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Justiça Eleitoral decide que Zaffa não deve ser cassado – oreporter.net

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Data: 11/10/2024 20:18:42

Fonte: oreporter.net

Gravataí – A juíza da 173ª Zona Eleitoral de Gravataí, Mariana Aguirres Fachel, decidiu que os registros das candidaturas do prefeito Luiz Zaffalon e Dr. Levi que foram reeleitos no último domingo (6), não devem ser cassados. A Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) foi proposta pela coligação de Marco Alba acusando a chapa de Zaffa de abuso de poder político e econômico além de uso indevido de meios de comunicação.

O atual prefeito foi acusado de arquitetar um planejamento para se reeleger usando a estrutura da prefeitura, envolvendo a utilização de serviços de cargos comissionados para interesses políticos e pessoais além de recursos de publicidade em veículos de comunicação locais. O Ministério Público Eleitoral havia se manifestado pela cassação dos registros. A coligação e Marco Alba podem recorrer ao Tribunal Regional Eleitoral.

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Confira, abaixo, a longa sentença que foi publicada às 19h07min desta sexta-feira (11)

SENTENÇA

Vistos.

A COLIGAÇÃO GRAVATAÍ PODE MUITO MAIS ajuizou a presente ação de Investigação Judicial Eleitoral – AIJE em face de LUIZ ARIANO ZAFFALON, LEVI LORENZO MELO, JOÃO BATISTA PIRES MARTINS, CLEBES UBIRAJARA MOREIRA MENDES, ALEXSANDER ALMEIDA DE MEDEIROS e RAFAEL OLIVEIRA DA SILVA em razão de suposto abuso de poder econômico e político perpetrado pelos investigados. Afirmaram, em síntese que os candidatos à disputa majoritária, amparados pelos cargos exercidos, tiveram seus perfis particulares no Instagram e Facebook produzidos por servidores públicos municipais em horários de expediente, os quais, ainda, criaram confusão entre os perfis institucionais e privados. Alegaram que o Prefeito objetivou impulsionar o perfil pessoal a partir de postagens colaborativas com o perfil da Prefeitura e que foi favorecido por voto do perfil institucional em pesquisa realizada. Além disso, referiram que os representados foram favorecidos por articulação de cargos comissionados em horário de expediente, sem prejuízo do uso da máquina pública em prol de interesses particulares, tal qual a colocação de placas de propaganda e instalação de Wind Banner, sem prejuízo de utilizarem locais públicos em prol da campanha e nomearem servidores em prol de alianças políticas. Sustentaram o uso indevido de meios de comunicação patrocinados com verbas públicas em benefício dos investigados e ter havido entrega de prêmio em evento institucional em benefício do investigado Zaffalon. Acrescentaram que o Prefeito favoreceu pessoas jurídicas em licitação, promoveu publicidade institucional em período vedado e efetuou doação em ano eleitoral em benefício de entidade aliada. Por fim, afirmaram ter havido desvio de donativos para fins eleitorais. Postularam, ao final, a cassação dos registros de candidatura ou dos diplomas dos investigados, aplicação de multa e declaração de inelegibilidade destes.

Com a inicial, anexou documentos.

Determinada a notificação dos representados.

JOÃO BATISTA PIRES MARTINS apresentou resposta afirmando que a peça autoral é mero denuncismo ilógico, bem como que a filiação de pessoa indicada na exordial fora realizada em local próprio e mantido pelo partido. Alegou inexistir ilegalidade quanto ao armazenamento dos donativos. Requereu, por fim, a improcedência da representação e que seja reconhecida a litigância de má-fé praticada.

ALEXSANDER ALMEIDA DE MEDEIROS E CLEBES UBIRAJARA MOREIRA MENDES se opuseram aos pedidos da representante, fundamentando haver fragilidade da prova. Pugnaram, destarte, pela improcedência.

No mesmo sentido, LUIZ ARIANO ZAFFALON e LEVI LORENZO MELO responderam às acusações questionando os prints que corroboram a inicial e o meio como foram colhidos, bem como a competência da Justiça Eleitoral para perquirir questões que guardam matéria de Direito Administrativo. Aduziram que as teses de que servidores municipais seriam os gestores responsáveis pelos perfis pessoais dos representados são completamente temerárias e não condizem com a realidade dos fatos. Alegaram ser normal a semelhança da identidade visual em virtude de ambos os perfis utilizarem templates gratuitos, além de ter havido alteração no padrão das comunicações a partir de 2024. Afirmaram não ser possível concluir se o perfil votante em pesquisa é o oficial do Município, bem como que, de qualquer forma, o referido perfil é acessado por diversos servidores e por empresa terceirizada, inexistindo prova de que os representados tenham, direta ou indiretamente, o utilizado com intuito de promoção pessoal. Sustentaram que o uso de WhatsApp em local de trabalho, ainda que considerado ilícito administrativo, não alcança efeitos eleitorais, sequer sendo possível falar em responsabilidade objetiva dos representados. Acrescentaram ser temerária e falsa a alegação de troca de cargo público por apoio político, uma vez que no caso em concreto houvera, tão somente, o ingresso de um partido político para a base de governo. Insurgiram-se quanto as alegações de ilegalidade quanto a entrega de prêmio ao Prefeito Municipal. Ainda, referem que a publicidade exercida é meramente informativa e de esclarecimento à sociedade e que a doação impugnada resultou de processo administrativo iniciado ainda no ano de 2023. Ao final, referiu que a responsabilidade pela distribuição dos donativos ficou ao encargo do Banco de Alimentos de Gravataí e da Guarda Municipal, de modo com que ausente envolvimento dos representados. Pleitearam o indeferimento da exordial, ou, subsidiariamente, a abertura da instrução com realização de diligências e oitiva de testemunhas que arrolou. Juntaram documentos.

RAFAEL OLIVEIRA DA SILVA sustentou sua ilegitimidade passiva visto não ter exercido no ano de 2024 função de comando ou de gestão sobre a associação apontada na inicial. Requereu, dessa forma, a improcedência.

Houve réplica.

Em três audiências, foi colhida a prova oral (CD acostado à f. 339)

Produzidas diligências, declarou-se encerrada a instrução e oportunizada vista ao Ministério Público para parecer final e às partes para alegações finais.

O Ministério Público manifestou-se favorável ao pleito quanto aos representados LUIZ ARIANO ZAFFALON, LEVI LORENZO MELO e RAFAEL OLIVEIRA DA SILVA nos termos da representação.

As partes produziram alegações finais.

É o relato essencial. Passo a decidir.

O feito transcorreu regularmente, estando presentes os pressupostos processuais que viabilizam a análise exauriente.

Nesse sentido, destaco que a preliminar de ilegitimidade passiva do representado RAFAEL OLIVEIRA DA SILVA se confunde com o mérito, razão pela qual com ele será solvida.

Voltada ao mérito, destaco que a ação de investigação judicial eleitoral está fundada no art. 22 da Lei Complementar 64/1990, o qual disciplina que:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito

Da leitura acurada da letra da lei, depreende-se que o legislador se preocupou em revestir os pleitos eleitorais de moralidade, salvaguardando a paridade entre os candidatos e evitando abusos que ameaçariam o poder de escolha do eleitor.

Neste sentido, inclusive, é a elogiosa lição de Raquel Cavalcanti Ramos Machado:

A campanha eleitoral é exatamente o momento em que os candidatos elaboram discursos e desenvolvem propagandas, buscando cativar o eleitor. Numa democracia que se pretende legítima, essa tentativa de conquista do eleitor, ou seja, a captação de votos, deve ocorrer de forma lícita, equilibrada, pautada pelo poder das ideias e dos programas, e não pelo uso indevido do poder econômico ou político. Do contrário, haveria perpetuação no poder daqueles que, de alguma forma, já o detêm, e o utilizam para persuadir ou coagir o eleitor a votar baseado não nas próprias ideias ou nos reais interesses da sociedade, mas no medo, ou no atendimento a necessidades econômicas mais imediatas. De uma só vez, muitos princípios norteadores do processo eleitoral restariam desprezados, como o da moralidade, da probidade administrativa, da igualdade, da liberdade do eleitor e da legitimidade e normalidade das eleições1

Tal entendimento não significa em nenhum momento o desfavorecimento de quem está no exercício de poder público ou que possuem elevado patrimônio, tampouco privilégio àqueles que ao tempo dos fatos não guardam cargo eletivo. Ao contrário, almeja o texto de lei justamente ceifar eventuais instrumentos para fins de lhes possibilitar ainda maior segurança jurídica no cargo que ocupam ou venham a ocupar, sem prejuízo de possibilitar que o cidadão comum, sem qualquer espécie de herança política ou grandes financiamentos, possa alcançar cargos de representação a partir da promoção de seus ideais.

Assim conceituar significa dizer que não há falar em legitimidade daqueles que por intermédio de abuso, seja do poder econômico ou político, atingiram êxito eleitoral. Coibir atos como estes, destarte, é ferramenta imprescindível para que se assegure o respeito ao resultado das urnas.

Seja por intermédio da compra de votos, típica hipótese de abuso de poder econômico, ou do uso da máquina pública em benefício da própria candidatura, caso de abuso do poder político, impõe-se ao julgador, uma vez amoldados os fatos à norma, elidir a ilegalidade, restituindo ao eleitor, se for o caso, o direito ao voto de forma plena.

Adalberto Biazotto Junior, ao abordar as hipóteses de abuso de poder, esclarece que:

O abuso do poder político nas campanhas eleitorais tornou-se prática comum principalmente a partir da Emenda Constitucional n.º 16, que permitiu a reeleição dos chefes do Poder Executivo, sem necessidade de desincompatibilização (art. 14, §5º, da Constituição Federal). Dessa forma, o candidato, detentor de mandato eletivo e em exercício, se vale do cargo que ocupa para utilizar a máquina administrativa estatal a seu favor (ex.: Manipulação de receitas orçamentárias, utilização indevida de propaganda institucional e de programas sociais, contratação ilícita de pessoal etc.)

Já o abuso de poder econômico está diretamente ligado à utilização inadequada de recursos patrimoniais controlados pelo agente (ex.: o fornecimento de material de construção, a oferta de tratamento de saúde, a distribuição de cestas básicas e outros benefícios ofertados aos eleitores em troca de voto, a contratação de cabos eleitorais em número incompatível com a necessidade de divulgação da campanha etc.)2.

Na hipótese dos autos, os fatos perpassam majoritariamente a alegação de abuso do poder político pelo atual Prefeito do Município de Gravataí LUIZ ARIANO ZAFFALON e por seu vice LEVI LORENZO MELO, inclusive reeleitos em recente disputa ocorrida no dia 06 do mês em vigência.

Trata-se de alegação costumeira em pleitos eleitorais brasileiros, consoante bem conceituou a doutrina referida, ante a desnecessidade de desincompatibilização em reeleições e o fato de que uma das partes envolvida na disputa já está no exercício do cargo, de modo com que qualquer espécie de atuação possa ser entendida como favorecimento próprio.

Até por isso, KOCH, MACEDO, SEVERO e TORRES apontam que:

Nem todo o ato praticado por agente político que possa se converter em benefício eleitoral configura abuso de poder político ou de autoridade. Do contrário, seria impossível ao Poder Público tomar qualquer ação no ano eleitoral (…) Portanto, a existência de programas estatais de assistência, estando previstos na legislação, com critérios técnicos e exigência de preenchimento de requisitos prévios não configura abuso do poder político. São, destarte, completamente improcedentes as alegações de abuso de poder de autoridade por meio do Bolsa Família ou Minha Casa Minha Vida, pois tais programas, ainda que criticáveis, seguem critérios claros e expressos, não se tratando de ato iniciado em ano eleitoral visando a beneficiar unicamente os apoiadores do governo. Diversa é a situação onde o governo, em ano eleitoral, distribui bens e serviços sem previsão legal, autorização orçamentária ou justificativa legítima3

Não por acaso, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral se inclinou para a necessidade de revestida gravidade das condutas, atentando-se o julgador para a proporcionalidade de eventuais sanções aplicáveis:

Direito Eleitoral e Processual Civil. Agravo interno e Recurso Adesivo em Recurso Ordinário Eleitoral. Eleições 2018. AIJE. Propaganda Institucional em Período Vedado. Gravidade não comprovada. Conduta Vedada configurada. Retorno dos autos à origem para fixação de multa. Desprovimento. 1. Agravo interno e recurso adesivo contra decisão que deu parcial provimento a recurso ordinário eleitoral, reformando acórdão regional que julgou improcedente ação de investigação judicial eleitoral ajuizada com fundamento na prática de condutas vedadas e abuso do poder político. 2. Hipótese em que o Tribunal Regional assentou que foram realizadas três postagens em perfil de município na rede social Facebook que associaram atos de gestão municipal à parceria com candidato ao cargo de deputado estadual que concorria à reeleição no pleito de 2018. Consignou, entretanto, que: (i) os fatos não se revestiram de gravidade suficiente para caracterizar abuso do poder político e ensejar a cassação dos mandatos e a imposição de inelegibilidade dos recorridos; e (ii) a penalidade de multa prevista no art. 73, § 4º, da Lei 9.504/1997 não seria cabível no caso concreto por se tratar de ação de investigação judicial eleitoral, sem previsão legal de cominação de multa. 3. A decisão agravada manteve o entendimento do acórdão regional quanto à inexistência de caracterização de abuso do poder político, mas determinou o retorno dos autos à origem, a fim de que, consideradas as circunstâncias fáticas da infração ao art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997, seja fixada a sanção pecuniária prevista no § 4º do mesmo artigo. 4. Para a configuração do abuso do poder político, é necessário que o agente público, valendo–se de sua condição funcional e em manifesto desvio de finalidade, atue em benefício eleitoral próprio ou de candidato, de modo a comprometer a legitimidade do pleito e a paridade de armas entre candidatos. Assim, a menção ao nome do candidato a deputado estadual em apenas três publicações em rede social da prefeitura, cujo conteúdo não teve alcance significativo, não possui gravidade para caracterizar abuso do poder político. Precedente. 5. Consoante precedentes deste Tribunal Superior, não é cabível interpretação extensiva das condutas vedadas previstas no art. 73 da Lei no 9.504/1997. Na hipótese, não ficou comprovado o desvio de recursos públicos em benefício de campanha eleitoral, pois a cessão de servidores e o uso de bens públicos não decorre automaticamente do fato de as obras fotografadas serem públicas ou de o nome do candidato ter figurado nas postagens. 6. Nos termos da jurisprudência do TSE, “não há óbice a que haja cumulação de pedidos na AIJE, apurando–se concomitantemente a prática de abuso de poder e a infração ao art. 73 da Lei nº 9.504/97, seguindo–se o rito do art. 22 da LC nº 64/90”. Precedentes. No caso, a delimitação da causa de pedir fática e jurídica, desde a propositura da demanda, contemplou a referência à realização da publicidade institucional em período vedado. 7. Agravo interno e recurso adesivo aos quais se nega provimento.

