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Passeata contra a intolerância religiosa realizada em 2017 em Curitiba (Foto: Franklin de Freitas/ Arquivo Bem Paraná)

Uma empresa de aplicativo de transporte de pessoas foi condenada num caso de intolerância religiosa, por legitimidade passiva e responsabilidade solidária, após uma ofensa proferida por um motorista que trabalhava para a plataforma contra uma passageira do app. A condenação foi proferida pela 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR), numa ação de indenização por danos morais.

Segundo o TJPR, a passageira havia solicitado uma corrida pelo aplicativo e acabou tendo sua viagem cancelada. Em seguida, ela recebeu uma ofensa por escrito do motorista que havia cancelado a corrida. Na mensagem, ele dizia ter cancelado a viagem por ter visto a mulher saindo de um terreiro de umbanda, onde ela havia participado de um culto religioso de matriz africana, e que não aceitava pessoas dessa religião no seu veículo.

“Macumbeiro não anda no meu carro”, escreveu o motorista, por mensagem.

A empresa de aplicativo de transporte, por sua vez, entrou com recurso contra a decisão alegando que “o fato de ter proferido a palavra ‘macumbeiro´, sem qualquer outra manifestação ofensiva, obviamente, não teve a intenção de ferir a dignidade da autora, mas de justificar o cancelamento da corrida.”.

Em segunda instância, no entanto, o tjpr.jus.br/”>TJPR destacou, em acórdão, que “não é minimamente aceitável a possibilidade de se tolerar atos de discriminação religiosa alicerçados em suposta liberdade de expressão pois, apesar de ambas liberdades possuírem assento constitucional, o ataque ao direito de liberdade religiosa por meio do fundamento de que se trata de liberdade expressiva não pode ser admitido”.

“Claro cunho depreciativo e segregatício”

Por unanimidade dos votos, a 8ª Câmara Cível reconheceu que o comportamento vindo do motorista causou dano moral à passageira, por rejeitá-la por causa de sua religião, alegando no acórdão o “claro cunho depreciativo e segregatício, pois, justamente, por exercer/praticar religião de matriz africana, a ofendida não faria jus em adentrar o referido veículo e ter o serviço prestado pelo motorista”. A responsabilidade pela indenização foi atribuída à empresa de transporte por aplicativo, por atuar como intermediária na relação do motorista e do passageiro, sendo encarregada de entregar um serviço de qualidade.

O art. 5° da Constituição declara que é inviolável a liberdade de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos. A decisão se fundamentou no RHC 146303, relator ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), na decisão no caso 003144104.2021.8.16.0014 da 18ª Câmara Cível, relator desembargador Luiz Henrique Miranda, e no “Curso de Direito Constitucional” de Ingo Sarlet, Luiz G. Marinoni e Daniel Mitidiero. A pesquisa de jurisprudência foi realizada com apoio do Departamento de Gestão Documental do TJPR. O dia 21 de janeiro é o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa.

Aumento de 114% de denúncias de intolerância religiosa

Em 2024, o Disque 100, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, registrou 90 denúncias de intolerância religiosa no Paraná – um aumento de 114% em relação ao ano anterior. Devido ao crescimento de denúncias, o Núcleo de Promoção da Igualdade Étnico-Racial (Nupier), da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR), convocou profissionais jurídicos voluntários em todo o Paraná que possam ser acionados em eventuais violações de direito humanos ligados à intolerância religiosa. Podem se inscrever pessoas graduadas ou estudantes de Direito que residam no Paraná. A iniciativa recebe profissionais que tenham ou não registro ativo na OAB.