEQUENTE. – O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política
[…] não pode converter-se em promessa constitucional inconsequente, sob pena
de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela
coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu
impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental
ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado.

4 A
ADPF 45, julgado pelo Ministro Celso de Mello, apesar de não julgar pedido de
um medicamento ou tratamento médico, trata sobre direito à saúde e traz uma
análise da “reserva do possível”.

Essa
decisão é muito interessante porque nela são feitas ponderações a respeito da
limitação de recursos e dos custos dos direitos que não aparecem nas outras
decisões. Ela começa afirmando que a formulação e a implementação de políticas
públicas não se incluem, ordinariamente, no âmbito da “função institucional do Poder
Judiciário”. Segue dizendo que competem, excepcionalmente, ao Poder Judiciário
quando a omissão dos órgãos políticos competentes vier a comprometer a eficácia
e a integralidade dos direitos fundamentais.

Reconhece,
também, que os direitos fundamentais de segunda geração caracterizam-se pela
gradualidade de seu processo de concretização, além de depender, em grande
medida, “de um inescapável vínculo financeiro subordinado às possibilidades
orçamentárias do Estado”.

Afirma,
ainda, que “a limitação de recursos existe e é uma contingência que não se pode
ignorar”. A ADPF 45/DF trouxe algumas considerações importantes e inovadoras em
relação às outras decisões do STF, pois considera a questão da limitação de
recursos e traz entendimento de que o direito à saúde não é absoluto.

No
entanto, pelo fato de a ADPF ser um controle abstrato de preceito fundamental,
ela não conseguiu traçar critérios mais claros para servir de parâmetro à
administração, aos juízes e aos próprios cidadãos. Outro ponto muito interessante
nessa ADPF é que ela foi julgada prejudicada pela perda do objeto, uma vez que
o Presidente da República, logo após o veto parcial ora questionado nessa ação,
veio a remeter ao Congresso Nacional projeto de lei que, transformado na Lei n.
10.777/2003, restaurou, em sua integralidade, o dispositivo da Lei n.
10.707/2003 (LDO), sobre a qual incidira o veto executivo.

Ou
seja, a decisão poderia ter simplesmente se limitado a julgar a ação
prejudicada pela perda do objeto, sem entrar no mérito da questão. Contudo, o Ministro
Celso de Mello apresentou uma argumentação que, apesar de indiferente em
relação ao resultado desse julgamento, representa uma inovação em face à
jurisprudência já consolidada do STF, o que poderia ser considerado um
indicativo de mudança no entendimento do tribunal sobre a matéria.

5 A
Lei 8.090/1990 dispõe sobre as condições e o funcionamento dos serviços de
saúde, de maneira que o Sistema Único de Saúde se presta a promover a saúde,
priorizando as ações preventivas, nos moldes da Carta de 1988, bem como
informando à população acerca de seus direitos e dos riscos. Para assegurar a saúde,
o Poder Público criou o Sistema único de Saúde— SUS, por meio das Leis
8.080/1990 e 8.142/1990, que tem o objetivo de melhorar o acesso à saúde, por
meio da criação de uma política descentralizada e solidária, ou seja, cabe à
União, em conjunto com os estados e municípios, assegurar a prestação do
direito à saúde, bem como disponibilizar hospitais e postos de saúde e outros
meios que facilitem o atendimento da população.

6
Verifica-se que a Teoria da Reserva do Possível tem sido utilizada apenas a
título meramente argumentativo quando trata-se de direitos relacionados à
saúde, à vida e à educação, a saber que as decisões que tem como pauta esses
temas, de modo geral, alertam para a escassez dos recursos, para os limites
financeiros e orçamentários, para a existência da cláusula da reserva do
possível como possível limitadora de direitos, entretanto, deixam claro que tal
cláusula não merece prevalecer quando em jogo com o mínimo existencial, deixam
claro que a reserva do possível não é argumento suficiente para afastar a responsabilidade
do Estado em concretizar direitos elencados como fundamentais pela Constituição
Federal.

7 A
origem do termo mínimo existencial, assim como a reserva do possível,
desenvolveu-se na Alemanha.

Com o
tempo, o Tribunal Constitucional alemão passou a reconhecer a necessidade de
garantias e condições mínimas a serem ofertadas pelo Estado alemão, como forma
de se garantir e preservar a dignidade da pessoa humana, culminando, como
refere Figueiredo e Sarlet (2010), “no reconhecimento definitivo do status
constitucional da garantia estatal do mínimo existencial”. Dessa maneira, ainda
que não tenha se chegado a um conceito definitivo, ficou claro, no contexto do
direito alemão, que a compreensão do que seria o mínimo existencial está muito
além da mera existência e sobrevivência (KELBERT, 2011).

8
Legalidade e Legitimidade apresenta a análise crítica feita por Carl Schmitt a
essa Constituição. Dotada de características contraditórias, o autor defende
que a Carta Magna encontrava-se “literalmente dividida entre a neutralidade
valorativa de sua primeira parte e a abundância valorativa de sua segunda
parte” (Schmitt, 2007). A primeira parte da Constituição designou-se a
instaurar a estrutura organizacional e institucional do Estado alemão, além de
traçar seus pressupostos de legalidade e legitimidade. O Estado legiferante,
estrutura que sustenta a democracia liberal como se configurou na República de
Weimar, foi descrito por Schmitt como um Estado regido por normatizações com
conteúdo mensurável e determinável, caracterizadas como impessoais e, por esse
motivo, gerais, bem como predeterminadas e, consequentemente, concebidas,
visando a uma duração permanente. Em tal Estado, lei e aplicação da lei, legislador
e aplicação da lei existem separados entre si. […]. Quem exerce poder e
domínio, age “com base em uma lei” ou “em nome da lei”. Apenas faz valer, com
legitimidade, uma norma vigente. (Schmitt, 2007).

9
Segundo Ricardo Lobo Torres (2009), no Brasil é adotada a reserva do possível
fática, significando uma mudança de interpretação do paradigma estrangeiro.
“Denota a confusão com o limite (fático) do limite (reserva do orçamento), que
opera dentro do âmbito de proteção do mínimo existencial e não é meramente heurístico”.
(TORRES, 2009). Para o doutrinador nem todos os direitos sociais são
fundamentais. Portanto, deve haver uma diferenciação entre um e outro. Os
direitos sociais dependem da reserva orçamentária, no entanto, os direitos
fundamentais não podem estar condicionados à “reserva do possível”, por
constituir o mínimo existencial à sobrevivência e à dignidade humana.