(TSE – RO-El: 06029364520186060000 FORTALEZA – CE 060293645, Relator: Min. Luís Roberto Barroso, Data de Julgamento: 16/12/2021, Data de Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 16)

ELEIÇÕES 2018. RECURSOS ORDINÁRIOS. AIJE. CONDUTA VEDADA E ABUSO DO PODER POLÍTICO. ART. 73, I E III, DA LEI Nº 9.504/1997 E ART. 22, CAPUT, DA LC Nº 64/1990. PRELIMINARES. NÃO ACOLHIMENTO. MÉRITO. ALEGADO USO DE VEÍCULOS E DE MOTORISTAS DA FROTA DA COMPANHIA MUNICIPAL DE LIMPEZA URBANA (COMLURB) PARA TRANSPORTE DOS RESPECTIVOS FUNCIONÁRIOS ATÉ O LOCAL DE EVENTO POLÍTICO VOLTADO À PROMOÇÃO DE CANDIDATOS A DEPUTADO FEDERAL E ESTADUAL LIGADOS AO ENTÃO PREFEITO MUNICIPAL. ACÓRDÃO CONDENATÓRIO FUNDADO, ESSENCIALMENTE, EM DEPOIMENTOS EXTRAÍDOS DE CPI INSTAURADA PELA CÂMARA MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO PARA APURAR OS MESMOS FATOS E EM MATÉRIAS JORNALÍSTICAS. EVENTO ABERTO AO PÚBLICO. NÚMERO REDUZIDO DE PARTICIPANTES. AUSÊNCIA DE REGISTRO DO QUANTITATIVO DE VEÍCULOS DA COMLURB QUE EFETIVAMENTE TERIA SIDO UTILIZADO NO TRANSPORTE DE FUNCIONÁRIOS PARA O EVENTO E DE QUEM OS UTILIZOU. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO NO SENTIDO DA EFETIVA PARTICIPAÇÃO DO REQUERENTE NA ORGANIZAÇÃO DO EVENTO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE GRAVIDADE. RECURSOS ORDINÁRIOS PARCIALMENTE PROVIDOS, A FIM DE AFASTAR A APLICAÇÃO DAS SANÇÕES COM BASE NO ABUSO DO PODER POLÍTICO E, NA QUADRA DA CONDUTA VEDADA, REDUZIR, SEGUNDO UM JUÍZO DE PROPORCIONALIDADE, O QUANTUM DA MULTA APLICADA AOS RECORRENTES. PREJUDICADAS AS PRETENSÕES CAUTELARES REQUERIDAS. 1. No caso, a conduta objeto da AIJE julgada procedente na origem consistiu na desvirtuação, supostamente orquestrada pelo condenado, prefeito do Município do Rio de Janeiro, de um evento, na sede da escola de samba Estácio de Sá, destinado a empregados da Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb), no qual, em vez de serem tratados temas afetos à categoria, teriam sido promovidas as campanhas eleitorais de dois candidatos nas eleições de 2018. Preliminares 2. A apresentação de notícia–crime contra a Prefeitura Municipal não impede que o advogado que a subscreveu participe do julgamento do respectivo mandatário. Hipótese que não se insere no rol descrito no art. 144 do CPC. Preliminar de nulidade, por participação de magistrado impedido, rejeitada. 3. Em recente julgado, esta Corte Superior, em revisão de posicionamento, deu parcial provimento a recurso para firmar a tese, aplicável a partir das eleições de 2018, de que não há litisconsórcio passivo necessário, em âmbito de AIJE, entre o candidato beneficiado e os agentes públicos responsáveis pela prática do suposto ato abusivo. Não acolhimento da preliminar de decadência da ação. 4. Se os recorrentes consideravam inválidas as provas orais produzidas pela CPI, cumpria–lhes ter suscitado a questão no tempo oportuno – ainda perante a instância de origem, logo após serem intimados a se manifestar acerca das indigitadas provas –, visando a sanar o suposto vício, e não ter devolvido a matéria apenas com os presentes recursos ordinários. Incidência da preclusão na espécie, com base no art. 278 do CPC. Rejeição da preliminar. 5. A ausência de contraditório em processo originário não acarreta nulidade se a prova é submetida ao crivo das partes no feito para o qual é emprestada. Precedentes desta Corte Superior e do STJ. Mérito 6. No tocante ao mérito propriamente dito, o conjunto probatório é, conforme bem consignou o aresto regional, vasto em atestar o uso de veículos oficiais e de motoristas da Comlurb para o transporte de seus empregados, em 13.9.2018, até a quadra da escola de samba Estácio de Sá, onde, sob o pretexto de se tratar de evento no qual seriam abordados assuntos de interesse da categoria, o então prefeito Marcelo Crivella, diante do eleitorado presente, promoveu as candidaturas de seu filho, Marcelo Hodge Crivella, e de Alessandro Costa aos cargos, respectivamente, de deputado federal e de deputado estadual em 2018. 7. No que concerne à aplicação da sanção de inelegibilidade, o aresto regional merece ser reformado. Isso porque, como é sabido, para configurar o abuso do poder político, nos termos do art. 22, caput, da LC nº 64/1990, é imprescindível a presença da gravidade da conduta, cuja verificação deve levar em conta se, diante das circunstâncias do caso concreto, os fatos narrados foram suficientes para gerar desequilíbrio na disputa eleitoral, de modo a evidenciar potencial prejuízo à lisura do pleito. 8. O decreto condenatório regional, em sua fundamentação, baseou–se, essencialmente, em documentos originados de CPI – que apurou os mesmos fatos – consistentes em depoimentos de gerentes regionais da Comlurb e em matérias jornalísticas, os quais, ainda que possam ter atestado a finalidade eleitoreira da indigitada reunião – elemento essencial para o reconhecimento do abuso do poder político na seara eleitoral –, não se mostraram suficientes para revelar a gravidade para desequilibrar a disputa entre os candidatos. 9. Apesar de constar que a Comlurb possui cerca de 20 mil funcionários, os depoentes fazem menção a estimativas de reduzido número de pessoas no evento (50 a 150 pessoas), as quais o acórdão nem sequer vincula ao quadro funcional da referida empresa. É dizer: a partir do conjunto probatório dos autos, não é possível reconhecer, com grau de certeza, a caracterização do abuso do poder político, o qual não pode estar ancorado em conjecturas e presunções, fazendo–se necessária, para sua configuração, a comprovação da gravidade das circunstâncias do caso concreto que caracterizam a prática abusiva, de modo a macular a lisura da disputa eleitoral, nos termos do art. 22, XVI, da LC nº 64/1990. Precedentes. 10. Os elementos advindos da CPI, apesar de terem atestado a prática das condutas vedadas previstas nos inciso I e III do art. 73 da Lei nº 9.504/1997 – que exigem tão somente a subsunção objetiva dos fatos ao tipo legal –, não tiveram o condão de comprovar a caracterização do abuso do poder político que tenha dado força desproporcional à candidatura dos recorrentes de forma a comprometer a igualdade da disputa e a legitimidade do pleito, em um universo de 12 milhões de eleitores em 2018 no Estado do Rio de Janeiro. Não se mostraram, aliás, sequer suficientes para atestar a participação do então prefeito Marcelo Crivella na organização do evento. 11. A pena de inelegibilidade prevista no art. 22, XIV, da LC nº 64/1990 é de caráter personalíssimo e, portanto, demanda, para sua aplicação, provas robustas de que o agente tenha, efetivamente, contribuído com o abuso, não bastando meras ilações decorrentes de apoios a correligionários. Precedentes. 12. Recursos ordinários parcialmente providos, a fim de: (a) afastar a caracterização do abuso do poder político e, por conseguinte, a aplicação das sanções do art. 22, XIV, da LC nº 64/1990; e (b) na quadra da conduta vedada, reduzir, segundo um juízo de proporcionalidade, o quantum da multa ao valor de R$ 15.000,00 para cada um dos recorrentes (art. 77, § 4º, da Res.–TSE nº 23.551/2017). Prejudicadas as pretensões cautelares requeridas.

(TSE – RO-El: 060885989 RIO DE JANEIRO – RJ, Relator: Min. Mauro Campbell Marques, Data de Julgamento: 05/10/2021, Data de Publicação: 10/11/2021)

Isto posto, registro que a ação está fundamentada, sobretudo, em três pilares: (I) O uso de servidores públicos da administração municipal em prol da reeleição (II) O uso de bens móveis e imóveis da Administração em benefício dos candidatos à majoritária (III) A captação de apoio político a partir da máquina pública.

Dito isso, à luz da jurisprudência dominante do Tribunal Superior Eleitoral e refletida no Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, passo a analisá-los individualmente:

(I) O uso de servidores públicos da administração municipal em prol da reeleição

Alega a parte autora, em síntese, que os perfis particulares dos investigados LUIZ ARIANO ZAFFALON e LEVI LORENZO MELO no Instagram e no Facebook são produzidos por servidores públicos municipais em horários de expediente e pagos com recursos públicos, além de promoverem confusão entre os perfis pessoais e institucional, criando identidade visual com mesma fonte, estilo e cores, apenas com variações em pequenos aspectos.

Para tanto, apontam que Jessica Beltrame Nunes e Jacson Dantas, servidores em comissão, promoviam o assessoramento das referidas redes às custas do Poder Público, tendo a primeira, inclusive, formulado portfólio para aumento da popularidade do investigado Zaffalon.

Acrescentam, ainda, que Zaffalon era favorecido por publicações compartilhadas entre sua rede social privada e a da Prefeitura Municipal, de modo a impulsionar seu perfil pessoal, além de ter sido privilegiado pelo voto do perfil oficial da Prefeitura em enquete eleitoral produzida na rede social Facebook.

Concluem, neste sentido, que haveria articulação de cargos comissionados, durante o horário de expediente, para atos de campanha em favor do Prefeito e de seu vice.

A prova produzida, no entanto, não guarda hipótese de acolhimento destas alegações.

Para tanto, destaco ser conhecida a influência das mídias produzidas em redes sociais, corriqueiramente importando a formação de opiniões sobre as mais variadas ramificações da vida em sociedade. Não são raras às vezes, inclusive, que estes meios alternativos de produção de conteúdo vêm superando os alcances das mídias tradicionais (TV, rádio e jornal) a nível de tempo de consumo e de usuários.

Isso se deve a inúmeras circunstâncias que uma vez somadas importam em um sucesso quase inevitável. Facilidade de acesso, rapidez das informações, personalização de conteúdos e algoritmos que visam a permanência no uso dos aplicativos, tornam os conteúdos virtuais parte do cotidiano de cada um, ainda que de forma involuntária.

Ao trabalhar a influência da tecnologia no comportamento dos indivíduos através do uso do smartphone, Rosa Filho, após auferir que 63,6% acessam a internet imediatamente ao acordar e 85% antes de dormir, conclui que:

Os dados da pesquisa deixam evidente a existência de uma sociedade digital e teremos que reconsiderar tudo o que sabíamos sobre o comportamento em sociedade, suas categorias e conceitos, porque o contexto atual é outro. A partir dessa constatação, podemos considerar que as redes sociais e o smartphone são mais que uma ferramenta ou equipamento, pois, influenciam e condicionam o comportamento dos indivíduos, das empresas, do trabalho, dos estudos, da cultura, da política, do lazer e dos meios de comunicação que formam redes digitais e, através delas, interagem.4

Em períodos eleitorais, corolário lógico, não há olvidar a forte influência da mídia digital. Antes utilizada apenas de forma alternativa, atualmente é possível conceituá-la como a mais trabalhada por candidatos que visam manter engajados aqueles eleitores que já estão inclinados em neles confiarem o voto, como também, sobretudo, atingir novos públicos por meio da divulgação de credenciais e propostas.

Não por acaso, firmes são os posicionamentos jurisprudenciais em todo o Brasil no sentido de se coibir eventuais abusos do poder político ou econômico por intermédio da internet.

Neste sentido, trago julgado do Tribunal Superior Eleitoral:

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. REFERENDO DE DECISÃO LIMINAR. ELEIÇÕES 2022. PRESIDENTE. ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. ASSEMBLEIA GERAL DA ONU. REPRESENTAÇÃO INTERNACIONAL DO BRASIL. VIAGEM OFICIAL. PROLAÇÃO DE DISCURSO COM VIÉS ELEITORAL. USO NA PROPAGANDA ELEITORAL. QUEBRA DE ISONOMIA. PLAUSIBILIDADE. URGÊNCIA. REQUERIMENTO LIMINAR PARCIALMENTE DEFERIDO. DECISÃO REFERENDADA. 1. Trata–se de ação de investigação judicial eleitoral – AIJE – destinada a apurar a ocorrência de abuso de poder político e econômico e o uso indevido dos meios de comunicação, ilícitos supostamente perpetrados em decorrência do desvio de finalidade eleitoral da representação do Brasil, a cargo do Presidente Jair Messias Bolsonaro, na 77ª Assembleia Geral das Nações Unidas (Nova York, EUA). 2. A AIJE não se presta apenas à punição de condutas abusivas, quando já consumado o dano ao processo eleitoral. Assume também função preventiva, sendo cabível a concessão de tutela inibitória para prevenir ou mitigar danos à legitimidade do pleito. 3. Nesse sentido, prevê o art. 22, I, b, da LC 64/90 que, ao receber a petição inicial, cabe ao Corregedor determinar “que se suspenda o ato que deu motivo à representação, quando for relevante o fundamento e do ato impugnado puder resultar a ineficiência da medida, caso seja julgada procedente”. 4. O exercício dessa competência deve se pautar pela mínima intervenção, atuando de forma pontual para conter a propagação e amplificação de efeitos potencialmente danosos. A fim de que essa finalidade preventiva possa ser atingida, a análise da gravidade, para a concessão da tutela inibitória, orienta–se pela preservação do equilíbrio da disputa ainda em curso. 5. Esse exame não se confunde com aquele realizado no julgamento de mérito e não antecipa a conclusão final, que deverá avaliar in concreto os efeitos das condutas praticadas, a fim de estabelecer se são graves o suficiente para conduzir à cassação de registro ou diploma e à inelegibilidade. 6. No caso dos autos, a autora comprovou a existência de postagens nas redes sociais do candidato à reeleição em que veiculado seu discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas em 20/09/2022. Apontou, ainda, que a cobertura pela TV Brasil potencializou o alcance da mensagem eleitoral. 7. A matéria de fundo já foi examinada na decisão liminar exarada na AIJE 0601154–29, em que se verificou que a opção do primeiro investigado foi por aproximar sua fala, como Chefe de Estado, de temas reiteradamente repisados em sua campanha eleitoral. 8. Naquela oportunidade, a tutela inibitória foi concedida para proibir o uso do pronunciamento na propaganda dos investigados. Isso porque, em análise perfunctória, identifiquei como maior risco à quebra de isonomia a alteração de contexto do discurso, para gerar a falsa percepção de que o vídeo demonstra apoio internacional à reeleição do atual Presidente da República. 9. Por outro lado, salientei que pertencia à arena pública o debate quanto à opção feita pelo Chefe de Estado para ocupar um tempo de fala que é honrosa e tradicionalmente reconhecido ao Brasil. 10. Consideradas essas diretrizes, mostra–se necessária a remoção do vídeo das redes sociais utilizadas pelo candidato à reeleição para realizar sua propaganda, a fim de fazer cessar os impactos anti–isonômicos do material produzido a partir de ocasião somente acessível ao atual Chefe de Estado. 11. Contudo, entendo incabível determinar a remoção do vídeo veiculado no canal da TV Brasil, que contempla a transmissão oficial do evento. A emissora realizou cobertura protocolar, apenas informando aos telespectadores o contexto originário do discurso. Trata–se de ato oficial, cujo registro histórico se mostra relevante, inclusive para propiciar o acesso à informação acerca de fato já notório, amplamente discutido na imprensa. 12. Tutela inibitória antecipada parcialmente deferida, para determinar às empresas responsáveis que removam os conteúdos de propaganda, divulgados nas redes do candidato, que explorem o discurso proferido na abertura da 77ª Assembleia Geral das Nações Unidas. 13. Indeferido o pedido de remoção do vídeo da transmissão oficial do pronunciamento, disponível no canal de YouTube da TV Brasil. 14. Decisão liminar referendada.

