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Subjetividades masculinas negras no cinema: Novos imaginários são possíveis

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Data: 16/11/2024 19:37:24

Fonte: midianinja.org


Por Mauriceia Rocha

Neste Novembro Negro, conhecido assim devido ao Dia Nacional da Consciência Negra (20/11), é importante refletir sobre masculinidades negras e suas subjetividades. No cinema, algumas obras contemporâneas já lançam discussões acerca deste tópico, como vemos nos filmes Moonlight, sob a luz do luar (2017), Nosso Sonho (2023) e Sing Sing (2024).

O pedagogo da UERJ Marco Aurélio Correa, em seu artigo Meninos negros vão ao cinema: inovações nas representações cinematográficas como reinvenção das estéticas negras, afirma: “O cinema não é mera representação do real, mas é uma criação originada a partir dele, por isso que em sociedades com um legado racista, existem representações no cinema e em diferentes formas de artes que dão continuidade à estas formas de preconceitos e discriminação”.

Rompendo com o imaginário do gênero favela movie, Nosso Sonho, filme brasileiro dirigido por Eduardo Albergaria, não nos mostra tráfico e armas. A cinebiografia sobre a trajetória da dupla de maior sucesso do funk melody, Claudinho & Buchecha, interpretados respectivamente por Lucas Penteado e Juan Paiva, foca na amizade construída desde a infância, de dois meninos negros, que, ao sonharem juntos, construíram a carreira artística da dupla e como o amor que um sente pelo outro atravessa até a precoce morte de Claudinho, em um acidente de carro em 2002.  

A subversão de estereótipos é presente também no poético Moonlight: sob a luz do luar, do diretor estadunidense Barry Jenkins, onde acompanhamos a jornada de autoconhecimento em três momentos da vida do jovem negro Chiron, apelidado de Little (Pequeno), de olhar acuado, morador de uma comunidade pobre de Miami, após a explosão do crack nos anos 80. Apesar de todo o contexto de violência, o filme transborda beleza e sensibilidade, ao dotar seus personagens de ricas nuances através do amor, solidão, e sentimentos reprimidos que derramam pelos olhos e peles muito bem iluminadas dos atores e pela fotografia.

Além dos conflitos internos e externos de Chiron com sua sexualidade, família, bullying, universo das drogas e crime, temos também o personagem Juan, interpretado por Mahershala Ali, que apesar de liderar o tráfico do bairro, se torna uma figura paterna responsável, dócil e amorosa para Little, unindo duas esferas que o racismo tenta tornar antagônicas: homens negros e o cuidar. Chiron é interpretado por Alex Hibbert na infância, Ashton Sander na adolescência e Travante Rhodes na fase adulta.

“Moonlight”. Foto: Divulgação

Sing Sing, filme americano de Greg Quedar, ainda sem previsão de estreia no Brasil, é baseado no programa Rehabilitation Through Arts (Reabilitação Através das Artes) da prisão de segurança máxima Sing Sing, em Nova York. O enredo gira igualmente sobre universos tidos como opostos: homens negros em situação de cárcere e arte, onde um grupo de detentos se envolve em criações de espetáculos teatrais através do programa. Pelo teatro, que é uma arte coletiva, os prisioneiros encontram espaço para libertar suas mentes e sensibilidades, ainda que o corpo esteja enclausurado. Eles encontram propósito, esperança, espaço seguro para, literalmente, desarmar-se e criar laços afetivos entre si. O filme é estrelado por Colman Domingo ao lado de ex-encarcerados que foram estudantes de teatro do próprio programa.

Os filmes citados nos ajudam a entender as masculinidades negras como múltiplas e heterogêneas, apesar da herança escravocrata tentar reduzi-las a brutalidade e hipersexualização, contribuindo assim com o processo de desumanização, que resulta na leitura desses corpos como marginais. A Necropolítica, termo cunhado pelo intelectual camaronês Achille Mbembe, dita quem é “matável” e quem é o inimigo do Estado, reforçando segregações.

Combater o racismo imagético audiovisual é combater a continuidade colonial, onde homens negros no Brasil são as principais vitimas de homicídio (Atlas da Violência 2023), estuprados em grande quantidade, apesar da subnotificação às autoridades, 70% da população carcerária masculina e 75% dos suicídios masculinos (Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023).

Há também grande interesse em acompanhar novas narrativas sobre masculinidades negras e suas subjetividades; Sing Sing está sendo cotado como forte candidato na categoria Melhor Ator no Oscar 2024, onde Moonlight se consagrou campeão em 2017 com os prêmios de Roteiro Adaptado, Ator Coadjuvante, para o já citado Mahershala Ali, e Melhor Filme. Nosso Sonho, além de ganhar algumas premiações, ficou entre os filmes pré-selecionados pela Academia Brasileira de Cinema e Artes Audiovisuais para representar o Brasil no Oscar 2024, e foi a maior bilheteria do cinema nacional em 2023, com 430 mil espectadores. 

Texto produzido em colaboração a partir da Comunidade Cine NINJA. Seu conteúdo não expressa, necessariamente, a opinião oficial da Cine NINJA ou Mídia NINJA.