Lula muda xadrez da reforma e escolhe Gleisi para comandar articulação política do governo
Data: 28/02/2025 18:35:14
Fonte: terra.com.br
BRASÍLIA – Em uma reviravolta de última hora, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou nesta sexta-feira, 28, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, para comandar a Secretaria de Relações Institucionais. Trata-se do ministério mais estratégico do núcleo de governo, que faz a articulação entre o Palácio do Planalto e o Congresso, negociando até mesmo emendas parlamentares, pivô da atual crise política. Gleisi substituirá Alexandre Padilha, que foi transferido para o Ministério da Saúde no lugar de Nísia Trindade.
No mês passado, Lula conversou com Gleisi em duas ocasiões sobre sua ida para o ministério. Como mostrou o Estadão, o convite inicial havia sido para ela assumir a Secretaria-Geral da Presidência, que cuida dos movimentos sociais, hoje ocupada por Márcio Macêdo. Nos últimos dias, porém, Gleisi deixou claro que gostaria de auxiliar o presidente na articulação política do governo. Após semanas de idas e vindas, Lula bateu o martelo e, nesta sexta-feira, 28, a convidou para a Secretaria de Relações Institucionais.
A entrada de Gleisi no Planalto cria um novo polo de poder no governo, uma vez que ela sempre se destacou por fazer um contraponto à política econômica adotada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tentando puxar o governo para a esquerda. Em uma resolução política de dezembro de 2023, o PT chegou a definir o pacote de corte de gastos proposto por Haddad como “austericídio fiscal”.
Gleisi liga para Haddad logo após receber convite de Lula
Após ser confirmada como ministra, porém, Gleisi telefonou para Haddad e disse que quer conversar com ele depois do carnaval. Considerada na Esplanada dos Ministérios como uma pedra no sapato do chefe da equipe econômica, a deputada também telefonou nesta sexta-feira para vários líderes de partidos no Congresso.
Na prática, a escolha da presidente do PT para a cadeira antes ocupada por Padilha surpreendeu até mesmo a cúpula do partido. Por ter um estilo combativo, de enfrentamento, Gleisi comprou muitas brigas no Congresso, não apenas com o PL do ex-presidente Jair Bolsonaro, mas também com o Centrão. Criticou, por exemplo, o que chamou de “forças conservadoras e fisiológicas” desse grupo de partidos que, na sua avaliação, foi beneficiado nas últimas eleições pela “absurda norma do orçamento impositivo num regime presidencialista”.
Apesar de desaconselhado a nomear Gleisi por alguns interlocutores com quem conversou recentemente, Lula disse que tinha uma dívida de gratidão com a deputada. Observou ainda que Gleisi, sempre vista como muito radical, era uma “grande articuladora política” e já havia dado provas disso quando foi ministra da Casa Civil no governo Dilma Rousseff, de 2011 a 2014.
À frente do PT na época em que Lula estava preso, Gleisi também organizou a vigília “Lula Livre”, que permaneceu 580 dias diante do prédio da Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba. Na coordenação da campanha de 2022, foi ela quem também negociou com os partidos, da esquerda ao centro, o apoio ao então candidato petista.
Nos bastidores, porém, aliados do governo, principalmente do Centrão, temem que a ida de Gleisi para a chamada “cozinha do Planalto”, onde são tomadas as principais decisões sobre os rumos do governo, piore ainda mais as relações com o Congresso num momento em que a popularidade de Lula tem despencado.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), trabalhava para que o deputado Isnaldo Bulhões (AL), líder do MDB, assumisse a Secretaria de Relações Institucionais. Nas fileiras do Centrão, outro nome citado para o cargo era o do ministro de Portos e Aeroportos, Sílvio Costa Filho (Republicanos).
O Estadão apurou que, antes de Gleisi, Lula sondou o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), para o lugar de Padilha. Wagner, porém, não aceitou a tarefa. O deputado José Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara, chegou a ser considerado favorito para o posto. Sob reserva, interlocutores do presidente disseram que o nome dele foi descartado porque apareceu em aúdios de deputados, obtidos pela Polícia Federal, envolvendo negociações de emendas. Não há, porém, qualquer investigação contra Guimarães.
A posse de Gleisi na Secretaria de Relações Institucionais está marcada para 10 de março. Um dia antes haverá reunião da Executiva Nacional do PT para definir quem ficará no lugar da deputada na presidência do partido. O mandato dela termina em 6 de julho, quando haverá eleições internas, com voto dos filiados, para a escolha da nova cúpula petista. Até lá o comando do PT ficará com um interino.
O senador Humberto Costa (PE), um dos vice-presidentes do PT, é o mais cotado para assumir o mandato-tampão. Mesmo depois da decisão da Executiva, porém, o nome do indicado terá de passar pelo crivo do Diretório Nacional do partido em no máximo 60 dias.
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Gleisi Hoffmann será nova ministra das Relações Institucionais do governo Lula
Foto: Wilton Junior/Estadão / Estadão
Nas redes sociais, Lula elogiou Gleisi e disse que ela “vem para somar na Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, na interlocução do Executivo com o Legislativo e demais entes federados”.
Pouco depois, a nova ministra também fez uma postagem nas redes dizendo esperar corresponder à confiança de Lula em uma “construção conjunta” com os partidos aliados, o Congresso e demais instituições. “Sempre entendi que o exercício da política é o caminho para avançarmos no desenvolvimento do país e melhorar a vida do nosso povo”, escreveu ela. “É com este sentido que seguirei dialogando democraticamente com os partidos, governantes e lideranças políticas, como fiz nas posições que ocupei no Senado Federal, na Câmara dos Deputados, na Casa Civil, na diretoria de Itaipu e, atualmente, na presidência do PT”.
Apesar de integrar a corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), vista como centro político do PT, Gleisi sempre teve um perfil mais à esquerda. A CNB é a mesma tendência de Lula, Haddad e Padilha.
No comando do PT há quase oito anos, a deputada esperava integrar o governo Lula em janeiro de 2023. Já naquela ocasião o desenho do primeiro escalão previa Gleisi na Secretaria-Geral da Presidência. Mas, na última hora, Lula pediu a ela que permanecesse mais tempo na presidência do PT por avaliar que a sigla estava muito dividida e não havia encontrado, naquele momento, outro nome habilitado para conduzir o partido. Agora, o presidente quer emplacar o ex-prefeito de Araraquara Edinho Silva no comando do PT.
Com Gleisi na equipe, o ministério de Lula terá agora 10 mulheres e 28 homens. A entrada da presidente do PT na segunda metade do governo Lula era esperada. O que surpreendeu o mundo político foi a mudança da pasta escolhida para ela.
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