Isto posto, considerando o assente posicionamento do Tribunal Superior da matéria na esteira de que “[o] abuso de poder político configura–se quando a normalidade e a legitimidade do pleito são comprometidas por atos de agentes públicos que, valendo–se de sua condição funcional, beneficiam candidaturas em manifesto desvio de finalidade” (RO–El 0603975–98/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJE 10/12/2021), insta perquirir no caso em concreto se os candidatos à majoritária no município se utilizaram dos cargos comissionados em prol da candidatura, de modo suficientemente apto para colocar em xeque a lisura do pleito.

É o que sustenta a exordial (Fato 1), a partir do argumento de que Jessica Beltrame Nunes, Assessora de Gabinete, CC 04, do Gabinete do Prefeito, teria tido papel crucial no desenvolvimento da imagem do candidato Zaffalon nas redes sociais, inclusive desenvolvendo portfólio técnico visando a candidatura.

Nas palavras dos requerentes em horário de expediente e oportunidades concomitantes com o exercício da função pública e sem remuneração adicional, a servidora empreendeu atividades em prol da eleição do candidato, aprimorando as publicações do prefeito.

E, ainda, sustenta que no intuito de criar confusão entre o perfil institucional e pessoal de Zaffalon, foi criada identidade com mesma fonte, estilo e cores, apenas com variações em pequenos aspectos, gerando confusão entre o que é público e privado.

Para tanto, refere ser possível observar que o investigado produzia dois vídeos em único compromisso, sendo que a equipe de comunicação realizava uma gravação para o perfil particular e outra para a postagem em perfil oficial, tal qual o ocorrido em visita à Praça municipal.

A prova produzida pelos candidatos no decorrer da instrução, todavia, é suficientemente clara para indicar que a servidora não tinha gerência das redes do Prefeito, tão somente exercendo o papel de jornalista em eventos institucionais, disponibilizando-lhe as mídias tal qual o fazia com outras figuras políticas ou jornalistas.

Insta referir que a tomada de depoimento permite concluir que Jéssica utilizava seu telefone pessoal para a produção das mídias que, posteriormente, seriam disponibilizadas nas redes institucionais, armazenando este conteúdo em servidor da Prefeitura Municipal que ficava à disposição da respectiva secretaria e de quem quisesse acessá-lo, consoante corroborou a informante Mari Léia Bastiani.

Ainda que em depoimento declare ter dado dicas à Zaffalon sobre como editar as postagens, inclusive enviando-lhe algumas legendas, não é possível depreender com convicção suficiente que a servidora prestava rotineiramente serviços pessoais ao Prefeito ou tampouco reservava espaço de tempo exclusivamente em prol das redes privadas do candidato.

Nesta senda, transcrevo trechos relevantes do depoimento:

Advogada: Como funcionava essa tua atividade de assessoramento do Prefeito acompanhando as agendas?

Jéssica: Eu acompanhava as agendas institucionais do gabinete do Prefeito. As pautas do gabinete eu que acompanhava.

Advogada: Qual era a atividade específica?

Jéssica: Eu fazia as matérias do que estava acontecendo e fazia a cobertura de áudio e vídeo.

Advogada: E esse material, ele era produzido e encaminhado para a assessoria de comunicação para ser distribuído depois para os veículos?

Jéssica: É, no caso eu fazia parte da Assessoria de Comunicação da Prefeitura, produzia o material e ficava tudo disponibilizado no servidor da Prefeitura, no servidor da Comunicação e os demais colegas da comunicação também tinham acesso.

Advogada: Sabe informar quem que publicava os materiais no perfil pessoal do Prefeito?

Jéssica: Não sei te dizer. Ele publicava, a filha dele publicava.

Advogada: Como ele tinha acesso a esse material?

Jéssica: Eu disponibilizava.

Advogada: Passava por WhatsApp?

Jéssica: Passava por WhatsApp para ele.

Advogada: A que tu atribui o expressivo crescimento das redes sociais do Prefeito?

Jéssica: Dei algumas dicas para ele, mostrei alguns vídeos também.

Advogada: Tu acha que aquele projeto de comunicação elaborado por ti teve participação?

Jéssica: Muito pouco.

Advogada: Tu entregava o material já pronto para ele postar nas redes dele?

Jéssica: Eu mandava as fotos.

Advogada: E os textos?

Jéssica: Vez que outra mandava algum texto, alguma coisa.

Advogada: Tinha algum contrato de serviços extras com o Prefeito Zaffalon?

Jéssica: Não, nunca tive nenhum contrato.

(…)

Advogado: Alguma vez a senhora fez algum trabalho pessoal para o senhor Zaffalon?

Jéssica: Não.

Advogado: Em algum momento tu tiveste acesso a senha do Instagram do Prefeito Zaffalon?

Jéssica: Não.

Advogado: Se quisesse fazer uma postagem na rede pessoal do Prefeito, tinha essa autorização?

Jéssica: Não.

Advogado: Nesse episódio que a Dra Janaína mencionou em que há duas postagens semelhantes no mesmo evento. Nesse episódio, como é que aconteceu. Fizeste esta postagem, tu só registrou e postou?

Jéssica: Se eu bem me recordo, nesse dia ele me entregou o celular e pediu para tirar uma foto na hora. Era um evento importante e ele queria registrar e me deu o celular desbloqueado e eu fiz a publicação. Eventualmente eu fazia favores, não via problema nisso, assim como eu fiz favores como esse para outros secretários, vereadores.

Advogado: Tu como profissional do jornalismo e da comunicação. Queria que tu explicasse um pouquinho como que funciona esses padrões que tu trabalhava na prefeitura e que podem justificar ou não essa semelhança.

Jéssica: Nós utilizávamos os planos gratuitos tanto do Canva como do Capcut. Isso não te dá uma vasta cartela de opções. É tudo muito limitado por ser gratuito. Então nós não tinhamos um software avançado de edição, de criação. Quem tinha era a publicidade para outros fins. Para o jornalismo nós usávamos o Canva e o Capcut.

Advogado: Modelos gratuitos que tinham poucas opções de cores e de formas?

Jéssica: Isso

(…)

Juíza: Jéssica, vou começar querendo conhecer um pouquinho mais sobre tua formação. Te formastes onde?

Jéssica: Na Unisinos.

Juíza: Em que?

Jéssica: Em jornalismo.

Juíza: E fez que cursos depois disso?

Jéssica: Eu fiz alguns cursos digitais, de marketing digital, de comunicação e gestão pública. De redes sociais.

Juíza: Te especializou nisso?

Jéssica: Eu não cheguei a fazer uma pós-graduação, eu fiz cursos de curta duração (…) Cursos de extensão.

Juíza: Que ensina (…) esses mecanismos de rede e marketing?

Jéssica: Isso.

Juíza: A senhora referiu que poderia ser o Prefeito ou a filha. A senhora conhece a filha dele?

Jéssica: Sim.

Juíza: Quantos anos?

Jéssica: Ela é da minha idade. 31, 32.

Juíza: Formação?

Jéssica: Direito.

Juíza: Sabe se tem algum curso similar aos referidos pela senhora?

Jéssica: Não sei da vida pessoal dela.

Juíza: Do prefeito, conhece a formação dele?

Jéssica: Sim, ele é sociólogo formado.

Juíza: Dessas mídias, tem alguma?

Jéssica: Que eu saiba não.

Juíza: O que me chamou atenção é a similaridade entre peças elaboradas por alguém que tem uma formação na área, com cursos de extensão específicos, com quem a senhora refere que tenham postado com a similaridade de qualidade muito boa, mas que não tem nenhuma formação. Como funcionava isso aí?

Jéssica: Eu dei algumas dicas para ele. Compartilhei os links de Canva.

Juíza: Eu quero que a senhora me explique como eram essas dicas, com que frequência, como é que foi. A senhora refere também que nunca fez trabalho para ele, mas voluntariamente vocês se encontravam? A senhora auxiliava nisso de alguma maneira?

Jéssica: Voluntariamente eu dei várias dicas. Mostrei como fazer. O aplicativo é muito intuitivo.

Juíza: Ensinou a utilizar?

Jéssica: Mostrei como fazia, sim.

Juíza: Mostrou como fazia tipo um passo a passo como se construía a divulgação?

Jéssica: Não, eu mostrei como eu fazia no dia a dia e eventualmente por vontade própria eu mostrava como fazia. Eu dava dicas, dava toques.

Juíza: Voluntariamente a senhora auxiliava?

Jéssica: Sim

Juíza: E voluntariamente a senhora auxiliava para quem? Filha dele ou para ele?

Jéssica: Para ele.

Juíza: E onde é que era esse encontro para ensinar, mostrar ali como fazer?

Jéssica: Quando encontrava com ele. Quando estávamos indo para alguma pauta. Quando estávamos voltando. Como o departamento de comunicação era do lado do gabinete do Prefeito, eventualmente eu falava algumas coisas.

Juíza: Estavam se deslocando para alguma pauta no carro, a senhora entrava ali e mostrava, dava dicas?

Jéssica: Sim

Juíza: Ou externo, por exemplo, marcar um horário em outro local para isso?

Jéssica: Não

Juíza: Era feito durante as pautas, durante o expediente.

Jéssica: Quando eu estava tendo contato com ele nós íamos falando.

Juíza: Durante o trabalho da senhora, normalmente?

Jéssica: Eu conseguia conciliar.

Juíza: A senhora conciliava o seu trabalho de jornalismo como diretora, também ensinando como fazer e montar?

Jéssica: Uhum.

(…)

Ao ser abordada a nova função de Jéssica, agora assessora de imprensa do candidato:

Juíza: As postagens são da senhora?

Jéssica: Desde que eu comecei a trabalhar, sim, eu que faço os textos e as postagens, mas não faço as criações.

Juíza: A criação da identidade visual não é da senhora?

Jéssica: Não é minha.

Juíza: Antes era?

Jéssica: Não.

Juíza: Quando as duas tinha uma similaridade muito grande e a senhora referiu que no carro ou durante o expediente a senhora mostrava como utilizar e postar?

Jéssica: Daí eram os templates prontos do Canva. Não era uma criação, era meio pronta e era só.

Juíza: Os templates prontos foi a senhora que ensinou a utilizar?

Jéssica: Sim

Juíza: Todos eles da página pessoal também?

Jéssica: Alguns

Juíza: Para eu compreender, até dessa mudança, a senhora referiu em resposta que a senhora cuidava para não ter a mesma narrativa de um pro outro e tornar interessante a comunicação (…) Me explica melhor como era essa distinção

Jéssica: É que a Prefeitura ela tem por caráter informativo dar o conteúdo mais completo. Um texto longo contando todos os fatos. Quando eu mandava as fotos, mandava (…) uma legenda mais sucinta “Evento tal, tais pessoas”

Juíza: A senhora mandava as fotos e uma legenda sucinta?

Jéssica: Às vezes mandava a legenda, às vezes ele fazia legenda por conta própria.

Juíza: A questão do portfólio que a senhora colocou que elaborou (…) A senhora teve solicitação para elaboração?

Jéssica: Não. Eu fiz por conta própria, fiz porque eu quis.

Juíza: E quando é que teve a conversa de apresentação desse portfólio? Como é que foi? Para apresentar o trabalho…

Jéssica: Eu mandei para ele por WhatsApp. Disse que tinha criado isso e perguntei se ele queria (inaudível) (…) Ele abriu no WhatsApp. Achou legal.

Juíza: E como é que foi essa apresentação que a senhora fez pra ele? Essa explicação do trabalho da senhora. Como é que foi?

Jéssica: Não foi bem uma apresentação, foi mais uma conversa mesmo. Eu disse “Ah, estou estudando mais sobre e tomei a liberdade de te mandar aqui algumas dicas, alguns insights, coisas que eu acho legal”. Foi mais nesse sentido. Isso já faz 02 anos.

Juíza: E como foi essa conversa? Onde foi?

Jéssica: Foi na sala dele.

Juíza: Na sala dele na prefeitura?

Jéssica: Isso.

Juíza: No horário que a senhora trabalhava…

Jéssica: Antes de ir embora dei uma batidinha para dar tchau e disse que tinha enviado para ele se quisesse dar uma olhada.

Juíza: Como foi o retorno disso?

Jéssica: Ele achou muito interessante, muito legal, mas não tocamos para além disso (…) Não passou de algo de 5, 10 minutos.

Da análise detida, é possível perceber que em nenhum momento Jéssica exercia a gerência das redes pessoais do Prefeito, sobretudo por sequer ter acesso à senha destas ou anuência para livre publicação, pressupostos imprescindíveis para tanto.

Ademais, ainda que se tenha como prisma que a servidora prestou consultoria especializada ao candidato, não há nenhum elemento colhido no sentido de que foi instigada para tanto. Ao contrário, em todas as manifestações Jéssica refere que por conta própria desenvolveu portfólio em prol de Zaffalon e lhe dava dicas de redes sociais enquanto se deslocavam aos eventos, fatos que não vinculam agir perpetrado pelo representado, tampouco severa gravidade apta a ensejar a procedência.

Além disso, é importante descrever que, ainda que se reconheça a lisura dos prints colhidos, não há como se apurar tão somente com base nos depoimentos colhidos, quantidade de postagens suficientes para se perquirir efetiva mudança significativa no layout das publicações a partir do suporte da depoente.

Para tanto, grifo que seria necessário ao juízo que, ao avesso da lei, passasse a colher subsídios em link das redes sociais do Prefeito disponibilizado pela parte autora, perpassando postagens de cunho absolutamente pessoal e sem qualquer relação com os autos.

Individualizá-las e colacioná-las, corolário lógico, se fazia imperativo para uma elucidativa análise das provas em prestígio ao contraditório.

Neste passo, os indícios colhidos corroboram a versão de Jéssica no sentido de que as indicações do portfólio que produziu sequer foram levadas a efeito, nada mais sendo do que mera proatividade da servidora, de modo com que interpretar a circunstância de modo diverso implicaria dizer que qualquer prefeiturável no exercício do cargo poderia vir a ser responsabilizado por atos de terceiros, ainda que nada tenha contribuído para tanto.

Rememore-se que Jéssica apontou que as conversas sobre o portfólio ocorreram ao final do seu expediente, não tendo havido, por exemplo, individualização de tempo no horário de expediente para tanto.

Ademais, até mesmo o artigo confeccionado decorrera dos estudos da depoente para tanto, simbolizando mera intenção de adentrar ao mercado de trabalho como assessora de imprensa.

Corroborando o entendimento, colaciono precedente do Tribunal Regional Eleitoral que afasta a possibilidade de condenação em hipóteses em que inviável vincular os fatos ao representado:

Recursos. Decisão que, apreciando conjuntamente ações de impugnação de mandato eletivo e investigação judicial eleitoral por abuso de poder econômico, político e de autoridade, corrupção ou fraude, condutas vedadas e captação ilícitade sufrágio, julgou os pedidos improcedentes. Alegada entrega de telhas, ranchos, colchões a pretexto de assistência a flagelados. Uso irregular de maquinário e servidor público em benefício de candidatura. Produção de material gráfico em proporção tida como exacerbada.Distribuição de camisetas em troca de votos, utilização de veículo de transporte escolar contendo propaganda eleitoral e outras irregularidades. Rejeitada preliminar que impugna apensamento das ações. Validade da reunião dos processos, nos estritos termos dos arts. 103 e 105 do Código de Processo Civil, ante a clara identidade de suas causas de pedir. Necessidade, para embasar juízo de procedência nas demandas impugnatórias, da comprovação, no mínimo de anuência ¿ ou seja, da participação efetiva, ainda que indireta ¿ do candidato com a conduta ilegal imputada, bem como do elo dareferida conduta com a sua campanha eleitoral. Necessária, ainda, potencialidade do abuso para influenciar no resultado do pleito. Impossibilidade de vincular a autoria dos fatos aos atuais mandatários. Conjunto probatório apoiado em testemunhos confusos, vinculados a manifesta preferência política das partes, inconsistentes para sustentar juízo decondenação. Ausência de provas sólidas e estremes de dúvida que comprovem a prática das infrações descritas na inicial. Provimento negado.

