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Vitória inédita para o Brasil

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Data: 03/03/2025 04:04:59

Fonte: em.com.br

Um Oscar, três mulheres e o cinema brasileiro. “Ainda estou aqui”, de Walter Salles, se tornou no início da madrugada desta segunda (3/3) no Brasil, a primeira produção nacional a receber o maior dos prêmios da indústria cinematográfica. Em seu (desde já) histórico discurso de agradecimento ao Oscar de Melhor Filme Internacional, Salles, de 68 anos, conseguiu resumir o sentimento de um país inteiro.

“Obrigado, em primeiro lugar, em nome do cinema brasileiro. É uma honra receber esse prêmio em um grupo tão extraordinário de cineastas. Dedico esse prêmio a uma mulher que, depois de uma perda durante um regime autoritário, decidiu não se curvar. E resistir. Esse prêmio é dedicado a ela. O nome dela é Eunice Paiva. E eu dedico esse prêmio às duas mulheres extraordinárias que deram vida a ela, Fernanda Torres e Fernanda Montenegro.”

A comemoração foi intensa no Brasil e em Los Angeles, ainda que um pouco agridoce, já que Fernanda Torres, indicada a Melhor Atriz, perdeu para Mikey Madison (“Anora”). O longa de Sean Baker foi o grande vencedor da 97ª edição do Oscar: levou cinco das seis estatuetas a que estava indicado.

Produção independente, o filme sobre uma stripper que encanta o garotão mimado filho de um oligarca russo levou os troféus de Melhor Filme, Direção, Roteiro Original, Montagem (todos assinados por Baker) e Atriz.


Grandes telas

A mensagem mais relevante que Baker, nome de prestígio no cenário independente, deixou, foi a da necessidade do cinema. “Assistir a filmes no cinema com uma plateia é uma experiência. No momento em que o mundo está dividido, isso é mais importante do que nunca. Perdemos quase mil telas nos EUA e estamos perdendo cada vez mais. Cineastas, façam filmes para as grandes telas, eu sei que continuarei a fazer isto.”

   O palestino Basel Adra e o israelense Yuval Abraham exibem Oscars que ganharam com o filme Sem chão
O palestino Basel Adra e o israelense Yuval Abraham, que ganharam o Oscar com “Sem chão”, defenderam o respeito aos palestinos e o fim da crise dos reféns em Gaza Angela Weiss/AFP

Mesmo com o longa de Baker concentrando alguns dos prêmios principais, houve farta distribuição de troféus nesta edição.


Com 10 indicações, “O brutalista” levou três prêmios: Trilha Sonora, Fotografia e Ator. Adrien Brody levou seu segundo Oscar (o primeiro foi em 2003, por “O pianista”) e mais uma vez sobre um personagem que sobreviveu ao Holocausto.

No mais longo discurso da noite (cinco minutos), ele afirmou que estava ali “para representar os traumas persistentes e as repercussões da guerra e da opressão sistemática, e do antissemitismo, racismo e alteridade”.

Imigrantes e Trump

Como esperado, após o escândalo dos tuítes racistas e xenofóbicos de Karla Sofía Gascón (que foi à cerimônia, mas não passou pelo tapete vermelho), a personagem-título de “Emilia Pérez”, a campanha do campeão de indicações naufragou. O musical do francês Jacques Audiard levou dois dos 13 prêmios a que havia sido nomeado.

O primeiro deles foi para Zoe Saldaña, eleita Melhor Atriz Coadjuvante. Dedicou o Oscar à avó, imigrante que chegou aos EUA em 1961. “Sou a primeira americana de origem dominicana a receber o prêmio da Academia, e não serei a última.” A fala se tornou mais assertiva diante da extrema política anti-imigração de Donald Trump.

Atriz Zoe Saldaña sorri e ergue a estatueta do Oscar
Atriz Zoe Saldaña dedicou o Oscar à avó, imigrante nos Estados Unidos, e destacou que é a primeira dominicana a ganhar o prêmio Michael Tran/AFP

Mais contundente foi o discurso dos diretores do Melhor Documentário, “Sem chão”. Produzido por um coletivo israelo-palestino, o longa acompanha uma família palestina enquanto o governo israelense os desloca de sua casa na Cisjordânia.

Crise palestina

“Apelamos ao mundo para tomar medidas sérias para acabar com a injustiça e a limpeza étnica do povo palestino”, disse Basel Adra, jornalista palestino. Yuval Abraham, jornalista israelense, observou que ele e Adra vivem vidas “desiguais”.

“Fizemos este filme, palestinos e israelenses, porque juntos nossas vozes são mais fortes. A destruição de Gaza e seu povo deve acabar, os reféns israelenses, brutalmente capturados no crime de 7 de outubro, devem ser libertados.” Foram ovacionados.

O segundo Oscar de “Emilia Pérez” foi o de Melhor Canção para “El mal”, de Camille e Clément Ducol. O melhor foi recebê-lo das mãos de Mick Jagger, que fez uma das melhores aparições da noite.

“Por mais que eu goste de estar aqui, não fui a primeira opção”, Jagger já começou em tom de piada. “Seria Bob Dylan, mas ele não quis porque as melhores músicas deste ano estavam em ‘Um completo desconhecido’. Queriam alguém mais novo. Então estou aqui”, disse o líder dos Rolling Stones – Jagger tem 81 anos; Dylan, 83.

Matiss Kaza, diretor da animação "Flow", segura o Oscar
Matiss Kaza, diretor da animação “Flow”, produção da Letônia vencedora do Oscar Angela Weiss/AFP

Cinema da Letônia


Concorrente de “Ainda estou aqui” na categoria Filme Internacional, “Flow” levou Melhor Animação. Sua vitória foi um sinal não só da força do filme sobre um gato que tenta sobreviver num mundo inundado, mas também da internacionalização da Academia.

Primeira produção da Letônia a chegar ao Oscar, foi realizado com software gratuito, custou US$ 3,6 milhões e venceu os representantes da indústria: “Divertida Mente 2”, da Pixar, e “Robô selvagem”, da DreamWorks. “Espero que o prêmio abra portas para a animação independente em todo o mundo”, celebrou o diretor Gints Zilbalodis.

Homenagem a Gene Hackman

O tributo que o Oscar tradicionalmente faz aos profissionais da indústria que morreram no último ano foi iniciado e encerrado com homenagem a Gene Hackman. “A nossa comunidade perdeu um gigante e eu perdi um amigo”, afirmou Morgan Freeman, que dividiu a cena com o ator, encontrado morto na última quinta-feira (27/2), em “Os imperdoáveis” e “Sob suspeita”.

“Ele sempre dizia que não pensava em legado, mas em ser lembrado como alguém que fez um grande trabalho”, lembrou Freeman.