(TRE-RS – RE: 100000892 RS, Relator: DR. JORGE ALBERTO ZUGNO, Data de Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 134, Data 12/8/2010, Página 1)

Não obstante, as mesmas razões acabam por ser refletidas na relação impugnada entre o Vice-Prefeito Levi e o servidor Jacson.

Aliás, especificadamente quanto ao ponto, as provas coligidas ao expediente são ainda mais frágeis, frente a absoluta vulnerabilidade dos depoimentos colhidos pela parte autora para corroborar sua tese.

Isso porque são raros os prints que referem a rede social do representado e por haver expressa negativa do servidor ao ser questionado sobre alguma produção destinada aos perfis particulares de Levi:

Advogada: Quando o senhor acompanha o Dr. Levi nas agendas, o senhor produz algum conteúdo?

Jacson: Foto, vídeo…

Advogada: Esses conteúdos o senhor encaminha para alguém?

Jacson: Para a comunicação (…) Eles que utilizam.

Advogada: A respeito dos perfis particulares do Dr. Levi, o senhor produz conteúdo e também produz para estes perfis?

Jacson: Não, não tenho nenhuma ingerência.

Julgo importante, nestes pontos, destacar a completa inviabilidade de se praticar eventual etarismo em desfavor dos representados, ou mesmo supor que pessoas com curso superior completo e vasta experiência não seriam capazes de assimilar dicas simples de sistema intuitivo.

Veja-se que ainda que se reconheça o costumeiro conhecimento dos mais jovens quanto às mídias digitais, não se pode atribuir a impossibilidade de que pessoas experientes possam igualmente usufruir das ferramentas com igual ou melhor capacidade.

Aqui registro que a legislação eleitoral busca elidir o uso da máquina pública em privilégio do candidato a reeleição. No entanto, não visa tolhir em qualquer hipótese o diálogo entre o Prefeito e sua assessora, sendo normal a troca de vivências no decorrer de percursos em que o tempo seria ocioso.

Nesta senda, ilações amparadas exclusivamente na improbabilidade de um certo alguém ter a capacidade de produzir conteúdos não podem e não devem ser objeto de acolhimento pelo Poder Judiciário.

Diferentemente do que alega o Ministério Público, não há confissão da servidora de que produzia mídias individualizadas para o perfil do Prefeito, conforme bem se depreende das transcrições formuladas, tampouco se é possível acolher as alegações quanto a produção de conteúdo apesar de período vedado de publicações, haja vista que como jornalista compete à servidora produzir as mídias tanto para a atualidade quanto para registro histórico de eventos relevantes.

Ao contrário, qualquer argumento neste sentido deveria vir alicerçado por prova robusta neste sentido e plenamente possível de ser produzida, tal qual o depoimento pessoal do representado, momento em que seria viável apurar suas condições técnicas para tanto.

Não o tendo feito, recaiu a parte autora em completa inércia quanto a dilação probatória, remanescendo a tomada de depoimento de testemunhas e informantes da parte ré ou do juízo que acabaram, ao cabo, refletindo o fato de que a representante não se desincumbiu satisfatoriamente do ônus da prova.

Similarmente, por exemplo, a suposta confusão entre os perfis pessoais e institucional a partir da criação de identidade visual com mesma fonte, estilo e cores (Fato 2) ou compartilhamento de publicações (Fato 3), são alegações fragilizadas pela prova dos autos.

Isso porque os elementos concatenados ao expediente permitem concluir se tratarem de hipóteses em que os representados meramente divulgam suas ações e informações que consideraram relevantes em suas redes sociais, inexistindo indícios do uso de recursos públicos para tanto ou de desproporcionalidade suficiente para gerar desigualdade nas eleições.

Fundamentando o entendimento, trago julgado do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul:

RECURSO. ELEIÇÃO SUPLR 2022. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). CONDUTA VEDADA. ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. INDEFERIMENTO PETIÇÃO INICIAL. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. DESPROVIMENTO.
1. Insurgência contra sentença que indeferiu a petição inicial e julgou extinta sem resolução do mérito ação de investigação judicial eleitoral proposta em desfavor de candidato ao cargo de prefeito na renovação de eleição municipal, com fulcro no art. 485, inc. I, do Código de Processo Civil.
2. Suposta prática de abuso de poder sob os vieses político e econômico, e uso indevido dos meios de comunicação por parte do candidato investigado. Uso da máquina pública com a finalidade de se promover indevidamente, o que resultaria em quebra da isonomia na disputa eleitoral. Postagens em redes sociais, com imagens produzidas pelo poder público e que haveria publicidade da mesma natureza já retirada na página oficial do município na internet.
3. Na espécie, dos elementos trazidos aos autos, o que se verifica é o candidato divulgando suas ações em seu perfil pessoal em redes sociais. Inexistência de qualquer elemento que indique minimamente a utilização de recursos públicos para realização das postagens ou que tenha havido publicidade institucional favorecendo candidato em período vedado. Correto o entendimento do magistrado de primeiro grau ao indeferir a petição inicial de plano por não ter vislumbrado a ocorrência de justa causa para a ação.
4. A decisão recorrida consignou que os documentos juntados aos autos já teriam sido analisados sob a perspectiva da propaganda eleitoral irregular em outra representação, na qual foi proferida sentença que reconheceu que tal conteúdo teria caráter meramente informativo acerca de serviços prestados. Embora a recorrente afirme que aquela representação utilizada como fundamento da sentença guerreada se referia a apenas um dos itens que ampararam a propositura desta AIJE, não há como avaliar a tese recursal em razão da ausência de cópias da mencionada representação nos autos. Ausência de interesse processual para propositura da ação. Mesmo com a instrução dos autos a partir das imputações formuladas, não lograria êxito o recorrente em demonstrar o comprometimento da igualdade da disputa, da legitimidade do pleito em benefício da candidatura adversária ou a extrapolação do uso normal das ferramentas virtuais na campanha eleitoral.
5. Desprovimento.
RECURSO ELEITORAL nº060007586, Acórdão, Des. Voltaire De Lima Moraes, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, 21/08/2023.

Na esteira do precedente jurisprudencial, não há falar em qualquer irregularidade capaz de ensejar o entendimento de que houvera impulsionamento ilícito do perfil do Prefeito.

Os documentos acostados dão conta, em contrapartida ao alegado, de que o representado tão somente era coautor nas publicações, uma vez que aparecia nestas, circunstância corriqueira nas redes sociais e da qual não se depreende qualquer irregularidade.

Ainda que se depreenda insurgência do Ministério Público quanto aos atos, não verifico qualquer abusividade apta a elidir publicidade que, ao que tudo indica, tinha apenas o intuito de divulgar os atos de gestão.

É, no mesmo sentido, o precedente do Tribunal Estadual Paranaense:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MEDIDA ACAUTELATÓRIA DE INDISPONIBILIDADE DE BENS E PEDIDO DE REMOÇÃO E ABSTENÇÃO DE PUBLICAÇÕES EM PÁGINAS DE REDES SOCIAIS ADMINISTRADAS PELO CHEFE DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL. INDEFERIMENTO. CARÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES DA SUA CONCESSÃO (FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA). CONJUNTO PROBATÓRIO QUE, A PRIORI, NÃO DEMONSTRA A SUPOSTA PROMOÇÃO PESSOAL DO AGENTE POLÍTICO. PUBLICAÇÕES VEICULADAS EM SUA PAGINA PESSOAL DE REDE SOCIAL DEMONSTRANDO O EXERCÍCIO DO SEU MÚNUS. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DA PRÁTICA DE ATO ÍMPROBO, NESSE MOMENTO PROCESSUAL. PRETENSÃO, ADEMAIS, DE CONDENAÇÃO, TÃO SOMENTE, POR OFENSA AOS PRINCÍPIOS QUE REGEM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PREJUÍZO AO ERÁRIO INEXISTENTE.RECURSO DESPROVIDO. I. A indisponibilidade de bens na ação civil pública por ato de improbidade administrativa, prevista no artigo 37, § 4º. da Constituição Federal, e no artigo 7º. da Lei n.º 8.429/92, trata-se de medida extrema e excepcional, somente podendo ser concedida quando presentes o fumus boni iuris, que se traduz numa razoável expectativa da procedência do direito postulado em virtude da prática de ato de improbidade administrativa, bem como o periculum in mora, consubstanciado na probabilidade de ocorrência de dano ao erário, pelo risco de não ser ressarcido, caso a medida não seja concedida inaudita altera pars. II. No caso concreto, o conjunto probatório não demonstra, a priori, a suposta promoção pessoal do agente político, em virtude das postagens em sua página pessoal da rede social mostrando o exercício do seu múnus, decorrendo daí a ausência de indícios da prática de ato ímprobo. III. Não é possível, sob uma falsa moralidade administrativa, impedir que o Chefe do Executivo dê ciência aos munícipes daquilo que tem feito de sua gestão, as quais busca implementar e para as quais foi eleito. De outro lado, é de interesse dos munícipes saber aonde os valores arrecadados estão sendo investidos, sendo que a forma mais rotineira disto acontecer é por meio da publicidade, em especial, nos dias atuais, nos perfis pessoais das redes sociais. A postura do Ministério Público em tolher a liberdade de expressão e o dever de informação significa um retrocesso à própria democracia. (TJPR – 4ª C.Cível – 0030558-36.2020.8.16.0000 – Antonina – Rel.: Desembargador Abraham Lincoln Calixto – J. 10.02.2021)

O uso do perfil oficial da Prefeitura em enquete eleitoral produzida na rede social Facebook (Fato 4), de mesma sorte, não vêm suportado por indícios de que os próprios representados se utilizaram do cargo em exercício para tanto com o fito de favorecimento na disputa, comprometendo a lisura do processo eleitoral.

Ressalto nesta via, que necessária a comprovação de que os candidatos à majoritária tivessem ciência dos fatos e, ainda assim, quedaram-se inertes, mormente o mero favorecimento não acarretar responsabilidade objetiva:

REPRESENTAÇÃO CUMULADA COM AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CONDUTAS VEDADAS A AGENTES PÚBLICOS. ART. 73, INC. III, DA LEI DAS ELEIÇÕES. ABUSO DE AUTORIDADE. ART. 22 DA LEI COMPLEMENTAR N. 64/90.GOVERNADOR E VICE. CANDIDATOS A REELEIÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. SECRETÁRIA DE ESTADO E CHEFE DE GABINETE. ELEIÇÕES 2018. AFASTADA A PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. ILEGITIMIDADE PASSIVA E AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO JURÍDICO.ANÁLISE PREJUDICADA. APRECIAÇÃO EM CONJUNTO AO MÉRITO. REDE SOCIAL. CRIAÇÃO DE GRUPO DE WHATSAPP. DIVULGAÇÃO E CONVOCAÇÃO DE SERVIDORES PARA PARTICIPAR DE ATOS DE CAMPANHA. VENDA, EM HORÁRIO DE EXPEDIENTE, DE CONVITESPARA EVENTO. DEMONSTRADA A RESPONSABILIDADE DA SECRETÁRIA DE ESTADO E DA CHEFE DE GABINETE. APLICAÇÃO DE MULTA. PROCEDÊNCIA PARCIAL. AUSENTE REQUISITOS PARA CARACTERIZAÇÃO DA PRÁTICA ILÍCITA QUANTO AOS INTEGRANTES DA CHAPAMAJORITÁRIA. IMPROCEDÊNCIA.1. Questão de Ordem. Competência. Ação que apresenta, em seu bojo, pedido de investigação quanto à ocorrência de abuso de autoridade, previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90. Aplicado o enunciado da Súmulan. 62 do Tribunal Superior Eleitoral que estabelece que os limites do pedido são demarcados pelos fatos imputados na inicial, dos quais aparte se defende, e não pela capitulação legal atribuída pelo autor. Confirmada a competência para o julgamento do feito.2. Preliminares. 2.1. Do cerceamento de defesa. Para a configuração do cerceamento de defesa é necessário se fazer a demonstração do prejuízo sofrido, bem como o nexo de causalidade entre esse fato e a tese defensiva. Aprodução da prova reclamada – extração dos dados de conversas em grupo de WhatsApp – foi deferida em audiência, sem qualquer protesto da parte que ora alega cerceamento de defesa. Ademais, oportunizado prazo para manifestaçãosobreseu conteúdo em sede de alegações finais. Afastada a preliminar. 2.2. Da ilegitimidade passiva e da ausência de fundamento jurídico da representação. Prefaciais que requerem a análise das provas produzidas e que serão apreciadasemconjunto ao mérito.3. Representação para apurar a ocorrência, ou não, de conduta vedada prevista no art. 73, inc. III, da Lei n. 9.504/97, cumulada com ação de investigação judicial eleitoral, a fim de investigar a ocorrência deabuso de poder de autoridade, nos termos do disposto no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90. Não se analisa, nestes autos, eventual ilicitude narealização de propaganda eleitoral, nos termos invocados pela defesa, com base no § 2º do art. 28 da Resolução TSE n. 23.551/17.4. Fatos. 4.1. Criação, na rede social WhatsApp, de grupo no qual teriam sido incluídos, sem prévio consentimento, servidores ocupantes de cargos em comissão e detentores de função gratificada no âmbito de secretaria estadual, ecujoobjetivo era a divulgação de atos de campanha e a convocação dos servidores para atuar ativamente em prol da candidatura da chapa ao governo do estado, cujas tratativas ocorreriam, indistintamente, a qualquer tempo, fora ou dentro dohorário de expediente. 4.2. Oferecimento de convites para participação em jantares alusivos à campanha eleitoral. 5. Da conduta vedada. O art. 73 da Lei n. 9.504/97 prevê a suspensão imediata da conduta, quando for o caso, multa a todos os responsáveis e, sem prejuízo da pena pecuniária, a cassação do registro ou diplomadocandidato beneficiado. O Tribunal Superior Eleitoral tem orientação consolidada no sentido do necessário juízo de proporcionalidade e razoabilidade aplicado ao caso concreto, fixando-se, à vista da gravidade dos fatos, sancionamentocompatível com o grau de lesão ao bem jurídico tutelado pela norma. 5.1. Infundada a tese de falta de fundamento jurídico trazida em sede preliminar. Alegado que a servidora que administrava o grupo de WhatsApp e fazia a entrega dosconvites para os diretores, encontrava-se de férias no período. Demonstrado que as férias não contemplaram todo o lapso temporal da existência do grupo de mensagens, o qual se manteve em plena atividade por, no mínimo, mais vintedias depois de seu retorno ao trabalho. 5.2. Comprovado que a servidora, na condição de chefe de gabinete da secretaria, além praticar atos de campanha eleitoral dentro da repartição, em horário de expediente, mobilizava os colegaspara que fizessem o mesmo. Inclusive quando afastada do trabalho, gozando férias, seguia com a prática de abordar e aliciar colegas, para que se engajassem na campanha eleitoral. No mesmo sentido, o oferecimento de convites para jantares aservidores, também durante o horário de expediente, feito pela chefe de gabinete e diretores de departamentos, configuram a mesma ilicitude. 5.3. Inequívoca ainda, a responsabilidade da titular da secretaria, uma vez que, como integrante dogrupo na rede social, tinha pleno conhecimento do conteúdo das mensagens postadas em horário de expediente. Na condição de superior hierárquica da chefe de gabinete, tinha a obrigação de coibir tais práticas, mas ao contrário, autorizou, aindaque tacitamente, mudança no horário de almoço para facilitar a participação de servidores em atos de campanha eleitoral. 5.4. Por outro lado, não demonstrado que os integrantes da chapa ao governo do estado participassem ou tivessemconhecimento da existência do grupo de WhatsApp. Inviável, no caso, a penalização comomeros beneficiários, nos termos do art. 73, § 8º, da Lei n. 9.504/97. Entendimento do Tribunal Superior Eleitoral no sentido e que o favorecimento do candidato, por si só, não pode acarretar suaresponsabilização objetiva, devendo ser analisada, no caso concreto, a sua efetiva participação ou, no mínimo, ciência dos fatos, o que não restou demonstrado.6. Do abuso do poder político. A jurisprudência do TSE configura o abuso do poder político quando o agente público desborda da função, cargo ou emprego público, favorecendo de forma desproporcional um candidato,desequilibrandoa disputa eleitoral, na forma prevista no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90. Nesse sentido, para a caracterização do abuso de poder político é necessário, além da conduta abusiva, seja demonstrada a gravidade das circunstâncias quepermeiamo caso concreto, tendente a afetar a normalidade e a legitimidade do pleito. 6.1. Não demonstrada a existência de coação ou constrangimento sobre servidores com o fim de forçar a sua participação na campanha eleitoral e adquirir ingressos,sob ameaça velada de perda de cargos e funções, fato que caracterizaria, caso comprovado, abuso do poder de autoridade. Inexistência de notícia de exoneração ou represália a servidores por conta de não participação na campanhaeleitoral.7. Reconhecida a prática de conduta vedada, à medida que, parte dos representados, cederam o próprio serviço à ampanha majoritária dos dois primeiros representados e cooptaram o serviço de outros funcionários, emdetrimento do serviço público, além do oferecimento de convites para jantares, também durante o horário de expediente. Contudo, não evidenciado o abuso de autoridade imputado aos representados, uma vez que não restou provada aalegada coação aos servidores para que adquirissem convites ou participassem de eventos de campanha.8. Sancionamento. Aplicada sanção pecuniária de quinze mil UFIR às representadas Secretária de Estado e Chefe de Gabinete, na condição de agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas. Ausentes provas para acondenaçãodos demais representados. 9. Improcedência em relação aos integrantes da chapa majoritária. Parcial procedência em relação à Secretária de Estado e à Chefe de Gabinete. Representação nº060360581, Acórdão, Publicação: PJE – Processo Judicial Eletrônico-PJE, null. Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, null.

Ademais, a prova produzida dá conta de que outros servidores e empresas contratadas faziam uso do perfil da Prefeitura Municipal, de modo com que possível que, de forma equivocada, algum deles tenha participado da pesquisa sem perceber estar logado como tal.

Por fim, voltada à alegação de que servidores públicos foram mobilizados em prol da candidatura dos representados (Fato 5), fazendo uso de suas redes sociais em horário de expediente e em detrimento das atividades inerentes ao cargo exercido, destaco que os elementos trazidos ao expediente não se revelam suficientes para evidenciar absoluto desvio dos agentes em prol da campanha dos candidatos, uma vez que, ainda que se trate de conduta presumivelmente desligada das orientações administrativas, possível constatar que esparsas e breves.

Insuficientes, portanto, para ensejar a disparidade eleitoral.

Isso porque os depoimentos em juízo implicam o entendimento de que ainda que os servidores utilizassem redes sociais durante o horário de expediente para postagens partidárias, vinculavam-se a eventos que ocorreriam fora do horário de expediente, de modo com que ausente qualquer irregularidade.

Ainda, grifo que não se constata qualquer irregularidade no fato da administração criar grupo exclusivamente com cargos comissionados, a um por ser mero meio informativo e facultativo e a dois por sequer ser método convencional para tanto, muito possivelmente a Prefeitura possuindo o e-mail como forma de comunicação formal, tal qual diversos órgãos públicos.

Sublinhe-se, inclusive, que ao contrário do que tentou sugerir a parte autora, não há qualquer resquício de prova de que haveria sanção à eventuais faltantes nas reuniões formuladas, tampouco apuração de lista de presença ou oferta de vantagem para tanto.

Corroborando o entendimento, transcrevo trechos elucidativos dos depoimentos colhidos:

Advogado: Queria que a senhora nos explicasse um pouquinho como é que funciona essa relação com os Ccs. Na inicial houve algumas menções à postagens feitas aparentemente durante o horário de expediente sobre reuniões. Queria que a senhora explicasse como é que funcionam essas reuniões e em que horário (…)

Mari Leia: Então Dr. Existe um grupo de Ccs. Esse grupo era uma prática de governo, então ele foi montado lá no início em 2021, onde nós passamos todas as informações para esses Ccs. As reuniões que foi citado aí que eu faço uma convocação são pós-trabalho, ou seja, fora do horário de expediente. Durante este ano foram realizadas 04 reuniões somente, desde março.

Advogado: Sempre fora do horário de expediente?

Mari Leia: Sempre fora do horário de expediente.

Advogado: Em alguma ocasião o Prefeito determinou alguma realização de reunião com os Ccs para tratar de matéria partidária, eleitoral, que pudesse se confundir com as atividades da Prefeitura?

Mari Leia: Não, nunca.

(…)

Advogado: A senhora tem conhecimento do grupo de WhatsApp composto por CCs? Pode nos explicar objetivamente como é que funciona e a finalidade desse grupo?

Karine: Sim. São as informações em relação ao governo. São as informações que são colocadas no grupo do governo, no geral, sobre melhorias, sobre as obras. Informações aos colaboradores.

Advogado: Nesse grupo são combinadas reuniões de trabalho?

Karine: Sim, reuniões, exatamente.

Advogado: Essas reuniões acontecem que horário?

Karine: Depois do horário de expediente.

Advogado: Embora seja de trabalho, fora do horário de expediente?

Karine:: Fora, exatamente, sempre para não atrapalhar o horário de trabalho.

Advogado: Mas no grupo mensagens são trocadas no horário de expediente, eventualmente?

Karine: Sim, eventualmente, mas no grupo pouco são colocadas informações assim.

Advogado: A inicial dessa ação, ela traz um print seu, salvo engano. Com alguma mensagem, havia até alguma coisa relacionada a campanha. A senhora tem conhecimento? 

Karine: Sim, eu parei para tomar um café no meu horário de intervalo. Fiz a foto espontaneamente, sim. Horário do meu café à tarde. 

Advogada: Existe alguma orientação, determinação ou convocação para os CCS trabalharem na campanha, fazerem atividades eleitorais?. 

Karine: De maneira alguma. De maneira alguma.  

Juíza: Essas reuniões desse grupo de CC eram feitas com qual periodicidade, com que frequência que eram chamadas?

Karine: Raras vezes, o Prefeito não costuma fazer tantas.

Juíza: Uma vez por mês?

Karine: Não, menos. Eu acho que umas 5. Não sei lhe informar com objetividade.

Juíza: A senhora participou das outras?

Karine: Sim.

Juíza: Todas as outras?

Karine: Todas não lembro se eu participei.

Juíza: Nesse ano quantas?

Karine: Eu acho que foram umas 2 ou 3, não me recordo.

Juíza: Onde foram?

Karine: Também no CTG, acho que foi em torno de 19 horas, 18h30

Juíza: Posterior ao expediente?

Karine: Exatamente.

Juíza: Todas com o mesmo clima leve, estilo a pré-campanha?

Karine: Exatamente

Juíza: Com a mesma ideia? Com reunião de apoiadores também?

Karine: Não, não. Informações do governo.

Juíza: Senhora sabe porque não tinha os servidores concursados para a comunicação de governo?

Karine: Não sei informar.

Juíza: Se a senhora não quisesse ir, como é que funcionava?

Karine: Algumas não fui. Sem problema algum

Juíza: Era mais um convite do que uma convocação, digamos assim.

Karine: Com certeza.

Juíza: E os demais estavam tendo a mesma postura do que a senhora (uso do Eu vou)?

Karine: Eu não cuidei se os outros fizeram tudo no mesmo dia, horário, realmente é bem corrido lá e eu não cuidei. Eu parei pra tomar um cafezinho. Eu fiz e não posso lhe responder.

Juíza: Além desse evento de pré-campanha que a senhora colocou, “Eu vou”, confirmou no grupo, algum outro de campanha que a senhora se recorde de ter se manifestado?

Karine: Não.

Juíza: Apenas este?

Karine: Sim.

Juíza: Esse a senhora tinha ciência que era pré-campanha?

Karine: Sim.

Juíza: Como a senhora sabia que esse evento era pré-campanha e não reunião de governo?

Karine: Por informação ali, né? Eu acredito que estava escrito. Não me recordo.

Juíza: A senhora sabia com certeza que se tratava de pré-campanha?

Karine: Sim, claro.

Advogado: Alguma reunião dessas para campanha se deu em horário de expediente ou em dia de expediente? Sábado é dia de expediente na prefeitura?.

Karine: De maneira alguma, não, nunca.

Advogado: Nessa reunião de pré-campanha, se falou também nos projetos de governo?

Karine: Foi falado.

Advogado: Explica o que que o governo fez?

Karine: Exatamente. Em momento algum, nenhuma cobrança, nunca. Nada, nada, nada, nada, nada. O “eu vou” foi muito espontâneo, muito espontâneo.

Advogado: No horário de expediente, a senhora fala se tocar seu telefone, a senhora troca mensagens de WhatsApp com alguém?

Karine: Não dá tempo, é muito trabalho. Não falo mesmo. De verdade, doutor.

Advogada: Se estas reuniões eram para tratar de ações do governo, por que elas eram fora do horário de trabalho?

Karine: Como o ritmo era muito acelerado, por isso eram agendados depois horário.

Advogada: Mas era para melhorar o serviço?

Karine: Exatamente para melhorar o serviço da administração pública.

Advogada: Essas pessoas que eram convidadas, elas faziam parte todas de uma Secretaria ou de várias secretarias?

Karine: Eram todos os colaboradores.

Advogada: E essas informações que chegavam, por exemplo, de um servidor da Secretaria de saúde, um cc da Secretaria de saúde, a respeito de obras em algum local da cidade. Qual era o motivo dessa?

Karine: Eu não sei responder a pergunta.

Advogada: Nesta reuniões, quem ia ou não ia tinha que dar justificativa para alguém do porque do não comparecimento?

Karine: Não

Advogada: Se a senhora esteve numa reunião na QI quando trataram sobre a troca da marca do logotipo do governo?

Karine: Não, nunca

Advogada: Estás nomeada no governo desde quando?

Karine:Desde o dia 4/01/2021

Advogada: Você recorda de uma reunião que teve na sede da ulbra? Com todos os CCs?

Karine: Não recordo

Advogada: Essas reuniões tem lista de presença?

Karine: Não.

(…)

Juíza: A senhora participa do grupo de CCS?

Aurelise: Participo.

Juíza: Como é que funciona esse grupo?

Aurelise: Em que sentido?

Juíza: Como é que funciona?

Aurelise: Esse grupo tem orientações, comunicados. Então a gente recebe as mensagens e aí após o horário de trabalho se efetiva os comunicados.

Juíza: É um grupo de trabalho do governo?

Aurelise: É um grupo de trabalho do governo.

Juíza: Quem faz parte dele?.

Aurelise: Acredito que todos os CCS, acredito que todos eles. Não sei se estão todos. É um grupo de comunicados.

Juíza: Desse grupo saem reuniões, vocês se reúnem?

Aurelise: Desse grupo saem reuniões fora do horário de trabalho.

Juíza: Me dá um exemplo de qual ação nesse grupo de CCS agora vocês estão organizando lá.

Aurelise: Vamos supor uma caminhada no sábado. Vai o comunicado ali.

Juíza: Nesse grupo, que são os CCS do governo. A caminhada de campanha é comunicada lá?

Aurelise: Uhum.

Juíza: E vocês daí se manifestam. Eu vou, não vou.

Aurelise: Não, é só comunicado

Juíza: Comunicados de campanha?

Aurelise: É um conjunto de comunicados. Então também tem do trabalho, ó tal hora a reunião tal de obras, vamos de novo, né? Ou tal a caminhada, enfim.

Juíza: Está tudo misturado no mesmo grupo?

Aurelise: Isso aí

Juíza: Tudo junto. Campanha e governo está naquele grupo ali. Como um assunto a ser comunicado? Sim?

Aurelise: Sim.

Juíza: Esses comunicados ocorrem quando e por quem?

Aurelise: Aí é que tá. Depende se é uma questão de trabalho institucional dentro do horário de trabalho institucional, tá. Fora isso, após o expediente, 18 horas.

Isso posto, ainda que se considere inadequada a divulgação de eventos atinentes à campanha em horário de expediente e em grupo supostamente voltado para ações governamentais, há de se pontuar que tal conduta, por si só, não é suficiente para que se caracterize abuso político.

Corroborando o entendimento, trago precedente:

RECURSOS. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. CONDUTA VEDADA A AGENTE PÚBLICO. PREFEITO E VICE. ELEIÇÕES 2016. LICITUDE DA GRAVAÇÃO AMBIENTAL. OFERTA DE VANTAGENS EM TROCA DO VOTO. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. VEICULAÇÃO DEPROPAGANDA ELEITORAL EM PÁGINAS PESSOAIS DO FACEBOOK. SERVIDORES PÚBLICOS. REALIZAÇÃO DE ATOS DE CAMPANHA ELEITORAL DURANTE O HORÁRIO DE EXPEDIENTE. DESPROVIMENTO DO RECURSO DOS REPRESENTANTES. PROVIMENTO PARCIAL AO APELO DOS REPRESENTADOS. REDUÇÃO DAMULTA. 1. Licitude da gravação ambiental. Posicionamento jurisprudencial no sentido de considerar lícitas gravações efetuadas por um dos participantes da conversa, ainda que sem o conhecimento do outro. Entendimento sedimentado em sede derepercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal. Ausência de situação de excepcional sigilo. 2. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Alegada entrega de ranchos, dinheiro e vales-rancho a diversos eleitores em troca do voto. Promessa de benesse a eleitora. Conjunto probatório ¿ gravação ambiental eprovatestemunhal ¿ insuficiente para comprovar a prática do ilícito. Imprecisão da prova produzida, inapta a demonstrar que os votos foram conquistados irregularmente. Tampouco evidenciada a participação ou anuência dos representados nos fatos descritos.3. Condutas vedadas. 3.1. Publicidade institucional. Divulgação, na página oficial da prefeitura, de notícias relativas à reforma de escolas públicas e à compra de novos materiais pedagógicos. A divulgação de publicidadeinstitucionalé vedada dentro dos três meses que antecedem a eleição, conforme disposto no art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97, excepcionando-se apenas os casos de grave e urgente necessidade, assim reconhecidos pela Justiça Eleitoral. O escopo da norma éassegurar a igualdade de oportunidades entre os candidatos, que fica naturalmente prejudicada se um dos concorrentes é beneficiado pela publicidade do ente público que titulariza. Nítido o caráter institucional e eleitoral da publicidade veiculada,informando as providências adotadas pela administração na área de educação, sem retratar qualquer situação de urgente necessidade pública. 3.2. Publicações de propaganda eleitoral em favor dos candidatos à reeleição majoritária realizadas porservidorasmunicipais, durante o horário de expediente, em suas páginas pessoais do Facebook. A conduta vedada pelo art. 73, inc. III, da Lei n. 9.504/97 busca resguardar a isonomia entre os candidatos, impedindo o uso da máquina pública a favor da campanhadaqueles que estão à frente da Administração. Postagens esparsas de propaganda eleitoral realizadas no perfil pessoal de servidores não caracterizam o desvio de função pública que a norma pretende evitar. Eventuais manifestações pessoais sobre apreferência política individual dos servidores, durante o horário de expediente, embora possam ser sancionáveis do ponto de vista funcional, não demonstram desvio de função pública em prol da campanha eleitoral. Ademais, não há evidência de que asmanifestações tenham ocorrido por meio de computadores da prefeitura, nem da existência de orientação superior para que os servidores promovessem a campanha dos representados. Afastado o caráter ilícito da conduta. 3.3. Realização de atos de campanhapor servidores durante o horário normal de expediente. Caracterizada a conduta vedada descrita no art. 73, inc. III, da Lei n. 9.504/97. A circunstância de os representados não estarem no exercício de seus cargos públicos não afasta a suaresponsabilidade. 4. Desprovimento do recurso dos representantes. Provimento parcial ao apelo dos representados. Redução da multa aplicada. Recurso Eleitoral nº55335, Acórdão, Des. GERSON FISCHMANN, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, 01/10/2018.

RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2016. AIJE. ABUSO DE PODER POLÍTICO. CONDUTA VEDADA. ART. 73, III, DA LEI Nº 9.504/97. SUPOSTA PARTICIPAÇÃO DE SERVIDORES EM CAMPANHA ELEITORAL, NO HORÁRIO DE EXPEDIENTE. ACERVO PROBATÓRIO DEFICIENTE. NECESSIDADE DE PROVA ROBUSTA. 1. Para a configuração da conduta vedada prevista no art. 73, III, da Lei nº 9.504/97, faz-se mister a prova de utilização de funcionário público, em atos de campanha eleitoral de candidato, e, ainda, cumulativamente, que essa atuação ilícita tenha ocorrido durante o horário normal de expediente. 2. Recurso desprovido.

(TRE-PE – RE: 38534 CABO DE SANTO AGOSTINHO – PE, Relator: ÉRIKA DE BARROS LIMA FERRAZ, Data de Julgamento: 06/11/2017, Data de Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 247, Data 10/11/2017)

Não há olvidar, de qualquer forma, que os servidores em comissão, tal qual qualquer cidadão, tem o direito de livre expressar suas manifestações políticas, não havendo qualquer ilicitude em participação em eventos de campanha fora do horário de expediente, o que ocorrera no caso em tela.

A jurisprudência, inclusive, é firme ao corroborar tal argumento:

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AIJE. ABUSO DE PODER POLÍTICO NÃO CONFIGURAÇÃO. ATOS DE CAMPANHA COM PARTICIPAÇÃO DE SERVIDORES PÚBLICOS. LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO DE GASTOS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. INSUFICIÊNCIA DAS PROVAS. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Alegação de abuso de poder político pelo então Prefeito pelo uso de servidores e prédios públicos para a campanha dos candidatos investigados. 2. Ausência de provas de uso prédios públicos. 3. O servidor público, à exemplo de qualquer outro cidadão, tem direito à liberdade de expressão e de manifestação, desde que não esteja no exercício de sua função, durante o horário de expediente. 4. A realização de publicações em apoio aos candidatos ou a participação de servidores em reuniões e atos de campanha, de forma voluntária e fora do exercício de suas funções, afasta a caracterização de desvio de finalidade. Não caracterização do abuso de poder político. 5. Insuficiência do corpo probatório relativamente às alegações da existência de omissões na prestação de contas dos candidatos. 6. Recurso não provido.

(TRE-PE – REL: 060068560 ÁGUA PRETA – PE 060068560, Relator: IASMINA ROCHA, Data de Julgamento: 11/03/2022, Data de Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 57, Data 22/03/2022, Página 91-103)

Assim o sendo, imperativo afastar as alegações autorais.

II) O uso de bens móveis e imóveis da Administração em benefício dos candidatos à majoritária

Alega a parte autora, em síntese, que o investigado LUIZ ARIANO ZAFFALON teria se utilizado de equipamento 360, locado para festa realizada em Escola Municipal, para fins de gravar vídeo de campanha, optando por fazer o número 45 com as mãos, em alusão ao número de seu partido (Fato 6).

Tal argumento está fundado no art. 73, I, da Lei. 9.504/97, a qual descreve que:

São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

I – ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;

Ao abordar a pauta, Raquel Cavalcanti Ramos Machado comenta que:

Tal cessão traria claro desequilíbrio ao pleito, uma vez que os candidatos apoiados pela Administração teriam acesso a mais bens, passando a dispor de melhores condições para realizar uma campanha rica e organizada. Referida vedação, porém, não se aplica ao uso, em campanha, de transporte oficial pelo Presidente da República, nem ao uso, em campanha, pelos candidatos à reeleição de Presidente e VicePresidente da República, Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, Prefeito e Vice-Prefeito, de suas residências oficiais para realização de contatos, encontros e reuniões pertinentes à própria campanha, desde que não tenham caráter de ato público. A exceção é compreensível dentro do contexto da norma constitucional que admite a reeleição e não exige a desincompatibilização para a reeleição ao mesmo cargo (art. 14, § 6º, da CF/1988)5.

No caso em concreto, as provas trazidas aos autos demonstram que o ato perpetrado por Zaffalon é absolutamente frágil para que lhe seja atribuída maior reprovabilidade.

Tanto no aspecto quantitativo ou qualificativo, o contexto delineado indica a completa irrelevância do sinal formulado pelo candidato em plataforma de entretenimento para a lisura do pleito eleitoral.

Pouco ou nada se viu sobre isso in loco, bem como sequer há indícios de que o prefeiturável tenha utilizado o espaço para autopromoção.

Neste sentido, é a fala da informante Aurelise:

Advogado: Boa tarde, a senhora tem informações, poderia explicar para nós sobre essa festa que foi referida da inicial da ação na escola Antônio Aires? A senhora tem informações, a senhora esteve com o prefeito, o que a senhora pode nos relatar?

Aurelise: Sim, eu estive com o prefeito no dia 17 de agosto. Ele foi nessa escola, assim nós temos tido a prática de ir em algumas escolas, né? Visitar. Só que nessa foi um sábado, dia eletivo, né? Ele enquanto prefeito da cidade, eu enquanto secretária de educação. Era uma festa da família.

Advogado: Essa festa da família é realizada com recursos do município?

Aurelise: Não, não. É um dia letivo e a festa ela é realizada com recursos dos professores. No entanto, tem citado uma plataforma 360 ali, né? Acontece que a escola faz a Festa Junina, que é a primeira festa do ano para arrecadações. É uma prática das escolas, inclusive faz isso porque a verba não é suficiente para muitas coisas. Então, o que acontece? As escolas fazem, pedem pros pais, pros professores, insumos para poder fazer atividades. No dia das apresentações eles vendem bolo, cachorro-quente, essas coisas todas. E aí esse dinheiro, que não é um dinheiro de recurso do município, é usado em melhorias em outras festas para comunidade, porque é uma comunidade muito carente, então se proporciona isso para a comunidade.

Advogado: Essa plataforma que a senhora mencionou. Ela não era da escola?

Aurelise: Não. Ela Foi locada com o dinheiro da Festa Junina.

Advogado: A senhora pode nos explicar como é que foi a passagem do prefeito por essa festa?

Aurelise: Ele ficou no máximo 10 minutos lá e aí a plataforma ficava na entrada. Estava acontecendo a apresentação das crianças. Para o senhor entender, é um corredor, é um saguão bem grande. Lá na ponta estava os pais com as crianças na apresentação e bem no início a plataforma. Nós 2 fizemos a plataforma e aí em seguida ele foi embora.

Advogado: Prefeito chegou a discursar, falar alguma coisa?

Aurelise: Não, ele apenas saudou a comunidade, né? Parabenizando pela festa da família, só isso. Como prefeito municipal, estou aqui. Foi o que ele falou. Parabenizou e ainda agradeceu a minha presença lá com ele. Ele não ficou 10 minutos lá.

Advogado: Não houve nenhuma fala relacionada a eleições?

Aurelise: Não, nenhuma.

A testemunha Quelen Nunes, de igual maneira, reiterou a ausência de campanha no local:

Advogado: O prefeito passou por esta festa? Como foi a passagem dele?

Quelen: Sim, passou por esta festa. Eu estava na apresentação das atividades que as crianças tinham elaborado para as famílias e ele chegou. Acho que ficou cerca de 15 minutos na festa. Foi o tempo que eu o vi, na verdade, porque eu estava no microfone apresentando a festividade para os pais.

Advogado: Ele falou alguma coisa sobre campanha eleitoral?

Quelen: Não.

Não por acaso, o Tribunal Regional Eleitoral deste Estado vem afastando alegações do tipo:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO POR CONDUTA VEDADA. ABUSO DE PODER POLÍTICO. GRAVAÇÃO DE VÍDEO. ESCOLA MUNICIPAL. SERVIDORA PÚBLICA. CONJUNTO PROBATÓRIO INAPTO A DEMONSTRAR OS ILÍCITOS ALEGADOS. NORMALIDADE E LEGITIMIDADE DO PLEITO NÃO AFETADAS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que julgou improcedente Ação de Investigação Judicial Eleitoral – AIJE, cumulada com Representação por Conduta Vedada, na qual se imputava a utilização de bens públicos e de servidor público na campanha eleitoral de 2020. 2. Matéria preliminar superada. 2.1. Interposição dentro do tríduo legal, em conformidade ao disposto no art. 258 do Código Eleitoral. 2.2. Atuando no feito como custus legis, o Ministério Público Eleitoral possui legitimidade e interesse para recorrer mesmo quando não for o autor da ação eleitoral. 3. Irresignação limitada à suposta utilização de escola municipal e à participação de servidora pública, à época diretora da instituição de ensino, para gravação de propaganda eleitoral (vídeo) em benefício dos recorridos, candidatos reeleitos aos cargos de prefeito e vice. 4. Gravação realizada em horário que poderia corresponder ao almoço, com produção custeada com recursos da campanha e declarada na prestação de contas. O acervo probatório indica que, por ocasião da gravação, não estavam sendo realizadas aulas na escola em razão da pandemia do COVID-19 e que os servidores trabalhavam em horários reduzidos e mediante escalas. As condutas vedadas são espécie do gênero abuso de poder e somente acarretam a procedência da ação de investigação judicial quando comprovada a gravidade das circunstâncias capaz de afetar a normalidade e a legitimidade das eleições, a ensejar a aplicação das sanções de inelegibilidade e cassação dos registros dos representados. 5. Na hipótese, não configurado o abuso de poder, por meio da conduta vedada descrita no art. 73, inc. I, da Lei n. 9.504/97, porquanto a lei não veda o manuseio de imagens produzidas em bens públicos, mas sim a utilização do bem público em campanha de forma a caracterizar o seu mau uso e a causar desequilíbrio eleitoral, de modo que aproveitar imagens produzidas em local de livre acesso à população não é proibido pela legislação eleitoral. Tampouco comprovado que a gravação do vídeo pela diretora da escola tenha sido realizada durante ou em detrimento do seu expediente no município. 6. Conjunto probatório insuficiente para comprovar as condutas vedadas e o abuso de poder político descrito no art. 14, § 9º, da Constituição Federal, c/c art. 22, inc. XIV, da Lei Complementar n. 64/90. Não demonstrada a gravidade das circunstâncias capaz de afetar a normalidade e a legitimidade das eleições. De igual modo, não maculada a liberdade do voto dos eleitores. Manutenção da sentença. 7. Provimento negado.

(TRE-RS – Acórdão: 060057331 MONTAURI – RS, Relator: Des. DRA. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK (JUÍZA AUXILIAR), Data de Julgamento: 17/10/2022, Data de Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Data 19/10/2022 )

Volúvel, igualmente, é a tese de que os candidatos a vereador JOÃO BATISTA PIRES MARTINS e ALEXSANDER ALMEIDA DE MEDEIROS tenham se utilizado de bens públicos em prol de suas candidaturas, seja por intermédio do fortalecimento de seus partidos (Fato 6) ou até mesmo para afixação de material de campanha (Fato 5).

Consoante bem percebeu o próprio Ministério Público “não há provas de que a filiação de fato tenha se dado em prédio da Administração Municipal”, mormente a defesa, inclusive, ter produzido prova no sentido de que o real espaço para tanto foi outro, próprio de seu partido que, aliás, sequer é o mesmo do Prefeito.

Adiante, é possível perceber, ainda, que inexiste qualquer demonstração convincente de que o vereador Alexsander tenha usufruído da administração para a colocação de banner de campanha.

Isso porque, consoante fundamentou o réu, sequer é necessário qualquer aparato para tanto por se tratar de objeto móvel e de baixo peso, não havendo qualquer espécie de benefício próprio no conserto de determinado ponto público do município, haja vista a alternância de lugares em que expostos os materiais de campanha e, sobretudo, por haver circulação de populares no local, de modo com que caso necessário eventual reparo, assim a Administração deveria o fazer de imediato.

III) A captação de apoio político a partir da máquina pública.

Por fim, está fundada a pretensão autoral em suposta captação de apoio político perpetrada pelos representados por intermédio da máquina pública, seja a partir da utilização de cargo público para promover alianças em prol da candidatura (Fato 7), uso de meios de comunicação patrocinados pelo Município (Fato 8), publicações em períodos vedados (Fato 11), doação de bens (Fato 12) ou desvio de donativos (Fato 13).

Neste contexto, refere que a nomeação de José Capaverde ao cargo de Secretário de Governança, Comunicação e Cultura de Gravataí ocorrera para fins de ganho eleitoral, uma vez que no primeiro dia útil após o candidato desistir da pré-candidatura, já fora nomeado para o cargo.

Acrescentou, ainda, que o cargo ocupado pela servidora Maynara Machado, nomeada em 18 de julho de 2024, também decorrera de tal interesse.

As testemunhas ouvidas em juízo, contudo, afastam tal argumentação:

Advogado: Explica para nós, o senhor é secretário desde que data?

José Capaverde: Sou secretário desde a metade do mês de julho.

Juíza: De qual ano?

José Capaverde: 2024

Advogado: Como se deu a sua entrada no governo como secretário?

José Capaverde: A entrada no governo partiu do Diretório Estadual. Eu sou ligado ao Deputado Estadual Giovani Chierini que é o presidente Estadual do Partido e ele abriu conversas com o governo em uma vinda à Gravataí na GM.

Juíza: O senhor referiu partido. Especifica qual…

José Capaverde: Partido Liberal. E aí a partir disso as conversas foram evoluindo. Nessa evolução a gente sentou para conversar. Eu sentei aqui com o Davi, com o Prefeito Zaffa e a gente fechou essa união para trazer o PL para o governo municipal.

Advogado: Antes disso (…) Como é que o PL estava negociando a participação nas eleições. No primeiro semestre do ano…?

José Capaverde: O PL tinha conversas com a oposição e tinha conversas com o governo e também tinha a possibilidade de lançar uma candidatura própria. A gente optou, pela viabilidade eleitoral e pela semelhança no projeto, de estar com o governo municipal.

Advogado: Antes dessa opção o senhor chegou a ser lançado pré-candidato?

José Capaverde: Lançado pré-candidato a Prefeito pelo PL em uma reunião lá em Brasília. A gente lançou nas redes sociais ali no início de julho.

Advogado: E como é que foi… Porque o senhor desistiu? Como foi essa desistência? Foi uma decisão sua? Foi uma decisão do partido?

José Capaverde: Na verdade a gente (…) fez uma análise eleitoral aqui do município sobre a viabilidade e sobre o crescimento que a gente poderia ter na eleição de 2024 pensando no partido, eu sou Presidente Municipal do Partido, e também porque o Presidente Chierini e o nosso deputado federal Zucco gostariam de estar apoiando o Prefeito Zaffa, a gente começou essa conversa e chegamos a um denominador de estar junto ao governo municipal.

Advogado: Em algum momento durante essas conversas, o Prefeito ofereceu pessoalmente ao senhor um cargo no governo para que o senhor (…) como incentivo para que o senhor retire a candidatura?

José Capaverde: Não, em momento algum.

Advogado: Como é que deu a sua entrada no governo? Tu desiste da candidatura… Quem decide pela sua entrada no governo?

José Capaverde: Na verdade, a gente decidiu pela composição com o Prefeito Zaffalon e a partir disso as conversas foram evoluindo e o Prefeito convidou nós para fazermos parte do governo municipal já que existia um alinhamento ideológico e ele acreditou que a gente poderia contribuir para o governo. Foi ofertado o espaço para o Partido Liberal aqui em Gravataí.

Advogado: Como se deu a entrada do Secretário Capaverde no governo?
Davi: O PL é um partido importante no cenário nacional com um porte ideológico parecido com o nosso, com o governo. O Prefeito e o Vice-Prefeito fizeram campanha para o Bolsonaro em 2022 e cerca de sei lá, 1 mês antes dele entrar no governo propriamente dito, em um ato na escola Cívico Militar, eu conversei com o Deputado Zucco que é um Deputado que tem essa bandeira da escola cívico militar. E ali fizemos um convite mais veemente para que o PL compusesse com o governo, já que tem 1 Vereador e o governo sempre atua para tentar ampliar a sua base parlamentar. Desde então, o Zucco mais simpático a ideia, passou a ter interlocução conosco. E no anúncio da GM eu conversei com o Deputado Cherini, Presidente estadual do PL, fiz a ele também o mesmo convite, a mesma conversa e passei a tratar com ele dessa possibilidade. Isso durou, sei lá, 3 semanas, algo assim. Eu não saberia dizer agora o tempo. Até que, finalmente, as conversas amadureceram e se proporcionou que o PL viesse integrar a base do governo.

Na hipótese, é possível apurar que o vínculo que passou a ser exercido entre o secretário e os representados à majoritária é justamente decorrente de uma coalizão natural das relações políticas, sendo corriqueiro que o Poder Executivo, visando dar vazão ao seu plano de governo, exerça continuamente diálogo para manter ou majorar sua base.

Nesta linha, adoto como fundamentação os importantes ensinamentos do Ministro Luiz Fux.

Obviamente que, com isso, não pretendo interditar a pactuação de acordos políticos (e.g., promessa de nomeação a cargos na qualidade de agentes políticos), postura que evidencia um agir estratégico legítimo à luz das regras do jogo político-democrático. A busca de apoio político não encerra per se abuso de poder econômico ou compra de votos. Sobressai, portanto, a ilicitude eleitoral, a merecer a censura por parte desta Justiça Especializada, a cooptação de eventual candidato para compor ou apoiar determinada chapa mediante a promessa de vantagens econômicas, em especial quando, desse acordo, resultar a possibilidade real de amealhar mais eleitores com ofensa à liberdade de voto dos cidadãos. (Recurso Especial Eleitoral nº 45867, Acórdão, Relator{a) Min. Luiz Fux, Publicação: DJE- Diário de justiça eletrônico, Data 15/02/2018-TSE).

No caso em tela, não há qualquer evidência de que a Secretaria foi oferecida ao agora Secretário em contrapartida à desistência de candidatura. Ao contrário, de tudo que se produziu em juízo é possível perceber que, em verdade, as conversas produzidas almejavam angariar novos suportes do Executivo no Legislativo para aprovação de demandas e afins.

Ademais, há de se pontuar que o próprio art. 73 da Lei 9.504/97 não exime a nomeação de cargos em comissão ainda que em período eleitoral, presumindo-se legítimos os atos administrativos praticados, até que se prove o contrário em ação própria para tanto.

A equidade nas eleições, igualmente, sequer restou maculada, mormente não ter sido produzido qualquer elemento acerca da composição formada, a qual, aliás, ocorrera por vinculação ideológica e como revés aos demais apoios firmados pela chapa opositora ao governo.

Neste aspecto, acolher a argumentação da parte autora significaria adentrar em questões estruturalmente partidárias e de ideologias, significando o avesso do que pressupõe a Carta da República em salvaguardar a livre expressão de pensamento.

Corroborando o entendimento, trago precedente:

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. CANDIDATOS. PREFEITO E VICE-PREFEITO. VEREADORES. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. NEGOCIAÇÃO DE APOIO POLÍTICO COM A OFERTA DE CARGOS PÚBLICOS A ADVERSÁRIOS. IMPLANTAÇÃO DE GRATIFICAÇÕES E VANTAGENS PARA SERVIDORES PÚBLICOS. COMPRA DE VOTOS. COLOCAÇÃO DE PIÇARRA. PAGAMENTO DE CIRURGIAS E EXAMES PARTICULARES. CONTRATAÇÃO DE PESSOAS SEM APRESENTAR NA PRESTAÇÃO DE CONTAS DO MUNICÍPIO OS DEVIDOS COMPROVANTES DE PAGAMENTOS. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE ROBUSTEZ NAS PROVAS PRODUZIDAS PARA A CARACTERIZAÇÃO DOS ILÍCITOS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1 – Para se caracterizar o abuso de poder, é preciso que a conduta narrada seja relevante, possuindo o condão de comprometer a integridade e a lisura do pleito, sendo necessário avaliar a magnitude e gravidade dos atos praticados, a fim de verificar o grau de comprometimento dos bens tutelados pela norma eleitoral. 2 – A máquina administrativa não pode ser colocada a serviço de candidaturas eleitorais. Contudo, os elementos de prova trazidos aos autos, consistentes nas informações extraídas nos documentos acostados e na oitiva testemunhal, não comprovam ou sequer mencionam ter havido negociação de cargos e benefícios em troca de favores políticos. 3 – Não havendo caracterização do alegado abuso do poder, porquanto as provas carreadas são frágeis, não se permite a imposição de penalidades graves como as requeridas com base em meras conjecturas. 4 – Nas ações eleitorais, pela própria natureza dos direitos nela invocados, mormente o interesse público envolvido, os fatos alegados pelo autor da ação devem ser devidamente provados, o que não se verifica no caso dos autos. 5 – Sentença mantida. Recurso conhecido e desprovido.

(TRE-PI – Acórdão: 060035364 CAPITÃO DE CAMPOS – PI, Relator: Des. CHARLLES MAX PESSOA MARQUES DA ROCHA, Data de Julgamento: 10/10/2022, Data de Publicação: DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Data 14/10/2022 )

O uso dos meios de comunicação como ferramenta de governo, igualmente, causou insurgência da parte autora.

Segundo narra, os vínculos da Administração com publicidade são obscuros e em inúmeras oportunidades o conteúdo apresentado está muito distante do preceito constitucional, visando enaltecer os investigados e criticar seus adversários.

Os elementos produzidos, todavia, não ostentam a robustez que demanda esta espécie de ação.

Veja-se que eventuais suposições quanto ao Portal POA 24h guardam referência às entrevistas produzidas em 07 de agosto de 2023 em que supostamente Zaffalon teria sido o único candidato entrevistado.

Vale lembrar, entretanto, que consoante bem apontou a parte ré, tal marco temporal estava muito aquém do início da campanha eleitoral, sequer sendo possível falar em igualdade de espaços de fala.

Essa circunstância, todavia, se soma ao fato de que, ainda que patrocinadora da plataforma, não caberia ao Município de Gravataí e muito menos ao Poder Judiciário, em qualquer hipótese, intervir na produção independente de conteúdos jornalísticos, preservando-se a liberdade que lhe é assegurada pela Constituição Federal.

Firme neste sentido, aliás, é o posicionamento do Tribunal Superior Eleitoral:

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. PRESIDENTE E VICE–PRESIDENTE DA REPÚBLICA. PROVAS. DEPOIMENTO PESSOAL. REQUISIÇÃO DE DOCUMENTOS. QUEBRA DE SIGILOS CONSTITUCIONAIS. EXCEPCIONALIDADE. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. PRINCÍPIO DA LIBERDADE DE IMPRENSA DE COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO. GRAVIDADE DAS CONDUTAS. INEXISTÊNCIA. MOBILIZAÇÃO POLÍTICA. LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. IMPROCEDÊNCIA DA AIJE. 1. Ante a falta de previsão na Lei Complementar 64/1990 e o caráter indisponível dos interesses envolvidos, não há depoimento pessoal dos investigados em sede de AIJE. Todavia, eles não estão impedidos de fazê–lo, caso a isso se disponham, conforme assentado na jurisprudência desta Corte Superior ( AI 28918/SC, Relator Ministro Og Fernandes, DJe de 25.2.2019; AIJE 0601754–89/DF, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe de 13.12.2018; AIJE 0601575–58/DF, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe de 12.12.2018; AgR– RMS 2641/RN, Relator Ministro Luís Roberto Barroso, DJe de 27.9.2018; RHC 131/MG, Relator Ministro Arnaldo Versiani, DJe de 5.8.2009; e HC 85.029, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, DJ de 1º.4.2005). 2. Consoante a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a ordem judicial para o afastamento dos sigilos protegidos constitucionalmente deverá indicar, a pertinência temática e a efetiva necessidade da medida, bem como “que o resultado não possa advir de nenhum outro meio ou fonte lícita de prova” e, ainda, a “existência de limitação temporal do objeto da medida, enquanto predeterminação formal do período” ( MS 25812 MC, Relator Ministro Cezar Peluso, DJ de 23.2.2006). No mesmo sentido, a “decisão que determina a quebra de sigilo fiscal , motivo pelo qual somente deve ser proferida quando comprovado nos autos a absoluta imprescindibilidade da medida” – AI 856552 AgR/BA no AI, Relator Ministro Luís Roberto Barroso, julgado em 25.3.2014. 3. Não se considera como fundamento idôneo, para fins de justificar a requisição de documentos e/ou quebra de sigilos protegidos constitucionalmente, matérias jornalísticas publicadas em veículos de comunicação eventualmente vinculados ideologicamente com determinado partido e/ou candidato, além de estarem baseadas exclusivamente no anonimato dos interlocutores, dos declarantes e dos partícipes das referidas conversas, diálogos e denúncias. Não se pode invocar o sigilo da fonte para inviabilizar o direito de defesa, lembrando que a Constituição, ao albergar a livre manifestação do pensamento, veda o anonimato. 4. “Notícias extraídas de jornais e opiniões emitidas por profissionais da imprensa não comprovam que autoridades governamentais estejam praticando atos de ofício, com desvio ou abuso de autoridade em benefício de candidato [.. .].”(AgR–Rp 1.283/DF, Relator Ministro Cesar Asfor Rocha, DJ de 18.12.2006). 5. O legislador de 2010, com a edição da Lei Complementar 135, substituiu o critério da potencialidade lesiva pelo da gravidade, de forma que as infrações menos graves devem ser sancionadas no âmbito das representações eleitorais. 6. Apenas os casos que extrapolem o uso normal das ferramentas virtuais é que podem configurar o uso indevido dos meios de comunicação social, sem prejuízo da apuração de eventual propaganda irregular, que possui limites legais distintos da conduta do art. 22 da Lei Complementar 64/90. Precedentes. 7. Para se caracterizar o abuso de poder, impõe–se a comprovação, de forma segura, da gravidade dos fatos imputados, demonstrada a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta (aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo). A mensuração dos reflexos eleitorais da conduta, não obstante deva continuar a ser ponderada pelo julgador, não mais se constitui fator determinante para a ocorrência do abuso de poder, sendo agora revelado, substancialmente, pelo desvalor do comportamento. 8. À luz do princípio da reserva legal proporcional, nem todo ato ilícito reconhecido por esta Justiça Especializada será necessariamente abusivo e, por conseguinte, apenado com inelegibilidade e cassação do registro, do mandato ou do diploma, sendo cabível impor sanções outras, a exemplo de suspenção imediata da conduta e de multa. 9. Matérias jornalísticas são de inegável interesse não somente para os eleitores, como para as emissoras de rádio e televisão, razão porque estão albergadas pelo princípio da liberdade de imprensa e de comunicação. 10.”Não cabe ao Poder Judiciário interferir na linha editorial das emissoras para direcionar a pauta dos meios de comunicação social, porquanto prevalece no Estado Democrático e Constitucional de Direito, à luz o art. 220 da CF, maior deferência à liberdade de expressão, alcançada pela liberdade jornalística.”(Rp 0601526–17.2018.6.00.0000, Relator Ministro Sergio Silveira Banhos, PSESS de 11.10.2018). 11.”Não se caracteriza tratamento anti–isonômico a partir de notícias veiculadas em um único dia e com base em um único telejornal da programação da recorrida. Devem ser considerados referenciais mais extensos no tempo – um período considerável de eventos a serem cobertos pela mídia – e no espaço – os diversos programas jornalísticos da grade da emissora, cabendo à Justiça Eleitoral atuar em situações de gravidade manifesta, sob pena de vulnerar a liberdade de informação jornalística.”(Rp 0600232–27.2018.6.00.0000, Relator Ministro Carlos Horbach, DJe de 21.8.2018). 12. Conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF), a”liberdade de expressão constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e compreende não somente as informações consideradas como inofensivas, indiferentes ou favoráveis, mas também as que possam causar transtornos, resistência, inquietar pessoas, pois a Democracia somente existe baseada na consagração do pluralismo de ideias e pensamentos políticos, filosóficos, religiosos e da tolerância de opiniões e do espírito aberto ao diálogo”( ADI 4439/DF, Relator Ministro Luís Roberto Barroso, redator para o acórdão Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, DJe de 21.6.2018). 13. O postulado da igualdade de chances entre os candidatos deve ser compreendido à luz do caso concreto, mormente se considerarmos a natural assimetria na distribuição dos recursos econômicos aos partidos e candidatos, bem assim os seus reflexos na propaganda eleitoral ocorrente no pleito. 14. Ação de Investigação Judicial Eleitoral que, na linha do parecer ministerial, rejeitadas as preliminares, julga–se improcedente.

(TSE – AIJE: 060196965 BRASÍLIA – DF, Relator: Min. Jorge Mussi, Data de Julgamento: 24/10/2019, Data de Publicação: 08/05/2020)

Do contrário, se estaria a respaldar a ideia de que grandes conglomerados econômicos que recebem percentual elevado de verba de publicidade não poderiam possuir manifestações de jornalistas favoráveis ao candidato A ou B por suposto favorecimento.

Neste sentido, pontue-se que o Secretário-Adjunto refere critérios objetivos para o lançamento das publicidades, a exemplo do tempo de permanência da propaganda, por exemplo.

Aqui, pontuo novamente a necessidade de que os elementos produzidos pela parte autora indicassem pormenorizadamente quais trechos corroborariam os fatos que descreve. Tal como se observa no expediente, competiria ao julgador assistir inúmeros vídeos que abordam matérias alheias aos autos em clara procura de evidências que inobserva a regra do ônus de prova prevista pela legislação.

Dada a limitação de análise, são extensivos os argumentos acima alinhavados ao referido Blog do Chico Pereira e ao Programa É Isso Aí, patrocinado pelo governo municipal.

Com efeito, é possível depreender a partir das mídias referidas na exordial que o jornalista é simpatizante da gestão dos representados e ostenta boa relação para com o Prefeito. Isso não significa dizer, todavia, que eventuais falas elogiosas tornem a disputa eleitoral desigual, sobretudo a partir do ponto de vista quantitativo, mormente a própria parte autora questionar a escala dos vídeos formulados.

O Tribunal Superior Eleitoral, em situação análoga, já respaldou tal entendimento:

“fatos ocorridos na mídia impressa e eletrônica (internet) possuem alcance inegavelmente menor em relação ao rádio e à televisão, tendo em vista que, nesses casos, a busca pela informação fica na dependência direta da vontade e da iniciativa do próprio eleitor”
(…) “apenas os casos que extrapolem o uso normal das ferramentas virtuais é que podem configurar o uso indevido dos meios de comunicação social, sem prejuízo da apuração de eventual propaganda irregular, que possui limites legais distintos da conduta prevista no art. 22 da Lei Complementar n.º 64/90( AIJE nº 0601862-21/DF – j. 19.09.2019 – Dje 26.11.2019).”

Neste ponto, inclusive, grifo a necessidade de se observar a plena separação de poderes, não incumbindo ao Poder Judiciário qualquer influência, sobretudo em âmbito eleitoral, na escolha dos métodos de publicidade do Poder Executivo.

Da mesma sorte padece a alegação de que a entrega de um prêmio em favor do representado Zaffalon poderia trazer desigualdade ao pleito eleitoral.

Ao contrário do que afirma a parte autora, a prova trazida ao processo revela que não houvera qualquer espécie de autopromoção do então candidato. Em verdade, trata-se de premiação promovida pelo depoente Zilmar que, ao fim e ao cabo, pretendia apenas homenageá-lo.

Grife-se aqui, novamente, o consolidado entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, aplicável na hipótese, de que “o favorecimento do candidato, por si só, não pode acarretar sua responsabilização objetiva, devendo ser analisada, no caso concreto, a sua efetiva participação ou, no mínimo, ciência dos fatos” (Representação nº060360581) ou até mesmo de que livre é a manifestação de pensamento (art. 5º, IV, da CF).

Esclareça-se que há prova de que o prêmio não detinha patrocínio do Município, apenas tendo sido entregue em evento público, sem maiores desdobramentos.

De outro lado, registre-se não ser de competência da Justiça Eleitoral a análise de questões administrativas que desbordam a esfera deste procedimento, voltado exclusivamente para análise de eventual abuso de poder.

Nas palavras da parte autora, Zaffalon teria utilizado a expressão “Rasga essa licitação. Não gostei”, circunstância que é possível constatar a partir da mídia decorrente do link https://www.youtube.com/watch?v=pkmPAwhoOCo&t=19s.

Todavia, ainda que tal sugestão possa acarretar ajuizamento de ação própria para apuração pelo Ministério Público, se faz imperativo delimitar as esferas de atuação do juízo em matérias que evidentemente possam interferir no pleito eleitoral, o que não é o caso.

Estas razões, aliás, acabam se refletindo em suposta doação praticada ao avesso da lei em benefício de correligionário, que, entretanto, foi autorizada pela Lei Municipal nº 4.796 de 04 de abril de 2024.

Pontuo que o fortalecimento das equipes de resgate se revelou necessário tanto em virtude da situação de emergência que enfrentou o Município (DECRETO N° 21.627 DE 30 DE ABRIL DE 2024) quanto na calamidade pública que assolou o Estado e, por via reflexa, Gravataí, onde exemplificativamente se tem ciência de que existiram mais de 40 abrigos para auxílio de centenas de desabrigados, exigindo-se empenho de voluntários também da sociedade civil como dos destinatários.

Destaque-se a dificuldade de trânsito no interregno da calamidade, sobretudo para primeiros socorros, razão pela qual não se revela evidente que o intuito para tanto seria o eleitoral.

Neste sentido, evitando maiores digressões, trago julgados:

ELEIÇÕES 2020 – RECURSOS ELEITORAIS – AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL – SUPOSTO ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO – ALEGADA PRÁTICA DE CONDUTA VEDADA – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO INTERPOSTO PELA COLIGAÇÃO REPRESENTANTE: ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO: ALEGAÇÃO DE QUE OS REPRESENTADOS FAVORECERAM EX-SECRETÁRIO DO MUNICÍPIO, QUE TAMBÉM ERA CANDIDATO A VEREADOR, EM PROCESSO LICITATÓRIO – CERTAME CUJO OBJETO FOI A CESSÃO PARA USO DE DUAS SALAS BOX NO PARQUE INDUSTRIAL DO MUNICÍPIO – SUPOSTO INTUITO DE COMPRAR O APOIO POLÍTICO DO EX-SECRETÁRIO – CONSTATAÇÃO DE DUAS LICITAÇÕES ANTERIORES QUE RESTARAM FRUSTRADAS – EX-SECRETÁRIO SUPOSTAMENTE FAVORECIDO NA LICITAÇÃO QUE PERTENCE AO MESMO PARTIDO DOS REPRESENTADOS QUE SE REELEGERAM NA PREFEITURA E QUE o TERIAM FAVORECIDO NA LICITAÇÃO – APOIO POLÍTICO QUE JÁ É ESPERADO – INEXISTÊNCIA DE QUALQUER INDÍCIO DE QUE A LICITAÇÃO VISOU SAGRAR VENCEDOR O EX-SECRETÁRIO OU OBTER O SEU APOIO – ABUSO DE PODER NÃO DEMONSTRADO – INCOMPETÊNCIA, ADEMAIS, DA JUSTIÇA ELEITORAL PARA APURAR EVENTUAL IRREGULARIDADE EM LICITAÇÃO MUNICIPAL – NÃO PROVIMENTO DO RECURSO NESSE TOCANTE. CONDUTA VEDADA: ALEGAÇÃO DE QUE A MUNICIPALIDADE CONCEDEU BENEFÍCIO FISCAL EM ANO ELEITORAL – SUPOSTA VIOLAÇÃO AO ART. 73, § 10, DA LEI N. 9.504/1997 – LEI MUNICIPAL QUE SUSPENDEU POR UM ANO A COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA EM RAZÃO DA PANDEMIA PELO CORONAVÍRUS – ALEGAÇÃO DE QUE A MUNICIPALIDADE NÃO EDITOU DECRETO RECONHECENDO A EXISTÊNCIA DE EMERGÊNCIA PÚBLICA PARA JUSTIFICAR A SUSPENSÃO DA COBRANÇA – DESNECESSIDADE NO CASO CONCRETO – EXISTÊNCIA DE DECRETOS EM ÂMBITO FEDERAL E ESTADUAL NOS QUAIS SE ESTABELECEU A REFERIDA EMERGÊNCIA – PANDEMIA PELO CORONAVÍRUS QUE PIOROU SIGNIFICATIVAMENTE A REALIDADE ECONÔMICA DE MILHARES DE BRASILEIROS – EXISTÊNCIA DE MOTIVO RELEVANTE PARA A SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DA COBRANÇA DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA – NÃO CONFIGURAÇÃO DA PRÁTICA DE CONDUTA VEDADA – NÃO PROVIMENTO DO RECURSO NESSE TOCANTE. RECURSO INTERPOSTO PELOS REPRESENTADOS: PEDIDO DE CONDENAÇÃO DA REPRESENTANTE POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ POR TER LEVADO O JUDICIÁRIO A PROCESSAR LIDE TEMERÁRIA – PEDIDO NÃO ACOLHIDO NA SENTENÇA – AUTORA DA AÇÃO QUE NÃO ABUSOU DE SEU DIREITO – AFASTAMENTO DO REQUERIMENTO – NÃO PROVIMENTO DO RECURSO NESSE TOCANTE. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DE AMBOS OS RECURSOS PARA MANTER A SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS.

(TRE-SC – AIJE: 06003163520206240050 PRINCESA – SC, Relator: Des. ZANY ESTAEL LEITE JÚNIOR, Data de Julgamento: 04/08/2021, Data de Publicação: Relator (a) Des. ZANY ESTAEL LEITE JÚNIOR)

Não verifico, ainda, prova robusta que justifique o acolhimento da ação quanto ao ponto de publicidade institucional em período vedado.

Basta, para tanto, referir que as provas trazidas ao feito neste sentido são prints quase ilegíveis e que apontam como referência a data fornecida pelo próprio sistema operacional, o que poderia ser alterada por intermédio deste ou por software de edição de imagens, nada neste sentido tendo sido comprovado.

Somo que há boletim de ocorrência que narra invasão em período cujo arquivamento das postagens era esperado, tornando impossível eventuais diligências neste sentido.

Julgo forçoso relembrar, nesta senda, que ainda que se reconhecesse a ilegalidade das postagens, tal condição, por si só, não é apta para desequilibrar a disputa eleitoral, tal qual reconhecido pelo Tribunal Regional Eleitoral deste Estado:

RECURSOS. AÇÕES DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. JULGAMENTO CONJUNTO. CONDUTAS VEDADAS. CONTRATAÇÃO IRREGULAR DE SERVIDORES. NÃO CARACTERIZADA. INAUGURAÇÃO DE OBRA PÚBLICA E UTILIZAÇÃO DE BENS PÚBLICOS EM BENEFÍCIO DE CANDIDATURA. NÃO CONFIGURADA. PROPAGANDA INSTITUCIONAL. PERÍODO VEDADO. SÍTIO DA PREFEITURA. FACEBOOK. BENEFÍCIO A CANDIDATURAS. ILEGALIDADE. RESPONSABILIDADE DO AGENTE E BENEFICIÁRIOS. MULTA INDIVIDUAL. PROVIMENTO PARCIAL. ELEIÇÕES 2016. 1. Inexiste, em tese, vedação à nomeação ou exoneração de cargos em comissão, ou designação e dispensa de funções de confiança, durante o período eleitoral. Ônus probatório da parte que alega a ilicitude para efeito de afastar a presunção de legalidade dos atos administrativos de pessoal. Ilegalidade não demonstrada. Realizadas contratações emergenciais de servidores antes do prazo de proibição disposto no art. 73, inc. V, da Lei n. 9.504/97, nomeações regulares de cargos comissionados e nomeações de servidores do quadro efetivo em obediência a comando judicial. Conduta vedada não caracterizada. 2. Não configura contrariedade à legislação, durante o período eleitoral, a realização de inauguração de obras públicas, bem como a compra de bens e insumos necessários ao funcionamento da administração. Vedada é a prática com intenção de proveito eleitoral e auferimento de indevida vantagem na concorrência aos cargos eletivos, mediante a presença do candidato no evento ou, ainda, na realização de shows e espetáculos que não guardam relação com a obra em si. Não demonstrada a participação dos candidatos recorridos na cerimônia de abertura das obras públicas, a menção ao pleito ou a candidaturas no discurso do evento, nem outros atos caracterizadores de abuso de poder político. Propaganda limitada à divulgação de novos locais de funcionamento de Unidade de Pronto Atendimento ¿ UPA e de Centro de Referência de Assistência Social ¿ CRAS à coletividade. Circulação de panfletos consistentes em material de campanha, registrado perante a Justiça Eleitoral, sem aporte financeiro da municipalidade. Ilicitudes não configuradas. 3. Constitui, por outro lado, ilícito de natureza objetiva e independe de conteúdo eleitoreiro a divulgação de publicidade institucional no trimestre anterior ao pleito. Veiculação de notícias sobre inaugurações em sítio da prefeitura e sem seu perfil oficial no Facebook, durante o período eleitoral. Não evidenciadas as exceções do art. 73, inc. VI, al. ¿b¿, da Lei n. 9.504/97. Publicações aptas a beneficiar os recorridos, haja vista a vinculação da candidatura a obras e melhoramentos ocorridos na cidade. Notícias tendentes a ferir a paridade entre os candidatos. Reconhecida a ilegalidade da publicidade institucional. 4. Responsabilidade do agente público responsável pela conduta vedada, dos partidos, das coligações e dos candidatos beneficiados, independentemente da sua participação ativa na prática do ilícito. Atos sem gravidade suficiente para, isoladamente, desequilibrarem o pleito. Aplicação de penalidade pecuniária, mantendo-se hígidos os mandatos eletivos. Provimento parcial.

(TRE-RS – RE: 0000250-50.2016.6.21.0108 SAPUCAIA DO SUL – RS 25050, Relator: EDUARDO AUGUSTO DIAS BAINY, Data de Julgamento: 12/07/2017, Data de Publicação: DEJERS-123, data 14/07/2017)

Necessário, entretanto, que na hipótese em tela a suposta permanência irregular das publicações viesse comprovada por elemento de maior convicção, seja por meio de ata notarial como praticado quanto ao voto em pesquisa de rede social, ou até mesmo por foto com jornal de grande circulação publicado no dia dos fatos, nos moldes do que costumeiramente se vê em ações judiciais.

Acrescento, ainda, não ter sido comprovada a permanência de outdoor de governo em período vedado pela Lei Eleitoral, tampouco qualquer publicidade subliminar em material de sala de reuniões que apenas faz alusão a pontos turísticos do Município.

Por derradeiro, não verifico qualquer ato ilícito comprovado quanto aos donativos remetidos a Gravataí.

Do que se constata, as doações privadas restaram inicialmente mantidas em estabelecimento particular, sequer sendo possível auferir se pertenciam aos representados, e após foram distribuídas pelo Banco de Alimentos de Gravataí e Guarda Municipal, não havendo qualquer ilegalidade na prática.

Justo rememorar que a Calamidade Pública que atingiu o Rio Grande do Sul no mês de maio do corrente ano implicou a necessidade de maior dinamismo nas diligências empregadas, acima de tudo quando se estava diante de doações que precisavam de forma emergente chegar aos destinatários que delas necessitavam. Sendo assim, possível que em caso de superlotação de imóveis públicos, eventualmente fossem mantidas em espaço privado provisoriamente, desde que preservada a cadeia de destinação.

Quanto ao pedido de reconhecimento de litigância de má-fé apresentado pela defesa do réu João Batista Pires Martins (Documento de ID 123416006), não verifico, de forma cabal, a ocorrência de atos que a caracterizem, nos termo do artigo 80 do Código de Processo Civil.

STJ – AgRg no REsp 1.123.456/SP: “A configuração da litigância de má-fé exige prova cabal de que a parte atuou com dolo ou deslealdade, o que não se verifica quando a parte se utiliza de argumentos que, embora não prosperem, estão respaldados por interpretações plausíveis da norma.”

Os argumentos trazidos pelo autor, embora não sejam robustos o suficiente para levar a um juízo de procedência da ação, são suscetíveis de dúvidas e esclarecimentos, não se revestindo de elementos suficientes para uma condenação por litigância de má-fé.

Ressalto que, para a caracterização da má-fé, é imprescindível que haja prova de que a parte atuou com intenção de prejudicar a outra, o que não se presume, mas deve ser demonstrado.

Diante do exposto, não estando presentes os elementos caracterizadores da litigância de má-fé previstas no art. 80 do Código de Processo Civil, afasto o pedido.

Diante do exposto, dadas as razões minuciosamente alinhavadas, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos propostos por COLIGAÇÃO GRAVATAÍ PODE MUITO MAIS em face de LUIZ ARIANO ZAFFALON, LEVI LORENZO MELO, JOÃO BATISTA PIRES MARTINS, CLEBES UBIRAJARA MOREIRA MENDES, ALEXSANDER ALMEIDA DE MEDEIROS e RAFAEL OLIVEIRA DA SILVA.

Partes intimadas eletronicamente.

Com o trânsito, registre-se baixa.

Dil. Legais.

Gravataí, datado e assinado digitalmente.

MARIANA AGUIRRES FACHEL,

            JUÍZA ELEITORAL